Moradores de Fortaleza têm denunciado a realização de podas drásticas em árvores. De acordo com a norma da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT NBR 16246-1), é permitido retirar até 25% da copa da árvore, preservando os outros 75%.
No entanto, as reclamações indicam que as podas realizadas em diferentes bairros estariam removendo grande parte das copas, deixando apenas o tronco e poucos galhos.
LEIA MAIS | O verde que falta: os impactos da redução de árvores em Fortaleza
Na esquina da av. Senador Virgílio Távora com rua Vicente Linhares, no bairro Aldeota, duas árvores tiveram quase todos os galhos removidos. Funcionária de uma loja nas proximidades, Vânia Sousa, 49, conta que as estruturas foram podadas no final de setembro. Agora, a sombra que havia antes no local no período da tarde faz falta.
“Deviam ter feito só aquela manutenção normal mesmo, só o suficiente pra não atrapalhar a visibilidade. De tarde, o sol pega forte e essa sombra fazia muita diferença. As duas fazem muita falta para todo mundo que passa por aqui”, declara.
Outro ponto que passou por podas recentemente foi o cruzamento da rua Leonardo Mota com rua Vicente Linhares, também na Aldeota. No local, havia castanholas que, segundo moradores, foram podadas na segunda semana de outubro. Após o procedimento, restaram apenas alguns troncos e poucos galhos.
A arquiteta Kaíla Lima, 42, moradora do bairro Meireles, passa constantemente pelos locais e destaca que as podas deveriam ser apenas um ajuste, justamente para garantir a segurança no ambiente urbano.
“Jamais deveria ser feita da forma como vem sendo feita. O impacto aparece em tudo: na falta de sombra, no aumento do calor, na perda da vida que existia ao redor. Além disso, as aves e outros animais que viviam ali perdem o habitat, já que a copa foi completamente ceifada”, diz.
A moradora destaca que a situação agrava ainda mais a já limitada arborização das vias de Fortaleza. “A gente já tem uma cobertura vegetal muito pequena na cidade. Às vezes, há algumas no canteiro central, mas nas calçadas mesmo você passa por quadras e mais quadras inteiras sem ver árvores plantadas nas calçadas”.
De acordo com o professor do Departamento de Fitotecnia da Universidade Federal do Ceará (UFC), Lamartine Oliveira, ambos os casos podem ser considerados como podas excessivas de árvores. Segundo ele, as podas excessivas são consideradas crime ambiental, pois fazem com que a árvore perca grande parte da sua estrutura funcional e comprometa sua sobrevivência.
“Há uma região na base do galho que deve ser respeitada, chamada crista. Ao realizar o corte um pouco acima dessa região, a árvore não consegue cicatrizar adequadamente. Essa parte tende a apodrecer, tornando-se porta de entrada para pragas e doenças”, afirma.
Conforme o especialista, uma poda mal executada pode elevar em até 60% o risco de colapso da árvore, que pode perder grandes galhos ou até cair completamente. “Mesmo quando não há colapso [imediato], o excesso de podas sem critério técnico enfraquece o indivíduo e pode levar à morte precoce. Árvores que poderiam viver 100, 120 ou 150 anos acabam morrendo com 15 ou 30 anos”, completa.
Mesmo quando se trata de espécies consideradas invasoras, como o Nim indiano, a poda irregular ainda causa prejuízos à arborização urbana. Um exemplo pode ser visto na Avenida Radialista José Lima Verde, no bairro Barra do Ceará, onde duas árvores dessa espécie, localizadas no canteiro central, foram podadas até o caule.
Para o professor, também é equivocado justificar o corte de árvores alegando que estão “velhas”. Ele lembra que Fortaleza abriga exemplares centenários, como baobá do Passeio Público, no Centro, com mais de 100 anos.
“O conceito de ‘velhice’ para as árvores é muito diferente do nosso. Uma árvore só deve ser suprimida quando há uma praga ou doença irreversível, ou quando apresenta fragilidades estruturais muito avançadas, como rachaduras entre galhos, conhecidas como ‘casca inclusa’ em bifurcações”, conclui.
LEIA TAMBÉM | Canteiros da Beira Mar sofrem com falta de irrigação e jardinagem
Cidadãos podem identificar uma poda irregular observando alguns sinais simples:
“Hoje, já existe conhecimento técnico suficiente para tratar e recuperar árvores que estejam em estado avançado de degradação, com risco de colapso estrutural, pragas ou doenças”, aponta Lamartine Oliveira, coordenador de Educação Ambiental da Secretaria de Meio Ambiente da UFC. “Precisamos cada vez mais das árvores em áreas urbanas, não podemos mais perdê-las, e devemos, sim, plantar cada vez mais árvores em Fortaleza”, conclui.
De acordo com Prefeitura de Fortaleza, de janeiro a outubro de 2025, a Autarquia de Urbanismo e Paisagismo de Fortaleza (UrbFor) executou 17.506 serviços de poda na Capital.
Conforme a gestão, nenhuma das podas citadas foi executada pela UrbFor. "Os casos mencionados podem se tratar de podas irregulares, que comprometem o equilíbrio da árvore e podem gerar risco de queda dos indivíduos", disse.
Segundo a UrbFor, as podas são realizadas durante todo o ano em todos os bairros, de forma preventiva ou por demanda. Os serviços seguem laudo técnico e são executados por equipes com engenheiros agrônomos que avaliam cada árvore presencialmente. As intervenções ocorrem conforme a necessidade da planta, para correção, manutenção, limpeza, tratamento de pragas ou desobstrução de sinalização e iluminação pública.
A população pode solicitar o serviço de poda pelo telefone 156 ou presencialmente nas Centrais de Acolhimento das Secretarias Regionais.
EXTRA
Acesse o qr code e saiba como identificar uma poda de árvore irregular. Os moradores podem solicitar o serviço de poda por meio do telefone 156 ou nas Centrais de Acolhimento das Secretarias Regionais