Logo O POVO+
Guerra afeta custo de fertilizantes e produtor prevê redução no plantio
Economia

Guerra afeta custo de fertilizantes e produtor prevê redução no plantio

| GLOBALIZAÇÃO | Dirigentes de cooperativas de produtores revelaram que os fabricantes e fornecedores de adubo já retiraram as listas de preço do setor comercial, o que pode significar aumento
Edição Impressa
Tipo Notícia Por

O impacto da invasão da Ucrânia pelas tropas da Rússia já produz efeito nos campos de produção agrícola do Brasil. Os dois países têm relações comerciais com o agronegócio brasileiro, mas o Brasil depende principalmente dos fertilizantes russos.

O agricultor Cristiano Ronconi, que produz soja e milho em Itambé, no Paraná, conta que, dependendo do aumento no preço dos fertilizantes, vai ficar mais difícil ocupar todas as áreas de plantio. "Já reduzi 10% da área na safra passada devido ao custo, pois o adubo subiu mais de 200%. Se houver nova alta, vou reduzir mais. A briga (guerra) é deles, mas prejudica a gente aqui."

Dirigentes de cooperativas de produtores revelaram que os fabricantes e fornecedores de adubo já retiraram as listas de preço do setor comercial, o que pode significar aumento.

Para o engenheiro agrônomo Ricardo Cunha, diretor da Fazenda Lagoa Bonita, produtora de grãos e sementes em Itaberá, no sudoeste paulista, não há nenhum ganho para o agronegócio brasileiro com a guerra. "Fora a questão humanitária, por enquanto só sentimos efeitos negativos. Aumento nos preços dos fertilizantes, especialmente nitrogênio e potássio, que já estavam muito caros", disse.

O Brasil depende da Rússia para o fornecimento de grande parcela das matérias-primas para fertilizantes utilizados em lavouras como soja e milho, principais grãos de exportação do País.

Do território russo procedem 20% dos nitrogenados, 28% dos potássicos e 15% dos que têm fósforo em sua composição. A soja, principal commodity brasileira, depende de adubos à base de fósforo e de potássio. O milho depende dos nitrogenados.

Na visão de Cunha, a continuação da guerra só ampliará os efeitos negativos. "Teremos problemas nas cadeias de suprimento de adubos e na exportação de trigo e milho da Ucrânia e Rússia. Isso pode trazer preços maiores para esses dois cereais. Não sei se (o preço mais alto) irá compensar o aumento de custo dos agricultores", disse.

O agricultor Emílio Kenji Okamura, dirigente da Cooperativa Agrícola de Capão Bonito, que reúne produtores de soja, milho e trigo no sudoeste paulista, também acredita que a guerra vai afetar o fornecimento de fertilizantes. "Pode haver aumento, senão agora, no segundo semestre."

Da mesma forma, ele crê em elevação nas cotações do milho e trigo. "A Ucrânia é o quinto país em produção de milho, mas os grandes produtores são Estados Unidos, China, Brasil e Argentina. Esses países podem garantir os estoques. Já com o trigo, o mundo depende muito da Rússia. Se eles segurarem o produto no mercado interno como precaução, não sabemos como vai ficar e onde vai parar o preço."

A alta no preço do trigo pode atingir produtos como pão, pizza e macarrão.

Milho

No caso do milho, a Ucrânia está entre os quatro maiores exportadores, atrás de países como Argentina, Brasil e Estados Unidos. Se, de um lado, o produtor brasileiro pode se beneficiar com a alta de preços devido à menor exportação da produção ucraniana, de outro, os produtores de frangos, ovos e suínos sentirão o impacto do custo do milho na ração.

O pecuarista José Fernandez Lopez Netto, criador de gado de corte em Itapeva, no interior paulista, acredita que, sem levar em conta os aspectos trágicos do conflito, a guerra pode até favorecer o mercado de carne bovina brasileira - o País é o maior exportador do mundo. "Diferentemente de outros países produtores, o gado brasileiro é criado no pasto. Na maior parte do mundo, o boi é produzido em estábulos e vai sofrer com o alto custo dos grãos, além da energia consumida durante o inverno."

O maior comprador da carne nacional é a China, porém, segundo o pecuarista, o Irã e outros mercados estão se abrindo. "A guerra mexe com o dólar, e sobem todas as commodities. Há impacto no custo de produção do boi, mas o preço da carne também sobe. Para a carne bovina, a tendência é de melhorar", disse.

Para o presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Fernando Cadore, a guerra já afetou alguns setores da produção agrícola. "O primeiro impacto é no preço do petróleo e, consequentemente, dos combustíveis."

Caso a exportação de grãos dos dois países em conflito seja afetada, Cadore analisa que o mercado poderia ser suprido por outros países produtores, como Brasil, Argentina e Estados Unidos. Nesse caso, a produção brasileira seria favorecida pela demanda maior.

Em sua visão, a importância do Brasil no cenário mundial aumenta. "Com guerra ou sem guerra, o cidadão precisa se alimentar e o Brasil tem produção para garantir a segurança alimentar." 

Hungarian army members stand guard as people flee from Ukraine to Hungary, after Russia launched a massive military operation against Ukraine, in Vasarosnameny, Hungary, February 25, 2022. REUTERS/Bernadett Szabo
Hungarian army members stand guard as people flee from Ukraine to Hungary, after Russia launched a massive military operation against Ukraine, in Vasarosnameny, Hungary, February 25, 2022. REUTERS/Bernadett Szabo

Conflito também pode impactar inflação e PIB

Com a invasão da Ucrânia por tropas russas, o Brasil pode sentir os efeitos por meio de pelo menos três canais: combustíveis, alimentos e câmbio.

A instabilidade no Leste europeu pode não apenas impactar a inflação como pode resultar em aumentos adicionais nos juros, comprometendo o crescimento econômico ao reduzir o espaço para a melhoria dos preços e do consumo.

Segundo a pesquisa Sondagem da América Latina, divulgada nesta semana pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), as turbulências na Ucrânia devem agravar as incertezas que pairam sobre a economia global nos últimos meses.

Uma das razões dos impactos no País é a exposição maior aos fluxos financeiros globais que o restante da América Latina. (Agência Brasil)

O que você achou desse conteúdo?