A Universidade Federal do Ceará (UFC), em parceria com o Centro de Hematologia e Hemoterapia do Ceará (Hemoce), começou ontem, 22, e segue amanhã, 23, quarta, 24, e sexta-feira, 26, uma campanha de cadastramento de doadores de medula óssea.
A iniciativa acontece na Faculdade de Medicina, no Campus do Porangabuçu, em Fortaleza. O atendimento será feito das 9 às 16 horas, na Sala de Capacitação do 2º andar do Bloco Didático Prof. Ronaldo Ribeiro, localizado na rua Papi Júnior, 1.223, bairro Rodolfo Teófilo.
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A iniciativa nasceu a partir da mobilização de professores da Instituição, que tem dois objetivos: ampliar as chances de encontrar um doador compatível para o jovem cearense Vinícius Bastos Barbosa Nogueira, de 12 anos; ao mesmo tempo, ajudar outros pacientes em situação semelhante em todo o país.
A inscrição no banco de doadores é voluntária, indolor e gratuita. Para participar, os voluntários precisam:
Vinícius Barbosa é diagnosticado com Histiocitose de Células de Langerhans (HCL) e sarcoma histiocítico sistêmico, dois tipos raros de câncer que afetam a medula óssea. Os pais de Vinícius, Charlys Barbosa e Rachel Gabriel Barbosa, também são docentes na UFC.
Ana Karina Bezerra Pinheiro, diretora da Faculdade de Farmácia, Odontologia e Enfermagem da UFC, ressaltou que a iniciativa busca lembrar que gestos simples transformam vidas. "Existem muitas pessoas que aguardam um doador compatível. Estamos juntos nessa com Vini, mas juntos também com tantos outros. Doar é um gesto simples, mas que impacta enormemente a via do paciente e de suas famílias".
Segundo a diretora, em outubro ações itinerantes de cadastro de doadores também devem ser realizadas nos campi do Pici e do Benfica, em Fortaleza, além dos campi do Interior.
O médico e professor da Faculdade de Medicina da UFC, Charlys Barbosa, conta que Vini, como chama carinhosamente o filho, sempre foi uma criança saudável. Em junho de 2021, contudo, quando o menino tinha apenas sete anos, a família notou alguns hematomas na pele dele.
“Levamos o Vini para uma avaliação com o pediatra e veio a surpresa: o diagnóstico de uma leucemia aguda. E era um quadro extremamente grave. Ele internou e já foi direto para a UTI”, relata Charlys.
Na época, os exames mostraram que o garoto tinha 600 mil leucócitos no sangue — quando o normal seria cerca de 10 mil. “E 95% eram leucêmicos. Acima de 100 mil já existe risco iminente de vida”, recorda.
“Mas antes mesmo de iniciar a quimioterapia, apenas com as medidas iniciais para tentar baixar esses níveis, o Vinícius teve uma resposta milagrosa. Esses 600 mil, com 95% de leucemia, se transformaram em apenas 3 mil, com zero leucemia. Sem quimioterapia. Apenas com medicamentos”, explicou Charlys.
Vini ainda precisou continuar o tratamento contra a leucemia por dois anos e um mês. O garoto e sua mãe, a professora de Enfermagem Rachel Gabriel Barbosa, mudaram-se para São Paulo, onde ele passou a ser atendido no Instituto de Tratamento do Câncer Infantil (Itaci), vinculado à Universidade de São Paulo (USP). Lá, Vinícius foi completamente curado da leucemia.
Um mês depois da comemoração, contudo, uma nova preocupação surgiu. “O Vini apareceu com uma lesão na pele, que inicialmente atribuíram a uma picada. Mas quatro meses se passaram e a lesão continuava lá, crescendo. Fizemos uma biópsia e veio o diagnóstico: ele tinha um outro câncer, um tipo raro e atribuído ao tratamento contra leucemia, chamado Histiocitose de Células de Langerhans (HCL)”.
Vinícius então voltou a fazer quimioterapia. Após um ano e dois meses de tratamento, houve uma piora súbita das lesões de pele, que se espalharam por todo o corpo, inclusive no rosto. Novos exames revelaram que ele havia desenvolvido um segundo câncer raro, chamado sarcoma histiocítico.
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“Os médicos perceberam que, na verdade, o problema estava na ‘fábrica’: na medula. Ou seja, mesmo que a gente faça os tratamentos e ele responda positivamente, a probabilidade de ter um novo câncer é muito alta. A sugestão foi que a gente partisse para o transplante”, diz o pai.
Atualmente, Vinícius mantém sessões de quimioterapia enquanto aguarda a identificação de um doador compatível.
Existem cerca de 80 doenças que podem indicar transplante de medula óssea. As mais conhecidas são as leucemias agudas, tipos de câncer do sangue que, em alguns casos, só podem ser curados com o transplante.
De acordo com Luany Mesquita, diretora-geral do Hemoce, o Ceará é atualmente o primeiro do Norte e Nordeste em número de cadastros de doadores de medula óssea.
“Temos quase 240 mil doadores voluntários cadastrados no Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea (Redome). Mas é necessário sempre estar ampliando esse número, porque aí aumentamos a possibilidade de encontrar um doador compatível com algum paciente que esteja precisando”, destaca.
A diretora explica que, quando se trata de um doador dentro da própria família do paciente, a chance de encontrar compatibilidade é de aproximadamente 25%. “Quando você não tem esse doador na família e a gente vai para o registro nacional, essa chance cai para um a cada 100 mil pessoas, em média”.
Apesar de o Brasil ter cerca de 6 milhões de doadores cadastrados no Redome, a diversidade ainda é baixa. Isso é prejudicial, pois a compatibilidade para transplante de medula óssea depende de marcadores genéticos, que variam entre grupos étnicos. Atualmente, apenas 2,2 milhões de doadores são declaradamente não brancos, dificultando encontrar compatibilidade para pacientes negros e indígenas, por exemplo.