A cotação do dólar no Brasil voltou a fechar a semana em alta, comercializado a R$ 5,56. Passados pouco mais de 70 dias do início de 2021, a desvalorização cambial já alcança 4,45%. Em 12 meses, é de 16%. Dólar a quase R$ 6, euro a R$ 7 e libra a R$ 8. A desvalorização do real frente às outras moedas internacionais é um sintoma de economia cambaleante que se fragilizou durante duas crises, a sanitária e a política. Em 2020, a moeda brasileira foi a que mais se desvalorizou dentre o conjunto de países com as maiores economias do mundo.
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De acordo com levantamento da Austin Rating no fim de dezembro, o real apresentou desvalorização acumulada de 22,4%, de acordo com seus cálculos (ainda sem o resultado final de dezembro), o que deixou o País com a sexta maior perda acumulada do mundo, atrás de países como Seychelles, Zâmbia, Angola e dos vizinhos sul americanos Venezuela (liderando o ranking com -95,7%) e Argentina. Outro levantamento, da gestora Armor Capital, revela que, em 2021, o real tem um dos três piores desempenhos do mundo frente ao dólar, diante somente de Cuba (recuo de 95%) e Líbia (-70%), e atrás de Mianmar, que recentemente passou por um golpe militar.
O impacto dessa desvalorização na economia real já é sentida pelos consumidores no mercado nacional, diversos produtos da cesta de consumo diária dos brasileiros estão com patamares de preços mais elevados. Do pãozinho aos combustíveis, a escalada do dólar tem o poder de modificar o dia a dia. Ao mesmo tempo, alguns segmentos comemoram, como é o caso dos exportadores.
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Raul Aragão, sócio da CDP Capital, explica que a diferença entre benefício e prejuízo está ligado ao quanto o negócio é dolarizado. Ele aponta que o atual patamar cambial deve ser estabilizado, retraindo a um nível próximo de R$ 5, mas algumas ações precisam ser observadas.
"O que deve contribuir são as aprovações de reformas para melhorar a visão dos investidores e diminuir o risco, o próprio mercado já precifica o aumento da Selic próxima a 3%, o que ajuda a trazer mais fluxo estrangeiro para o Brasil (na compra dos papéis de renda fixa)", destaca.
Na última semana muito foi falado sobre a variação no câmbio está diretamente ligada ao discurso feito pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Raul observa que não só o fator político influiu, mas o risco fiscal do Brasil também interferem de forma importante.
Reação importante à escalada do dólar na semana foi a estratégia mais ativa de intervenção do Banco Central no câmbio, que fez a moeda norte-americana cair 2,18% na semana. Foi a maior desvalorização desde a última semana de novembro de 2020 - sob cotação em patamar bem maior, é verdade. A aprovação da PEC Emergencial também ajudou.
Apesar da melhora na semana passada, a dúvida que fica é se o real vai conseguir recuperar terreno de forma sustentada. Isso por causa da escalada do tom de disputa política no País com o início de montagem de palanque político para 2022. O temor do mercado é que a resposta do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) aos gestos e discursos de Lula seja com mais medidas populistas, atrasando ainda mais o avanço das reformas fiscais.
Para o cientista político e coordenador da pós-graduação em Relações Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília, Márcio Coimbra, a atuação do governo em torno de um "populismo econômico" tem gerado efeitos negativos para a credibilidade do Brasil no mercado, o que desestimula os investidores que veem uma guinada nas contas públicas justificada pela pandemia, mas, sem planejamento e ações efetivas, a União não consegue proteger o emprego e a sobrevivência empresarial do abalo econômico.
"O País se tornou refém de meras medidas assistencialistas que se resumem na transferência de renda pura e simples. Uma medida paliativa, de alto custo e que deixa de criar instrumentos para recuperação econômica da população", avalia.
No entendimento de Márcio, as ações tomadas observando o ganho político empurram os custos da aventura econômica para as gerações futuras. "Se de um lado Bolsonaro opta pela tática do confronto, de outro começa a trilhar com maior convicção o populismo econômico. O resultado é perigoso. Estamos vendo a perda de credibilidade do País no Exterior, queda nas bolsas e alta no dólar. O mundo enxerga que, de forma cíclica, adentramos pelo populismo, seja pela direita ou pela esquerda. Um erro, que se não for corrigido, colocará nossa credibilidade em xeque por décadas, perdendo mais uma geração para nossos próprios erros", analisa.
Revisões
Com tantas e tamanhas incertezas domésticas e cenário global mais desafiador, o Itaú elevou na sexta-feira, 12, a previsão para o dólar para R$ 5,50 em 2021. A previsão anterior era de R$ 5,00.
R$ 6,64
É o valor da cotação do euro no mercado de câmbio no fechamento da sexta-feira, 12.
R$ 7,74
É o valor de comercialização da libra no mercado de câmbio nacional.