O Ceará deve abrir mão, apenas este ano, de R$ 2,3 bilhões de reais com as renúncias fiscais de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). A estimativa faz parte de um estudo da Associação Nacional de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite) que mostra que o valor é 58% maior do que o destinado em 2022 (R$ 1,4 bilhão).
O levantamento, feito a partir da Lei de Diretrizes Orçamentárias de cada estado, mostra que, no Brasil, todos os estados e o Distrito Federal somados terão deixado de arrecadar R$ 228 bilhões, por meio de renúncias fiscais. O valor equivale a 31% de toda a arrecadação de ICMS projetada para 2023 e representa aumento de 34,78% na comparação com 2022.
No caso do Ceará, o total de receitas correntes projetado para 2023 é de cerca de R$ 31,5 bilhões, sendo que o valor projetado para arrecadação tributária é de R$ 20,3 bilhões - contando não só ICMS, que representa cerca de R$ 18,1 bilhões, como também Imposto Sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCD) e Imposto Sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA).
O levantamento da Febrafite também lança um olhar qualitativo para esse gasto tributário e sua relação com a chamada guerra fiscal. Segundo a entidade, cerca de 60% do montante da renúncia apontada para 2022, por exemplo, refere-se a benefícios que alimentam a guerra fiscal entre os estados.
E esta disputa, segundo o diretor-executivo da Associação dos Auditores Fiscais da Receita Estadual e dos Fiscais do Tesouro Estadual do Estado do Ceará (Auditece), Juracy Soares, é a grande moeda de barganha dos estados para atrair novos investimentos.
“Há linhas favoráveis a esta prática, que afirmam que o estado não está abrindo mão de imposto porque ele não tinha esse imposto antes. Mas, quando uma fábrica abre em uma cidade e não paga o imposto devido, por conta de um incentivo fiscal, o Estado deixa, sim, de ter esses valores entrando nos cofres públicos.”
Porém, ele afirma que esta é uma questão muito mais complexa, por conta do cenário que muitos chamam de benefício fiscal, privilégio fiscal, mas que Juracy chama de guerra. “Esse é o ponto principal que as empresas analisam quando vão se instalar em um local. Tanto é que, se o estado disser que vai cortar esses benefícios fiscais, no outro mês pode apostar que, praticamente, todas as empresas vão embora, para estados que mantêm as mesmas vantagens que eles já tinham onde até então estavam instalados.”
O diretor-executivo da Auditece lembra que estes incentivos, em tese, são por um período, mas podem ser renovados ou revogados em qualquer momento. “Então, na prática, ele fica indefinido e os estados mantém porque é o incentivo que traz os investimentos que vão aumentar o Produto Interno Bruto (PIB) estadual, por conta dos empregos que gera e toda a cadeia econômica que gira em torno dessa indústria, por exemplo, instalada no interior do estado.”
Juracy pontua que a mudança desta forma de atração de investimentos precisa ser discutida na Reforma Tributária que está sendo discutida nacionalmente. Ele explica que, atualmente, o imposto é recolhido na fonte (onde o produto é fabricado) e no destino final, onde ele será consumido. Nas novas regras propostas pela reforma, o imposto seria cobrado apenas no destino final, o que tira esse poder de barganha do incentivo na implantação do investimento.
“Assim, será necessário que outros meios sejam propostos para que, principalmente os estados do Norte e Nordeste possam continuar competitivos na captação de investimentos. Todo mundo tem que sair junto, já que todos querem uma válvula de saída, querem aumentar a arrecadação.”
O POVO procurou o Governo do Ceará, por meio das secretarias da Fazenda (Sefaz-CE) e do Desenvolvimento Econômico (Sedet-CE), para se manifestar sobre o assunto, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.