Popularmente conhecida como “dor de cabeça”, a cefaleia segue como uma das queixas mais comuns de todos os atendimentos médicos, causando, além da dor, vários outros sintomas associados, podendo ser uni ou bilateral.
A realidade é que 95% das pessoas já apresentaram dores de cabeça ao menos uma vez na vida. No Brasil, aproximadamente 140 milhões de brasileiros sofrem com essa condição, segundo dados da Sociedade Brasileira de Cefaleia.
Já a Classificação Internacional de Cefaleias elenca 200 tipos diferentes de dores de cabeça, sendo uma das sete doenças mais incapacitantes e um dos motivos que mais levam as pessoas a unidades de urgência em todo o mundo.
E em uma sociedade cada vez mais rotineira, buscamos explicações que justifiquem essa dor, que não tem hora e nem lugar para surgir, seja em função de estresse do dia, do vinho da noite passada, do café que não tomado, do período menstrual, da noite mal dormida ou de muitas responsabilidades.
“Com 42 anos dedicados a estudar, pesquisar e tratar pessoas com dor de cabeça, posso afirmar: não é normal ter dor de cabeça. É fundamental que compreendamos isso”, destaca João José Carvalho, doutor em neurologia e membro das Sociedades Internacional e Brasileira de Cefaleia.
Essas crenças são construídas pela repetição de experiências, ele explica que a dor de cabeça, muitas vezes, segue um padrão que nos permite reconhecê-la ao longo do tempo, com variações de intensidade ou sintomas adicionais.
Segundo ele, é estimado que apenas 3% das pessoas nunca terão uma dor de cabeça na vida. Por outro lado, em uma cidade como Fortaleza, cerca de 60.000 pessoas têm dores de cabeça todos os dias da vida.
“A dor é como um alarme do corpo. Quando sentimos dor, o organismo está tentando nos comunicar que algo está errado. No caso da dor de cabeça, é como se o ‘alarme da cabeça’ estivesse tocando”, explica.
A cefaleia pode afetar pessoas de todas as idades, raças, gêneros, níveis de renda e áreas geográficas, e apesar de poder ser secundária, na grande maioria das vezes ela não ter nenhum fator causador definido.
Por isso as cefaleias são divididas em dois grandes grupos: as primárias e as secundárias, sendo as primeiras muito mais frequentes.
As cefaleias primárias, como o nome sugere, não possuem uma condição determinante, nada específico que esteja causando a dor, ou seja, a dor é a própria doença. São síndromes isoladas que têm como manejo de base o controle dos sintomas. Como exemplos, temos a enxaqueca e a cefaleia do tipo tensão, as mais comuns da humanidade.
Já as secundárias são as que o sintoma de dor de cabeça acontecem como consequência de outra condição de saúde, que pode ser por inflamação ou alteração estrutural de áreas sensíveis à dor.
Ou seja, a dor é um sintoma de outra doença, existe algo causando ela, como meningite, gripe, sinusite aguda ou, em casos raros, um tumor cerebral.
“É crucial entender a diferença entre dores de cabeça primárias e secundárias. A dúvida é um fator importante, é preciso levar a dor de cabeça a sério e não atribuí-la a fatores como estresse ou sono ruim”, alerta o neurologista.
Apesar das dores de cabeça serem, em sua grande maioria, primárias, para o especialista é fundamental saber quando se preocupar e suspeitar que uma dor de cabeça possa ser secundária, existindo fatores de alarme — red flags — que indicam a necessidade de procurar uma emergência ou investigação médica.
“Se você tem dores de cabeça recorrentes — mais de três dias no mês, há mais de três meses — é fundamental procurar um médico. Essa é a base da nossa campanha anual, chamada “Três é demais”, que surgiu para mudar o paradigma, pois os modelos leigos acomodam e atrasam o tratamento”, pontua.
O mal da enxaqueca é um tipo de dor de cabeça primária que mais leva as pessoas ao médico. Um estudo na Inglaterra revelou ser estimado 3.000 crises de enxaqueca por cada milhão de habitantes.
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Ou seja, na grande Fortaleza, com aproximadamente 3 milhões de habitantes, 9.000 pessoas apresentam uma crise de enxaqueca todos os dias.
A doença é uma das que mais gera impacto social, pessoal e familiar. Realidade essa vivenciada pela pedagoga Heline Porto, de 49 anos. Diagnosticada com enxaqueca desde os 15 anos, ela herdou a doença do seu pai, condição essa sentida também por suas tias.
Suas crises já chegaram a durar até quatro dias, com dores fortes e intensas que a levaram em alguns momentos para emergência durante a madrugada. Era só no terceiro dia, com a dor mais intensificada, que ela começava a sumir.
Tratamentos e medicações a acompanharam a vida toda. “Sempre lembrava do meu pai, que para evitar uma futura provável dor de cabeça, logo de manhã cedo já tomava um comprimido. Quando recebo sinais das dores também já tomo remédio”, comenta.
O neurologista João José Carvalho explica que a enxaqueca é uma doença neurológica, biológica, genética e hereditária. “Ela não diminuirá sua quantidade, mas sim sua qualidade de vida se não for tratada. Quanto mais cedo você a diagnosticar, mais eficiente será o tratamento”, afirma.
Como toda doença, ela apresenta diferentes frequências, que vão desde a enxaqueca episódica de baixa frequência até a crônica. Além da dor, ela vem acompanhada de cansaço, falta de concentração, fome intensificada e até prisão de ventre.
“É fundamental que as pessoas saibam que não têm culpa por suas crises, elas são espontâneas e ocorrem independentemente da vontade do paciente. Não há como evitar, é preciso tratá-las, mesmo sendo uma pessoa com um estilo de vida exemplar”, afirma.
Heline já atuou na educação infantil, lembra do cansaço e do estresse rotineiro atrelado à sua enxaqueca. Entre as características da sua condição estavam questões como sensibilidade à luz, cheiro e barulho.
A pedagoga também é diagnosticada com fibromialgia e, em 2019, iniciou um tratamento contra a depressão e Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG). Para ela, as dores da enxaqueca estavam sempre atreladas às preocupações, às noites mal dormidas e à sua ansiedade.
“Quando eu não dormia, meu corpo não relaxava, no outro dia acordava indisposta, parecendo um zumbi com a cabeça pesada. Nas manhãs que eu colocava os pés no chão e sentia a dor, eu nem saía de casa, não ia conseguir fazer nada”, descreve.
Durante suas crises, ela costuma tomar banho e molhar sua cabeça com água gelada, indo deitar imediatamente. O único momento que recorda que passou bastante tempo sem as crises foi durante o período de gestação.
Uma das suas filhas, Beatriz Porto, de 21 anos, estudante universitária, não herdou a enxaqueca da mãe, mas já chegou a sentir dores na cabeça duraram três dias.
“Quando eu era mais nova, durante o Ensino Médio, eu tinha muita dor de cabeça. Não sei por qual razão, mas quando sinto já começo a especular que seja o óculos, um grau que tem aumentado ou diminuído”, relata.
Para a jovem, o emocional também é algo que influencia, mas não chega a se preocupar com as dores porque não é algo recorrente.
“Elas surgem quando querem. Às vezes, quando sinto uma dor de cabeça forte, tomo remédio para dormir. Não me preocupo porque dá para conviver com ela”, diz.
Para o neurologista, durante as crises, algumas pessoas conseguem encontrar alívio em banhos ou outras práticas pessoais, mas o que realmente funciona é a medicação. Além disso, em muitos casos a enxaqueca vem acompanhada de comorbidades, como ansiedade, depressão e pânico.
Ela também pode se manifestar com aura, como fenômenos visuais (manchas escuras e brilhantes), sensitivos (dormência no braço) ou da fala (dificuldade para falar), antes da dor se manifestar.
“Esses fenômenos duram cerca de 10 a 15 minutos, seguidos pela dor de cabeça. Pacientes mulheres que apresentam crises de enxaqueca com aura não podem tomar anticoncepcionais combinados. Felizmente, a forma mais comum de apresentação da enxaqueca é sem aura”, destaca.
O tratamento habitualmente é dividido em dois tipos: o tratamento das crises e o tratamento da doença. Este varia conforme a frequência das crises, não corrigindo o defeito genético, mas realizando uma mudança no comportamento cerebral que passa a não mais deflagrar as crises.
No tratamento da crise, utilizam-se medicações cujo papel é ‘desligar o alarme’ da dor, e no tratamento preventivo, utilizam-se medicações de uso contínuo por um a dois anos, procurando ‘ajustar o alarme’ para que ele não dispare mais.
“Eu sempre digo para os meus pacientes: você conhece sua dor na esquina, quando você não tiver dúvida é ela, vá imediatamente tomar sua medicação”, finaliza.
Hoje, Heline segue em tratamentos e as crises, que ainda existem, se tornaram menos frequentes. A inserção da prática de exercícios físicos está em seus planos, que para ela, é só questão de tempo. “Precisamos sim nos cuidar e procurar tratamento, isso influencia diretamente na nossa qualidade de vida”, conclui.
Quando falamos na dor de cabeça, o seu processo de diagnóstico, para a grande maioria, consegue ser resolvido com uma conversa com o médico e um exame físico detalhado.
O neurocirurgião, Saulo Teixeira, explica que o mais importante é ficar atento aos sinais de alarme, as famosas “red flags”, para diferenciar se é primária ou secundária.
Nesses casos, pode ser necessárias outras investigações para saber a real causa, mediante exames de imagem, tomografia computadorizada de crânio e ressonância magnética do crânio, ou da coluna cervical em algumas dores que se estendem até o pescoço.
Esses sinais são percebidos na alteração da visão, perda de força, sensibilidade em algum dos membros do corpo, uma dor de cabeça que difere do padrão habitual, uma que atinge a intensidade máxima em mais ou menos um minuto, tontura, alterações do comportamento e entre outros.
“O melhor tratamento é sempre aquele mais simples, normalmente baseado em medicações analgésicas, que se encontram facilmente em todas as farmácias. Em alguns casos, medicações anti-inflamatórias podem ajudar nesse processo”, detalha.
Para ele, o grande segredo está em reconhecer aquela dor de cabeça que tem frequência maior, nesse caso sendo necessário o foco na prevenção, ou seja, a utilização de uma medicação diariamente para evitar que a pessoa tenha uma dor de cabeça.
Muitos desses remédios podem ser antidepressivos, anti-hipertensivos, e até mesmo anticonvulsivantes. “Essas medicações atuam em determinadas funções do cérebro que diminuem a percepção de dor e diminuem a intensidade e a frequência das crises”, explica.
O especialista alerta sobre o uso indiscriminado de medicações analgésicas, existindo até um tipo de cefaleia por abuso de analgésicos. “É uma situação na qual o próprio uso da medicação predispõe a mais dor de cabeça”, revela.
Segundo ele, atualmente existem tratamentos com anticorpos monoclonais e medicações utilizadas uma ou duas vezes por mês de forma injetável, onde essas dores têm a possibilidade de um tratamento intervencionista e menos invasivo.
“Durante uma crise de dor de cabeça, o mais importante é tomar aquela medicação de confiança que você sabe que melhora os seus sintomas e procurar um local mais silencioso para esperar que passe”, conclui.
Informações adicionais
Tipos de cefaleia
Existem mais de 200 tipos de cefaleia, podendo ser dividido em dois grandes grupos:
Red Flags para dores de cabeça secundárias
Existem 15 fatores de alarme para uma dor de cabeça que indicam a necessidade de procurar uma emergência ou investigação médica. Os principais são:
Como Saber se Tenho Enxaqueca?
Para saber se você tem enxaqueca, observe se já teve cinco ou mais episódios de dor de cabeça na vida com as características abaixo:
Se você se encaixa nesses critérios para cinco ou mais crises, o diagnóstico é de enxaqueca.
Classificação da frequência das crises:
A enxaqueca é classificada de acordo com a quantidade de dias com dor de cabeça por mês:
Muito Baixa Frequência: Menos de 1 crise por mês.
Baixa Frequência: De 1 a 4 dias de dor por mês.
Média Frequência: De 5 a 9 dias de dor por mês.
Alta Frequência: De 10 a 14 dias de dor por mês.
Enxaqueca Crônica: Mais de 14 dias de dor por mês.
Alerta e informações
Fique atento aos sinais
Quando falamos na dor de cabeça, o seu processo de diagnóstico, para a grande maioria, consegue ser resolvido com uma conversa com o médico e um exame físico detalhado.
O neurocirurgião, Saulo Teixeira, explica que o mais importante é ficar atento aos sinais de alarme, as famosas "red flags", para diferenciar se é primária ou secundária.
Nesses casos, podem ser necessárias outras investigações para saber a real causa, mediante exames de imagem, tomografia computadorizada de crânio e ressonância magnética do crânio, ou da coluna cervical em algumas dores que se estendem até o pescoço.
Esses sinais são percebidos na alteração da visão, perda de força, sensibilidade em algum dos membros do corpo, uma dor de cabeça que difere do padrão habitual; ou uma cefaleia que atinge a intensidade máxima em mais ou menos um minuto, tontura, alterações do comportamento e entre outros.
"O melhor tratamento é sempre aquele mais simples, normalmente baseado em medicações analgésicas, que se encontram facilmente em todas as farmácias. Em alguns casos, medicações anti-inflamatórias podem ajudar nesse processo", detalha.
Para ele, o grande segredo está em reconhecer aquela dor de cabeça que tem frequência maior, nesse caso sendo necessário o foco na prevenção, ou seja, a utilização de uma medicação diariamente para evitar que a pessoa tenha uma dor de cabeça.
Muitos desses remédios podem ser antidepressivos, anti-hipertensivos, e até mesmo anticonvulsivantes. "Essas medicações atuam em determinadas funções do cérebro que diminuem a percepção de dor e diminuem a intensidade e a frequência das crises", explica.
O especialista alerta sobre o uso indiscriminado de medicações analgésicas, existindo até um tipo de cefaleia por abuso de analgésicos. "É uma situação na qual o próprio uso da medicação predispõe a mais dor de cabeça", revela.
Segundo ele, atualmente existem tratamentos com anticorpos monoclonais e medicações utilizadas uma ou duas vezes por mês de forma injetável, onde essas dores têm a possibilidade de um tratamento intervencionista e menos invasivo.
"Durante uma crise de dor de cabeça, o mais importante é tomar aquela medicação de confiança que você sabe que melhora os seus sintomas e procurar um local mais silencioso para esperar que passe", conclui.
Enxaqueca provoca crises mais frequentes
A enxaqueca é um tipo de dor de cabeça primária que mais leva as pessoas ao médico. Um estudo na Inglaterra revelou ser estimado 3.000 crises de enxaqueca por cada milhão de habitantes. Ou seja, na grande Fortaleza, com aproximadamente 3 milhões de habitantes, 9.000 pessoas apresentam uma crise de enxaqueca todos os dias.
A doença é uma das que mais gera impacto social, pessoal e familiar. Realidade essa vivenciada pela pedagoga Heline Porto, de 49 anos. Diagnosticada com enxaqueca desde os 15 anos, ela herdou a doença do seu pai, condição essa sentida também por suas tias.
Suas crises já chegaram a durar até quatro dias, com dores fortes e intensas que a levaram em alguns momentos para emergência durante a madrugada. Era só no terceiro dia, com a dor mais intensificada, que ela começava a sumir.
Tratamentos e medicações a acompanharam a vida toda. "Sempre lembrava do meu pai, que para evitar uma futura provável dor de cabeça, logo de manhã cedo já tomava um comprimido. Quando recebo sinais das dores também já tomo remédio", comenta.
O neurologista João José Carvalho explica que a enxaqueca é uma doença neurológica, biológica, genética e hereditária. "Ela não diminuirá sua quantidade, mas sim sua qualidade de vida se não for tratada. Quanto mais cedo você a diagnosticar, mais eficiente será o tratamento", afirma.
Como toda doença, ela apresenta diferentes frequências, que vão desde a enxaqueca episódica de baixa frequência até a crônica. Além da dor, ela vem acompanhada de cansaço, falta de concentração, fome intensificada e até prisão de ventre.
"É fundamental que as pessoas saibam que não têm culpa por suas crises, elas são espontâneas e ocorrem independentemente da vontade do paciente. Não há como evitar, é preciso tratá-las, mesmo sendo uma pessoa com um estilo de vida exemplar", afirma.
Heline já atuou na educação infantil, lembra do cansaço e do estresse rotineiro atrelado à sua enxaqueca. Entre as características da sua condição estavam questões como sensibilidade à luz, cheiro e barulho. A pedagoga também é diagnosticada com fibromialgia