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Reajuste do salário mínimo pela inflação reduz poder de compra do brasileiro
Economia

Reajuste do salário mínimo pela inflação reduz poder de compra do brasileiro

A medida da equipe econômica do Governo Federal visa equilibrar as contas do País, mas mudança deve corroer ainda mais a renda das famílias
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Você conseguiria pagar por uma alimentação saudável, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e Previdência para a sua família com R$ 998 por mês? O que parece inimaginável é a realidade de milhões de pessoas que sobrevivem com esse piso salarial no Brasil. Insuficiente para suprir as necessidades básicas no cenário atual, o salário mínimo será corrigido pela inflação (calculada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor) e não terá mais ganho real a partir de 2020. Nesse contexto, o poder de compra do trabalhador diminuirá e as distorções sociais devem se agravar.

A medida anunciada pela equipe econômica do presidente Jair Bolsonaro (PSL) visa equilibrar as contas do Governo. O valor previsto para o próximo ano ficou em R$ 1.039. Para alguns economistas, essa é saída para o País ganhar fôlego. Assim, o setor privado voltaria a contratar e, consequentemente, haveria um recuo do desemprego. No entanto, segundo pesquisa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o brasileiro precisa de uma remuneração de R$ 4.143,55 somente para obter itens necessários da cesta básica de alimentos.

Em 2013, a renda mensal familiar per capita era de R$ 581, e o salário mínimo de R$ 678, no Ceará. Ou seja, o cearense tinha recursos inferiores ao piso salarial. A situação continuou até 2015. Apenas em 2016, observou-se saldo positivo. Agora, sem o ganho real, o questionamento que se levanta é como ficará a renda da população nos próximos anos?

"Em julho de 1994, há o nascimento do Plano Real. O salário mínimo era de R$ 64,69. Se hoje ele fosse corrigido somente pela inflação, seria de R$ 403,42. Será que o País seria melhor com esse valor? A indústria estaria produzindo mais e o Governo arrecadando mais tributos com R$ 403 do que R$ 998", questiona o supervisor técnico do Dieese no CE, Reginaldo Aguiar. "Corrigir só pela inflação, além de causar danos significativos à sociedade, não resolve a economia brasileira. Portanto, é um equívoco destruir uma das melhores política públicas de minimização de pobreza e distribuição de renda", diz.

Vitor Hugo Miro, coordenador Laboratório de Estudos da Pobreza da Universidade Federal do Ceará (UFC), reitera que os efeitos imediatos serão a redução do poder de compra e pauperismo. "Diversos estudos mostram que, quando o salário mínimo tem reajuste acima da inflação, isso contribui para reduzir a desigualdade", afirma. Para ele, o ideal seria uma política pautada pela produtividade, e não pela inflação. Outro ponto é que, com baixa remuneração, as pessoas comprarão menos e a economia seguirá em ritmo lento.

Já o professor do Departamento de Administração da Universidade de Brasília (UnB), Jorge Pinho, pondera que esse modelo é necessário para puxar a atividade econômica na atual conjuntura. "Para distribuir renda é preciso tê-la. Como o Brasil está em recessão, já que a crise continua, não há de onde tirar recursos. Se você aumentar o salário, as empresas vão começar a demitir para distribuir entre os outros funcionários que sobraram. É uma situação complexa", avalia.

Lauro Chaves, conselheiro federal de Economia e PHD em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, acredita que haverá benefícios que poderão ser observados quando o Brasil retomar o crescimento em 2020 e 2022. "A correção pela inflação garante o poder de compra do salário mínimo. Temos que reforçar que ele é muito baixo para as necessidades básicas de alimentação, educação e saúde de uma família. Nós temos que voltar a ter uma política de valorização acima, mas será possível após a redução do desemprego", acrescenta.

IMPACTO

O Governo Federal propõe salário mínimo de R$ 1.039 em 2020, sem reajuste real. Cada aumento de R$ 1 no mínimo terá impacto em torno de R$ 298,2 milhões no Orçamento do próximo ano. O reajuste representa uma alta de um pouco mais de 4% em relação ao valor atual (R$ 998)

FORTALEZA, CE, BRASIL. 04-09-2019: Personagem que teve seu salário minimo congelado. (Fotos: Deísa Garcêz/Especial para O Povo)
FORTALEZA, CE, BRASIL. 04-09-2019: Personagem que teve seu salário minimo congelado. (Fotos: Deísa Garcêz/Especial para O Povo)

Personagem

Com uma renda mensal de um salário mínimo, a artesã Rosa Santos, 56 anos, teme como ficará a situação após a mudança. Atualmente, ela destina 30% do que ganha somente para o plano de saúde. "É muito difícil, a gente vai ao mercantil e o preço dos produtos aumenta, mas o salário não. A gente tem que comprar as coisas, pagar o aluguel, entre tantas outras responsabilidades", relata. "Este ano está parecendo com os anos 1990, quando tinha muita gente desempregada no Brasil. Agora, com essa mudança que o Governo vai fazer no salário mínimo, acredito que a situação vai ficar pior", diz.

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