Após forte queda de gasolina (-11,33%) e energia elétrica (-6,1%), o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) na Região Metropolitana de Fortaleza apresentou deflação de 0,65% em julho. Na média nacional, a queda foi maior, de 0,68%, a maior para o mês na série histórica, interrompendo uma sequência de 25 meses de alta.
O quadro, porém, não é tão animador, uma vez que 60% dos produtos analisados no IPCA apresentaram alta e a pressão na cesta de produtos dos mais pobres permanece grande. A inflação das famílias mais pobres é medida pelo INPC, que também teve deflação (-0,6%), mas num nível menor que o índice geral.
Em julho, apesar da importante deflação de combustíveis e energia, aumentaram os custos dos produtos alimentícios. Em junho, a inflação desses produtos foi de 0,78%, enquanto em julho deu salto para 1,31%. Já os produtos não alimentícios apresentaram movimento contrário, passando de alta de 0,57% para deflação de 1,21%.
Esse movimento revelou um novo vilão para os consumidores: o leite longa vida. O produto subiu de preço em todas as cidades pesquisadas. Em Fortaleza, o produto subiu mais de 22,8%. A segunda alta mais importante foi do preço do mamão (9,85%).
Tatiana Nogueira, economista da XP, destaca que o processo inflacionário pelo qual o Brasil e outros países passaram ganhou sobrevida com a guerra na Ucrânia, que encareceu os preços de commodities agrícolas, metálicas, mas principalmente, energéticas.
Apesar de acreditar que os custos devem diminuir ao longo da metade final do ano, Tatiana ressalta que o fato dos combustíveis terem gerado deflação, não está assegurado esse comportamento até o fim do ano.
"Essa deflação é pontual, portanto não é duradoura. Ela é exclusivamente efeito das medidas de corte de impostos. Passados os efeitos desses cortes, voltaremos a ter inflação mensal positiva", analisa.
Na avaliação de Alessandra Araújo, professora da Universidade Federal do Ceará e membro do Laboratório de Estudos da Pobreza (LEP-UFC), a deflação de julho é muito restrita a dois itens que tem muito peso no cálculo do IPCA.
Isso fez com que aumentos sensíveis, principalmente na alimentação, não terem o mesmo impacto no índice, mas que certamente terão no orçamento das famílias, principalmente as mais pobres.
"Essa deflação não chegou no bolso dos mais pobres ainda", pontua.
Pesquisa realizada pelo Datafolha no fim do primeiro semestre já principiava esse quadro: 1 em cada 4 brasileiros afirmou não ter comida suficiente em casa para alimentar a família. A situação entre os mais pobres é a mais preocupante.
Entre os brasileiros com renda familiar de até dois salários mínimos (R$ 2.424), a parcela dos que dizem não ter o suficiente para se alimentar é de 38%.
Ontem, O POVO publicou que 1 em cada 4 brasileiro não possui renda suficiente para pagar em dias suas despesas. E a maioria dos brasileiros afirma só ter orçamento disponível para pagar as despesas básicas, não sobrando recursos para poupar, investir ou mesmo gastar com lazer.
"Com a alta do leite e dos alimentos, temos um impacto maior para que gasta boa parte da renda com alimentação, que são as pessoas mais pobres. Quando menor o nível de renda da família, proporcionalmente, ela gasta mais seu salário com alimentação", completa Alessandra.