Não é apenas o reajuste de 24,85% na conta de luz que vem incomodando o cidadão e o setor produtivo cearense. A qualidade do serviço prestado também tem sido alvo de questionamentos. De acordo com dados do Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (Decon Ceará), do total de reclamações registradas entre 1º de janeiro e 29 de abril de 2022, 18,46% são relativas à Enel.
Em igual período, apenas em Fortaleza, 1.170 reclamações sobre energia elétrica foram formalizadas no Procon Fortaleza. O que representa 19,6% das 5.960 queixas recebidas no período. Está à frente, por exemplo, das denúncias contra bancos comerciais; água e esgoto; telefonia celular e cartão de crédito.
Em 2021, o cenário se repetiu. A empresa também foi a líder no ranking de reclamações do Decon, que ao longo do ano realizou 30.309 atendimentos. Dentre os principais problemas apontados estão: falhas no serviço; cobrança indevida ou abusiva; dúvida sobre cobrança, valor, reajuste, contrato ou orçamento; e rescisão ou alteração unilateral de contrato.
Já no Procon Fortaleza, entre 2020 e 28 de abril de 2022, entre as queixas relatadas em relação aos serviços de energia elétrica figuram cobrança indevida ou abusiva; dúvida sobre cobrança, valor, reajuste, contrato ou orçamento; Termo de Ocorrência de Irregularidade (TOI); Dano material ou pessoal decorrente do serviço; e consulta sobre os serviços.
Como as reclamações não são apenas estatísticas e sim casos de pessoas que dependem deste serviço básico, a situação fica bem difícil no dia a dia. Durante a audiência pública promovida pela Associação Cearense de Direito do Consumidor (Acedecon) ontem, na sede da Fecomércio, a advogada Fabiana Farah relatou um caso pessoal em que teve que enfrentar de 36 horas sem energia elétrica em casa.
“Tenho uma filha com deficiência e ela estava usando aerosol, fazendo um tratamento respiratório, usando seis vezes ao dia. Eu não tinha como ficar sem energia e precisei ficar indo e voltando da casa de um familiar para poder continuar o tratamento da minha filha”, contou.
Durante o período, Fabiana anotou mais de 15 protocolos diferentes até o restabelecimento da energia que foi causada por um problema externo da casa. Ela ainda recebeu erroneamente um TOI e teve que contestar o termo. Além disso, teve o prejuízo com o estrago de todos os alimentos que estavam na geladeira e, também, no freezer.
Outra realidade que conhece de perto é a dos idosos e de outros deficientes e disse que muitos possuem atendimento home care hospitalar, que já está incluso no plano de saúde. “Mas a energia é de responsabilidade da pessoa e muitos aparelhos precisam ficar 24 horas ligados”, comentou. Outra preocupação são seus clientes com idades mais avançadas e dependem exclusivamente da aposentadoria.
“Eles recebem um salário que serve para todas as despesas deles de subsistência, não só de alimento, mas também para remédio, fraldas e muitas vezes aluguel. Agora com esse aumento de energia vai ficar ainda mais difícil suportar o valor mínimo que recebe de aposentadoria para poderem pagar tudo”, ressaltou a advogada.
Em relação a audiência, o presidente da Acedecon, Thiago Fujita, concluiu que é impossível modificar a situação da elevação da tarifa de energia elétrica sem discutir diretamente o contrato da Enel Ceará. “Não dá para fazer análises ou cálculos meramente econômicos sem verificar o cenário atual da sociedade, tudo o que aconteceu, pandemia, o impacto de uma guerra e simplesmente aplicar um reajuste, não ter a menor condição e, principalmente, um reajuste de quase 25%”.
Entre os próximos passos estão contato com alguns órgãos de defesa do consumidor, em esfera estadual e federal para contribuir de todas as formas. “Como assistente em novas ações, para evitar danos na economia cearense por conta deste aumento extremamente impactante. Vamos conversar com o poder legislativo e depois vamos alinhar uma possibilidade com o poder executivo estadual”, revelou.
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