A Justiça marcou a data do primeiro julgamento referente à Chacina da Grande Messejana, o assassinato de 11 pessoas em quatro bairros daquela região na madrugada do dia 12 de novembro de 2015. Às 9 horas do próximo dia 20 de junho, sentarão no banco dos réus os policiais militares Marcus Vinícius Sousa da Costa, António José de Abreu Vidal Filho, Wellington Veras Chagas e Ideraldo Amâncio.
A decisão foi publicada na edição do último dia 14 de março do Diário de Justiça do Estado. Ao todo, 34 PMs foram pronunciados pela chacina, sendo que 44 haviam sido réus — os demais ou foram impronunciados ou tiveram a acusação desclassificada para crimes como prevaricação.
Após a pronúncia, os PMs recorreram da decisão em tribunais superiores, incluindo o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF). É aguardado que sejam esgotadas as possibilidades de recurso para que os réus venham a julgamento — no caso dos PMs que irão a julgamento em junho não cabe mais recurso à decisão de pronúncia.
O quarteto era réu em um processo que contava ainda com outros cinco PMs — o processo original foi desmembrado em três processos. No processo nº 0055869-44.2016.8.06.0001, três PMs ainda não têm trânsito em julgado de seus recursos e um outro PM, Daniel Campos Menezes, foi morto em uma tentativa de assalto em 2020.
A decisão tomada no dia 14 ainda definiu que 20 testemunhas serão ouvidas durante a sessão do Júri. São sete vítimas sobreviventes, quatro testemunhas de acusação e nove testemunhas de defesa. O Colegiado de Juízes de Primeiro Grau também deferiu as juntadas aos autos de matérias jornalísticas e do livro escrito por familiares das vítimas para contar suas histórias. Também foi deferida a juntada do inquérito que investigou a morte do soldado Valtemberg Chaves Serpa, crime que teria desencadeado a chacina.
A investigação apontou que os quatro PMs que serão julgados estavam na região onde alguns dos assassinatos da chacina foram cometidos, conforme consta na sentença de pronúncia. Nos casos de Ideraldo e Wellington, os carros deles foram flagrados transitando na região com placas adulteradas por fita isolante. Antônio José também teve o seu carro flagrado por câmera com placas adulteradas e sinais de Estações Rádio Base (ERBs) ainda mostraram que ele estava na região no horário em que o crime ocorreu. Em seu primeiro depoimento, o PM havia dito que não esteve na região no dia do crime. Em juízo, ele voltou atrás e confirmou ter se encontrado com PMs no dia do crime, embora negue participação na chacina.
Já no caso de Marcus Vinícius, fotossensores e câmeras de segurança mostram veículo de sua propriedade nas proximidades de onde foram mortos Antônio Alisson Inácio Cardoso, de 16 anos; Jardel Lima dos Santos, de 17 anos; Pedro Alcântara Barroso de Nascimento Filho, de 18 anos; e Alef Souza Cavalcante, 17 anos. O mesmo veículo também integraria um comboio que interceptou o ônibus onde estava o adolescente Renayson Girão da Silva, de 17 anos. Ele foi retirado do veículo e assassinado. Também foram mortos na chacina: Marcelo da Silva Mendes, de 17 anos; Patrício João Pinho Leite, de 16 anos; Jandson Alexandre de Sousa, de 19 anos; Valmir Ferreira da Conceição, de 37 anos; Francisco Elenildo Pereira Chagas,de 40 anos; e José Gilvan Pinto Barbosa, 41 anos.
Existe uma previsão de que as demais sessões do Tribunal do Júri ocorram nos meses de agosto e setembro. Os réus aguardam o julgamento em liberdade. (Com informações de Marcela Tosi).
Mãe de vítima da chacina pede condenação
Amanhã, 23, Alef Souza Cavalcante completaria 25 anos. Sem poder abraçar o filho em mais um aniversário, Edna Carla Cavalcante — mãe de Alef, uma das vítimas da Chacina do Curió — espera, ao menos, ver a justiça sendo feita para o filho.
Enquanto uma das fundadores do movimento Mães da Periferia, dona Edna tem acompanhado casos recentes de violência policial no Estado que terminaram sem nenhuma condenação, como, ela cita, as mortes de Francisco Ricardo Costa de Sousa, o Tico, em 2014, e de Ingrid Mayara Oliveira Lima e de Igor de Andrade Lima em 2013. "Espero muito que os jurados sejam sensíveis com o caso", afirma Edna.
A mãe de Alef conta que esses quase oito anos têm sido de muito "sofrimento", "angústia" e "luta" para ver o caso ter um desfecho judicial. Por isso, ela diz, que a absolvição, após uma jornada tão árdua pelo julgamento — com inúmeras audiências, plenárias, rodas de conversas entre outras — traria muita dor.
"Não é uma vitória só para as Mães do Curió, é uma vitória coletiva", diz Edna. "A gente sabe que, quando é um PM que mata, o descaso é total". Para ela, a condenação dos responsáveis pela chacina poderia representar o fim de um ciclo vicioso de injustiça em casos de violência policial.