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Caçada a asteroide desperta curiosidade de moradores no interior do Ceará
Economia

Caçada a asteroide desperta curiosidade de moradores no interior do Ceará

De Mulungu a Baturité, cearenses contam o que viram e ouviram quando da passagem de um asteroide no último sábado, 10
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MULUNGU, CE, BRASIL, 11.10.2020: Francisco Josue Miranda Sena. em época de COVID-19.  (Foto: Aurelio Alves/ O POVO). (Foto: FOTOS: Aurelio Alves)
Foto: FOTOS: Aurelio Alves MULUNGU, CE, BRASIL, 11.10.2020: Francisco Josue Miranda Sena. em época de COVID-19. (Foto: Aurelio Alves/ O POVO).

Morador de Guaramiranga, no maciço de Baturité, Francisco Ferreira Campos, 70, acordou cedinho naquele sábado, 11. Muito antes das 7 horas, já tinha se esticado para brincar com Preta, a cachorra, enquanto a esposa se endireitava na cama. Mal se pôs de pé, ouviu o estrondo. "Era o mundo se acabando", lembra. Jamais lhe passou pela cabeça a hipótese de asteroide.

Preta se enfiou debaixo do sofá. Francisco olhou pro lado. Maria José, a esposa, tinha congelado no seu movimento. "Da cintura pra cima", conta o marido, "não se mexia". Da cintura pra baixo, "era uma tremedeira do joelho aos pés".

 

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Um dia depois, sentada na varanda da casa e já recuperada do susto, Maria, 69, atalha: "Isso são os sinais de Deus, que estão dando um aviso". Em seguida, pede licença e sai. Francisco acha que a mulher ainda está abalada.

Em todo o maciço, se são poucas as pessoas que admitem ter visto o rastro luminoso do asteroide riscar o céu do interior do Ceará e cair sabe-se Deus onde, todos se apressam a falar sobre o que se passou quando escutaram "o papoco", "a terra se abrindo", as "placas tectônicas se desmanchando" ou "a lingueta de fogo", a depender de quem conta a história.

Já desperto àquela hora, Francisco Josué Miranda Sena, 39, diz que escutou "uma explosão". Sem saber do que se tratava, correu para junto da estátua de São Sebastião, fincada no alto do mirante da cidade de Mulungu, onde trabalha e cria os filhos - também arrancados da cama mais cedo pela zoada incomum.

"Achei que fosse uma bomba muito grande, placas tectônicas se desmanchando, um vulcão em Guaramiranga", diz, afogueado. Só se aquietou após descobrir o que havia sobressaltado a região inteira.

Pouco depois das 6h44min, momento preciso em que o asteroide se fragmentou, produzindo um estampido ruidoso que se fez ouvir de Canindé a Palmácia, Maria Beata, lá na sua Itapiúna, mandou uma mensagem de áudio para uma rádio local.

Assim narrou o acontecido: "Meu marido fez café. Quando nós tava sentado, partiu um negócio com uma lingueta de fogo. Tapei os ouvidos dizendo valha-me, Nossa Senhora. Eu disse: olha ali as 'tochona' de fogo, com as 'lingueta' de fogo". Do quintal da residência, no distrito de Palmatória, assegura: viu a bola de fogo cair.

Aos 65 anos e solteiro depois de uma frustração amorosa, Marcos Henrique lavava roupa na cozinha, em Pacoti. Não viu um fiapo do bólido passar acima da cabeça. Mas escutar, escutou. Nesse instante, relata, deixou as camisas e cuecas de lado e disparou rumo ao terreiro: "Pensei: caiu um avião". Não era.

Sacristão na igreja matriz de Baturité, José Augusto, 31, deu por certo que havia uma razão terrena para o ronco matutino: uma batida de caminhão. Mas desconfiou quando, já na rua, viu um amontoado de gente se perguntando sobre o que tinha acontecido, enquanto o trânsito fluía normal.

"As pessoas estavam assustadas", fala. "Quando o pessoal foi começando a publicar na internet, a gente viu que tinha caído o asteroide." Na missa, acrescenta Augusto, o padre dedicou meia dúzia de palavras para acalmar o rebanho.

Mas há quem não se importe se todo o Ceará não fala de outro assunto além do fenômeno astronômico. Escorado no batente do Bar da Mangueira, no centro de Guaramiranga, Antônio gracejou com os amigos: "Ninguém aqui na cidade escutou nada porque todo corno é mouco". Ante os protestos, remendou a piada.

"Olha, agora falando sério", começou, em tom conspiratório. "Isso aí não tem nada a ver com asteroide. Tem uma explicação. Foi um voo naval, caças da Suécia comprados pelo Brasil que partiram de uma base e passaram por aqui, romperam a barreira do som. O estrondo foi imenso."

Perguntei se podia provar sua teoria. "Falei com uma pessoa. É bom investigar, mas esse assunto pertence ao estado-maior, tenha cuidado." Depois, cochichando: "Foi um impacto supersônico, é uma questão de Física, você sabe. Eu poderia explicar, mas já falei muito. Pesquise o assunto". Quando lhe perguntei o nome, despistou: "Não posso dizer meu nome completo, isso também é segredo".

Já a aposentada Aldenira Lopes, 67, não se deixou surpreender pelo acontecimento. Enquanto o asteroide cruzava o tempo, punha-se a varrer o quintal, em Mulungu. "Pensei que fosse um pau caindo na casa do vizinho", abrevia sua reação.

Quando questionada se tinha se espantado com o evento, responde: "Não fiquei assustada, não. Continuei a varrer. Disseram até que era o fim do mundo, mas eu acredito em Deus".

 

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