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Bolsonaro prioriza política, desautoriza Guedes e dá três dias para nova proposta do Renda Brasil
Economia

Bolsonaro prioriza política, desautoriza Guedes e dá três dias para nova proposta do Renda Brasil

Presidente quer que Renda Brasil chegue aos R$ 300, mas não aceita corte em benefícios para gerar espaço no orçamento. A solução não pode impactar a popularidade e Bolsonaro deu três dias ao ministro para nova proposta
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BOLSONARO dá três dias para Guedes apresentar nova proposta de Renda Brasil (Foto: MATEUS BONOMI/AE)
Foto: MATEUS BONOMI/AE BOLSONARO dá três dias para Guedes apresentar nova proposta de Renda Brasil

A proposta do ministro da Economia, Paulo Guedes, de revisar ou extinguir outros benefícios para gerar caixa que banque o Renda Brasil, foi suspensa pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Ontem, o chefe do Executivo desautorizou Guedes e quer nova proposta em três dias para o novo programa social que substituirá o Bolsa Família. Medida dá indicativo que o presidente deixa de lado a agenda liberal de contenção de gastos e busca atender anseios políticos de olho em 2022.

O Renda Brasil será a marca social da gestão Bolsonaro, com o principal trunfo sendo o valor do benefício superior ao Bolsa Família. Na ideia do presidente, o valor seria o mesmo das parcelas finais do auxílio emergencial, de R$ 300. A Guedes, ele avisou que não vai "tirar de pobres para dar a paupérrimos".

Um novo encontro de Bolsonaro com ministros foi marcado para amanhã, mas ainda não foi oficializado pelo Planalto. Técnicos que trabalham no desenho do Renda Brasil se reuniram ainda ontem para dar início aos ajustes pedidos pelo presidente, que quer uma solução sem passar pela revisão do Abono Salarial, que geraria desgaste no Congresso e revés na popularidade, que atualmente é a melhor desde o início da gestão.

A avaliação na área econômica, porém, é que a revisão do abono salarial era "fundamental" para criar espaço no Orçamento para bancar o novo programa, que teria maior alcance e valor de benefício que o Bolsa Família. Somente a extinção do abono, uma espécie de 14º salário pago a trabalhadores com carteira assinada, poderia liberar cerca de R$ 20 bilhões.

Para o economista e presidente da Associação dos Profissionais de Investimentos Nordeste (Apimec-NE), Célio Fernando de Melo, a realidade do Brasil não permite medidas descabidas que ponham em xeque as contas públicas, pois o Brasil tomou uma série de ações emergenciais durante a pandemia, o que acabou impactando os caixas públicos.

Célio ainda ressalta que é papel da equipe econômica procurar opções para liberar orçamento. Quanto ao presidente, diz que, no momento em que se transforma a República num populismo, a trajetória da economia vai ser prejudicada.

Na análise do economista, há fuga de investimentos em países populistas que criam subterfúgios. "Se o Brasil quer o 'me engana que eu gosto' teremos uma situação caótica e assim não adianta".

"Não acredito que seja uma provocação política. Não sabemos, porém, se há uma fritura. Se fritar o Paulo Guedes, acabaram-se os investimentos, pois ele é o último pilar do governo. Lembramos que Bolsonaro tem mais dois anos e não dá para governar assim. Popularidade vai e volta, mas sempre é preciso ter equilíbrio, na economia e nos discursos", analisa.

Entre integrantes da equipe econômica, já há a percepção de que o Renda Brasil vai acabar com alcance e valor "não tão diferente" do Bolsa Família, que hoje paga em média R$ 190 a 14 milhões de famílias, diante das resistências do presidente em bancar a revisão dos programas considerados ineficientes e a necessidade de respeitar o teto de gastos (que limita o avanço das despesas à inflação).

Diante da pressão do presidente, o ministro da Economia, que inicialmente havia proposto R$ 247 ou R$ 270, avisou que para chegar a R$ 300 é preciso cortar deduções de saúde e educação do Imposto de Renda. (Com Agência Estado)

 

Guálter George
Guálter George

Ponto de vista: O ministro que não gosta de política e é correspondido

Alguém fez crer ao economista Paulo Guedes que, de fato, sua importância para a sustentação do governo Bolsonaro o colocava em plano de equivalência com o presidente da República, apesar de apenas este último ter chegado ao posto levado por um caminhão de votos.

Pode ter sido uma parcial verdade na transição e até nos momentos bem iniciais de governo, mas, talvez, sem que sua inexperiência permitisse captar, o prestígio inabalável lá do começo, daquele "Posto Ipiranga", foi sendo minado pela conjuntura naturalmente turbulenta, agitada e traiçoeira de Brasília. Coisa da política, se querem uma indicação mais clara de quem está por trás de quê.

Guedes nunca gostou de Brasília e sempre passava a ideia de que estar ali, e no governo, era um sacrifício que fazia em nome de algo. Resistiu o que pode a ter um endereço na cidade e preferiu a solidão de um quarto de hotel, correndo para o Rio de Janeiro, onde mora, sempre que uma oportunidade surgia. Apenas recentemente, talvez já começando a entender melhor o mecanismo, sucumbiu à ideia de ter uma casa ali.

O que ainda prende Paulo Guedes ao cargo, minado que esteja, são compromissos com a ideia econômica de liberalismo. O ministro tem uma missão e ela não está ligada a Bolsonaro, que nunca foi um crítico do Estado generoso (é onde está pendurada toda a sua família). Significa que talvez ainda aceite encarar um chefe que até então lhe tem apoiado apenas no discurso e uma classe política, mesmo a que se diz base do governo, que, quando muito, o tolera.

Guálter George, editor executivo de Política do O POVO

 

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