O envio de um ofício da Petrobras ao Ministério de Minas e Energia (MME) alertando para o risco de desabastecimento de diesel no Brasil, acendeu o temor de uma nova alta de preços. Somente no Ceará, o preço médio do combustível aumentou 57,17% nos últimos 12 meses, passando de R$ 4,67 para R$ 7,34.
No documento, a Petrobras relata que, diante do cenário de escassez global de diesel e do cronograma de paradas programadas das refinarias, entende que há elevado risco de desabastecimento de diesel no mercado brasileiro no 2º semestre de 2022. Também diz que suas refinarias estão operando próximas das suas capacidades máximas, ou seja, não têm mais condições de aumentar a produção. Adicionalmente, há também grandes incertezas quanto aos níveis das cotações internacionais do produto nessa conjuntura de escassez.
Na tentativa de evitar especulações sobre o tema, a Pasta se manifestou ontem por nota informando que os estoques do diesel S10 no País, somados com a produção nacional, são capazes de suprir o mercado brasileiro por 38 dias, no mínimo, sem necessidade de realizar novas importações do produto. Mas que monitora de perto a questão.
Contudo, uma eventual redução prolongada no abastecimento poderia se refletir em alta do produto para o consumidor, devido à necessidade de importar o diesel. A Petrobras estima que, hoje, a defasagem do valor do combustível no mercado interno em relação ao externo é de 4% e que para equipará-los precisaria aumentar o litro do diesel em R$ 0,19 nas refinarias.
Especialistas consultados por O POVO, assim como o Ministério de Minas e Energia, minimizam, porém, o risco de desabastecimento. Na esfera estadual, por exemplo, o assessor de assuntos econômicos do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado do Ceará (Sindipostos), Antônio José Costa, afirma que os postos de combustível do Ceará, embora em estado de alerta, não têm problemas de estoque e vê como natural o comunicado enviado pela Petrobras à Pasta.
"A Petrobras faz essa advertência para que os postos se previnam há, pelo menos, dez anos. Pode ser que haja uma situação atípica agora. Mas não temos informação sobre isso. O fato é que última vez que tivemos desabastecimento foi em 1973, na crise internacional do petróleo. Nem na greve dos caminhoneiros em 2018 tivemos problemas graves", enfatizou.
Por falar em caminhoneiros, o presidente da Associação Nacional de Transporte do Brasil (ANTB), José Roberto Stringasci, é mais incisivo em rechaçar o risco de desabastecimento. "É uma jogada da Petrobras. Ela vai forçar essa situação para justificar aumentos que vão ter aí pela frente, porque eles estão evitando mexer na política de preços dos combustíveis", critica.
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria do Petróleo no Ceará e no Piauí (Sindipetro CE-PI), Ivan Gonçalves Vieira Filho, por sua vez, não descarta a possibilidade de desabastecimento por completo, mas afirma que, se isso ocorresse, viria como resultado da atual política de combustíveis adotada no País.
"A política do Governo Federal é a de vender o petróleo cru e comprar o combustível refinado no Exterior. Essas refinarias internacionais processam esse petróleo e mandam o diesel mais caro para cá. A gente deixa de gerar impostos e empregos dentro do País e vai gerar lá fora", dispara.
'Falar em desabastecimento é praticamente um crime', diz economista
O economista Cláudio Oliveira classificou a alegação de risco de desabastecimento pela Petrobras como "praticamente um crime". Ele também é crítico de recentes análises feitas pela companhia quanto à composição dos preços do diesel e da gasolina que chegam nas bombas para o consumidor.
"O Brasil nunca teve problema de abastecimento de combustível, mesmo não tendo refinaria nenhuma. A responsabilidade do abastecimento de combustível no Brasil está estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias e não é atribuição da Petrobras, que tem de seguir as instruções que vem de órgãos como a Agência Nacional do Petróleo (ANP), que detém todo o histórico dos estoques, das importações, das exportações, da produção, para determinar se vai haver falta ou não. E a Petrobras parece fazer uma ameaça de reduzir a produção", pontua.
Ele acrescenta que "qualquer falta de diesel que existir tem de ser compensada com importações". Oliveira defende ainda que "a solução para o problema de preço de combustíveis no Brasil está na efetiva taxação da Petrobras de isenções que foram concedidas para a empresa numa época em que ela se comportava como empresa estatal. Hoje, ela se coloca numa postura de empresa independente e tem de ser taxada como tal".