Quem não está com o nome negativado junto às instituições de proteção ao crédito, certamente, conhece alguém que esteja. Isso porque nada menos que 33,4% dos cearenses está inadimplente, conforme a Serasa. O índice é superior à (já alta) média nacional, que fica em torno de 29,8%.
São nada menos que 2,9 milhões de cearenses com contas em atraso que juntos somam cerca de 9,7 milhões de dívidas. O ticket médio de cada um desses débitos é de R$ 1.152, ou 88,4% do valor do salário mínimo. Contudo, quem está inadimplente deve em média R$ 3.757. Isso significa dizer que o perfil do endividado cearense é de ter, pelo menos, três contas em aberto.
No Brasil, o número de inadimplentes é estimado em 62 milhões de pessoas. O alto número de endividados não passou em branco na campanha eleitoral à Presidência da República em 2022 e já havia sido uma das bandeiras do ex-governador do Ceará, Ciro Gomes (PDT), ainda em 2018. No segundo turno do pleito do ano passado, por sua vez, o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prometeu criar um programa voltado para quem deve e não consegue quitar seus respectivos débitos, o Desenrola.
Na última semana, a equipe econômica do agora presidente Lula anunciou os primeiros detalhes do programa de renegociação de dívidas, visto com um misto de esperança e ceticismo por devedores, economistas e especialistas em recuperação de crédito. Conforme os primeiros detalhes divulgados pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), o programa deve beneficiar 37 milhões de pessoas com débitos de até R$ 5 mil vencidos há mais de 180 dias. Os descontos devem variar de acordo com a faixa de renda dos endividados.
Inicialmente, a ideia de Haddad era focar o programa em quem tem renda mensal de até dois salários-mínimos, mas o próprio ministro anunciou nesta semana que o Desenrola será estendido a outros públicos. Para quem ganha menos, no entanto, o governo estipula descontos maiores. O montante previsto para a iniciativa, nesse primeiro momento, seria de R$ 50 bilhões, dos quais cerca de R$ 10 bilhões teriam como origem um fundo garantidor formado por recursos do Tesouro Nacional.
A intenção do fundo é, justamente, cobrir eventuais calotes dos participantes dos processos de renegociação que tenham renda inferior a R$ 2.604. O Desenrola será instituído por meio de medida provisória, o que significa dizer que após ser decretado estará em vigor por um período de 120 dias e se não for apreciado pelo Congresso nesse período perderá a validade.
A primeira etapa do programa deve funcionar como um leilão em que as empresas interessadas em participar devem informar o percentual de desconto dispostas a conceder aos seus devedores. "Quanto maior o desconto oferecido, maior a chance de o credor receber o débito", disse Fernando Haddad, ao apresentar os primeiros detalhes da iniciativa.
Ontem, Haddad, voltou a afirmar que já foi liberada a contratação do sistema operacional do Desenrola. Ele destacou a complexidade do sistema e evitou estimar prazos para inauguração do programa. "É um sistema complexo, porque é uma dívida privada", disse. "Nunca foi feito nada semelhante. Então vamos precisar desenvolver", complementou.
Para a gerente da Serasa, Amanda Castro, o cenário é extremamente desafiador. "A gente vem acompanhando esse crescimento da inadimplência no País, mês após mês, e é um pouco assustador", ressalta.
"Quando a gente olha para o Ceará, são quase três milhões de inadimplências e um montante de R$ 11,2 bilhões de reais em dívidas concentradas apenas em um estado", explica Amanda.
Para o pesquisador em finanças comportamentais, Érico Veras, "aquilo que a gente tem como cenário positivo é o entendimento de que isso é um problema que precisa ser resolvido".
"O grande problema é que eu posso negociar hoje e se eu não entender qual foi o a origem da dívida, daqui a pouco vou estar no com a mesma dívida de novo", ponderou Veras.
Desenrola
O programa vai renegociar dívidas de até R$ 5 mil, incluindo de beneficiários do Bolsa Família
As dívidas terão desconto e poderão ser refinanciadas em até 60 meses
Hoje, a maior parte das dívidas negativadas do país (66,3%) é com varejistas e companhias de água, gás e telefonia. A ideia é que essas empresas participem das negociações
Os credores só poderão acessar o programa se concederem descontos na dívida
O programa vai concentrar, em uma plataforma, devedores, credores e bancos. Essa plataforma será gerida por entidades especializadas em crédito, como a Serasa e o SPC
Com o uso do CPF, o consumidor vai consultar, em um site, suas dívidas e demonstrar interesse em negociar. Com isso, as credoras poderão fazer oferta de descontos
As dívidas serão pagas a partir da oferta de financiamento feita pelos bancos, que também vão concorrer entre si sobre quem terá melhores condições
O governo, por meio de fundo garantidor, vai garantir eventual inadimplência que venha a acontecer nesses refinanciamentos. É isso que permitirá que o juro seja mais baixo
Não há data prevista para o programa entrar em vigor
Litígio Zero
Pessoas físicas, Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, que tenham processos em julgamento administrativo com valor até 60 salários-mínimos
Pessoas físicas e jurídicas de qualquer porte, que tenham processos em julgamento administrativo com valores considerados irrecuperáveis ou de difícil recuperação
Para pessoas físicas e donos de pequenos negócios será concedido um desconto de 40% a 50% sobre o valor total do débito, incluindo tributos, juros e multa
Por se tratar de um programa extraordinário, o prazo de adesão será até 31 de março de 2023. O prazo para pagamento é de até 12 meses
Como aderir ao Litígio Zero?
No site da Receita, selecione a opção "Transação Tributária", no campo Área de Concentração de Serviço
Em seguida, clique no serviço "Transação por Adesão no Programa de Redução de Litigiosidade Fiscal - PRLF"
Preencha o requerimento de adesão disponibilizado no Portal e-CAC
Anexe a prova do recolhimento da prestação inicial
Apresente a certificação expedida por um profissional contábil acerca da existência e regularidade escritural de créditos decorrentes de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da CSLL apurados e declarados à Receita
Confira dicas para se desendividar
1 - Anote todas as dívidas que possuir, separando as que correspondem a serviços e produtos de necessidade básica e as que sofrem juros mais altos, considerando essas como prioridade para pagar
2 - Anote durante 30 dias todos os gastos que tiver, separando por tipo de despesa. Isso inclui gastos "pequenos", como gorjetas e guloseimas
3 - Tenha em mente que só se deve negociar uma dívida quando se tem condições de fazer isso, ou seja, após se planejar, pois um passo precipitado pode até piorar a situação
4 - Trocar uma dívida pela outra nem sempre é a melhor alternativa. É claro que o crédito consignado, por exemplo, oferece juros mais baixos, já que o pagamento é retido diretamente do salário.
5 - Para não agravar a situação, antes de realizar qualquer compra, se faça algumas perguntas como "Eu realmente preciso desse produto?" a fim de evitar fazer dívidas por impulsividade
6 - Trace objetivos de curto prazo (a serem realizados em até um ano), médio prazo (entre um a dez anos) e longo prazo (acima de dez anos), e inclua entre eles o de sair das dívidas
7 - Com um diagnóstico financeiro em mãos, é possível conhecer a sua força de poupança. Mês após mês, é preciso aplicar esse dinheiro em um investimento que seja coerente ao seu perfil e objetivos
Fonte: Abefin
ENDIVIDAMENTO
NO CEARÁ
Número de inadimplentes: 2.984.564
Número total de dívidas: 9.726.149
Percentual de inadimplentes: 33,40%
Valor total: R$ 11,2 bilhões
Ticket médio de dívidas por inadimplente: R$ 3.757
Ticket médio por dívida: R$ 1.152
Perfil dos endividados
Por gênero
Feminino: 53,40%
Masculino: 46,60%
Por idade
Entre 26 e 40 anos: 36%
Entre 41 e 60 anos: 33,20%
Acima de 60 anos: 18%
Até 25 anos: 12,80%
NO BRASIL
Evolução (fev/22-fev/23)
Famílias endividadas
fev./22: 76,60%
mar./22: 77,50%
abr./22: 77,70%
mai./22: 77,40%
jun./22: 77,30%
jul./22: 78,00%
ago./22: 79,00%
set./22: 79,30%
out./22: 79,20%
nov./22: 78,90%
dez./22: 78,00%
jan./23: 78,00%
fev./23: 78,30%
Famílias com dívidas em atraso
fev./22: 27,00%
mar./22: 27,80%
abr./22: 28,60%
mai./22: 28,70%
jun./22: 28,50%
jul./22: 29,00%
ago./22: 29,60%
set./22: 30,00%
out./22: 30,30%
nov./22: 30,30%
dez./22: 30,00%
jan./23: 29,90%
fev./23:29,80%
Famílias sem condições de pagar dívidas
fev./22: 10,50%
mar./22: 10,80%
abr./22: 10,90%
mai./22: 10,80%
jun./22: 10,60%
jul./22: 10,70%
ago./22: 10,80%
set./22: 10,70%
out./22: 10,60%
nov./22: 10,90%
dez./22: 11,30%
jan./23: 11,60%
fev./23: 11,60%
Ranking do tipo de dívida
1º Cartão de crédito: 85,70%
2º Carnês:18,30%
3º Financiamento de carro: 8,60%
4º Crédito pessoal: 8,40%
5º Financiamento de casa: 7,30%
OUTROS DADOS
Tempo médio de pagamento de contas em atraso:62,7 dias
Tempo médio de comprometimento com dívidas: 6,9 meses
Parcela média de renda comprometida com dívida: 30,00%
Fonte: Serasa/PEIC/CNC