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Obesidade infantil: novos dados para mudar causas já conhecidas
Ciência e Saúde

Obesidade infantil: novos dados para mudar causas já conhecidas

Estudo avaliou dados de cinco milhões de crianças e constatou que há crescimento da prevalência de sobrepeso de crianças entre 3 a 10 anos
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FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL,11.04.2024: Hora do lanche saudável. Iniciativa da escola faz com que, em um dia na semana, os alunos levem lanches saudáveis. Ciência & Saúde sobre obesidade infantil. colégio Master Sul (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL,11.04.2024: Hora do lanche saudável. Iniciativa da escola faz com que, em um dia na semana, os alunos levem lanches saudáveis. Ciência & Saúde sobre obesidade infantil. colégio Master Sul

"Há necessidade de desenvolver estratégias de intervenções precoces na vida para prevenir o desenvolvimento da obesidade". A frase está nas conclusões de um estudo pioneiro no Brasil, que identificou o crescimento médio de 1 cm na altura e da prevalência de sobrepeso/obesidade infantil em crianças de 3 a 10 anos. Se por um lado o aumento da estatura representa melhoria na situação socioeconômica - e portanto, nutricional - de uma população, o maior consumo de alimentos ultraprocessados denuncia outras questões não tão positivas. 

O Brasil saiu do cenário de pandemia já sabendo que pelo menos uma em cada 10 crianças até cinco anos, e um em cada três adolescentes (10 a 18 anos) apresentava sobrepeso, em 2022. Entre 2019 e 2021, o total de crianças acima do peso cresceu 6,08%, enquanto entre os adolescentes esse crescimento foi de 17,2%. Números são de estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Observatório de Saúde na Infância, divulgados no final de 2023. 

Meses depois, em abril deste ano, também através da Fiocruz, dessa vez com estudo feito pelo Centro de Integração de Dados e Conhecimento para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia), dados de mais de cinco milhões de crianças foram avaliados de forma a traçar uma trajetória infantil sobre peso e altura. Com informações oriundas de três sistemas diferentes (Cadúnico, Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos- Sinasc, e Sistema De Vigilância Alimentar e Nutricional -Sisvan), foi possível acompanhar a evolução das crianças. 

"Você consegue compor como se estivesse acompanhando a criança: nasceu, cresceu, e o que aconteceu com ela, seu peso, sua estatura, como se alimentou. Esses dados podem se estender até os 15, 20 anos, dependendo da captação do sistema. Se essa criança continuar tendo acesso ao serviço, conseguimos acompanhar", explicou um dos pesquisadores responsáveis pelo estudo, Gustavo Velasquez Melendez, que também é professor de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e doutor em Saúde Pública.   

O estudo protagonizado por Gustavo avaliou dois coortes (gerações), considerando nascidos entre 2001 e 2007 e entre 2008 e 2014. "Vimos a curva e verificamos que a geração mais recente cresceu 1 cm mais do que a anterior. A proporção de crianças obesas entre uma geração e outra, observamos que há um aumento em torno de 3% da mais recente, em comparação com a anterior", detalhou Gustavo. Ele explica que o peso da amostra - que considera diferentes gerações, tem uma abordagem nacional e se vale de dados de benefícios sociais - impacta diretamente na criação de políticas públicas voltadas para o público infantil. 

Mas como os hábitos alimentares de crianças precisam ser alvo de políticas? "Houve uma mudança, em termos gerais, sobre a ocorrência de hipertensão e diabetes na população. As crianças são vistas com mais chances de desenvolver essas doenças mais na frente. O diabetes, inclusive, surge na infância também. E isso tudo tem sido uma preocupação", explicou Luciana Passos, médica e coordenadora da Rede de Atenção Primária e Psicossocial da Secretaria de Saúde de Fortaleza. 

"É preciso dizer também que já há estudos que mostram desaceleração desse aumento da obesidade por causa da preocupação das famílias. O Ministério da Saúde tem feito intervenções grandiosas e positivas na Saúde e na política de alimentação escolar, também sobre atividade física. Os neuropediatras já colocam a redução do tempo de telas. diversos setores que precisam estar unidos para reverter o problema", afirmou a nutricionista, mestre em Saúde da Criança e do Adolescente, Rochele Riquet. 

Aleitamento materno, introdução alimentar, fórmulas infantis, excesso de telas, sedentarismo, informação, condições financeiras, mercado, família, indústria, escola, saúde... não há culpados sobre o o aumento da obesidade entre as crianças. Mas há causas, que precisam ser de responsabilidade de toda a sociedade.

Entenda pontos importantes dos estudos

Prevalência: repercute na condição macro da saúde, é a medida epidemiológica que se refere ao número de casos existentes de uma dada doença, que demonstre agravo ou uma situação específica. Quanto maior a prevalência, maior a ocorrência 

Amamentação: em países ricos e pobres, a amamentação é comprovadamente a prática alimentar que tem mais poder na redução da mortalidade

Peso x estatura: peso reflete condições de saúde mais agudas (a criança, quando adoece, por exemplo, já altera o peso) e a estatura reflete condições de saúde mais crônicas, mais acumuladas ao longo do tempo 

Curvas de crescimento: é opadrão utilizado no Brasil para saber se esa crianças está apresentando ganho de peso saudável e um crescimento linear adequado 

Escore Z: medida estatística preconizada pela OMS que quantifica a distância entre o valor observado em relação à mediana da população. Quanto mais uma criança se distancia, para baixo ou para cima dessa mediana, é classificado o quanto há de adequação ou não 

IMC: Índice de Massa Corporal, medida que compila os valores de peso e estatura e corrige isso para a idade. Para cada idade, uma recomendação

Sobrepeso: quando a criança está com esse Escore Z, do IMC para a idade, entre + 2 e + 3. 

Obesidade: quando a criança está com esse Escore Z, do IMC para a idade, acima do +3

Para adultos e idosos há outros pontos de cortes e parâmetros, além do IMC.  

Importância de estudos: De acordo com o pesquisador Gustavo Velasquez Melendez, "as hipóteses dos pesquisadores não têm limites". Objetivo dos próximos estudos é saber mais sobre a dinâmica de evolução da obesidade ao longo do tempo por essas crianças. "Queremos saber como vai se acumulando em uma coorte, em uma geração. Como se fosse uma escadinha, como é a velocidade desse aumento da obesidade" 

Outro estudo deverá fazer uso da Inteligência Artificial (IA), que terá condições de demonstrar quais aspectos de saúde e biológicos estariam relacionados ao aumento da obesidade

 

 

 


 

Escola precisa ser parceira na busca por bons hábitos

No colégio Master, pelo menos um dia da semana é dedicado ao lanche saudável: tapioca, sanduíche natural, pipoca... a regra é evitar principalmente ultraprocessados. A agenda escolar é enviada aos responsáveis informando sobre a iniciativa e já indicando sugestões de alimentos. É uma forma que a escola achou de, junto à família, estimular boas práticas alimentares. 

"A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) - que normatiza a grade curricular das escolas - nos convida a ter um olhar minucioso para o desenvolvimento das crianças. Vem se consolidando da educação infantil concepção que vincula educar e cuidar, entendendo o cuidado como algo indissociável do processo educativo. Dessa forma, incluir alimentação saudável no dia a dia das crianças é uma forma de ajudá-los em seu desenvolvimento", afirma supervisora da educação infantil, Carmen Mundim. 

Ela explica que a temática, hoje, consta no planejamento escolar, promovendo, de forma lúdica e efetiva, contextos que agregam informações sobre a importância da alimentação saudável. "Essas atividades são compartilhadas no material didático, nas cotações de história, nos lanches coletivos, canções, teatro e informações para a família", destaca Carmen. 

O maior desafio, de acordo com a educadora, é tornar a prática da alimentação saudável um hábito e não um momento isolado. A educadora afirma que o tema da obesidade infantil é delicado para ser abordado com as crianças muito pequenas e que, quando há situações mais específicas, há conversa com as família, estímulo ao envio dos lanches saudáveis, busca por orientação médicas, práticas esportivas na escola. (Sara Oliveira)
 

 

Atividade física libera hormônio do crescimento

Pular, correr, se agachar e rolar no chão. Ações comuns à grande maioria das crianças são, além de movimentos que trabalham músculos e articulações, estão também diretamente ligados ao desenvolvimento do cérebro da criança. "Até um simples esforço físico promove a liberação de hormônio de crescimento", frisa a educadora física Lúcia Paiva, que há mais de duas décadas trabalha com crianças. 

Ela detalha que atividades físicas leves e moderadas têm efeito benéfico sobre o crescimento estatural, enquanto a atividade física intensa atenua o crescimento. "A variedade na atividade física infantil é muito importante para a formação neural da criança, pois ela aprende gestos e movimentos motores, e ganha habilidades variadas", explica.

O mais indicado, conforme Lúcia, s são atividades lúdicas e cooperativas por estimularem a coordenação, equilíbrio, força, velocidade, agilidade e ritmo, como: natação, ginástica artística e rítmica, balé, judô, futsal, basquete, vela, remo, corrida, andar de bicicleta, dançar e pular corda. "Adolescentes requerem atividades que estimulem resistência".

 

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