O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou, com vetos, a lei que reconhece as barracas da Praia do Futuro, em Fortaleza, como Patrimônio Cultural Brasileiro. A medida foi publicada ontem, no Diário Oficial da União.
O trecho que garantia a possibilidade de intervenções serem autorizadas apenas pelo poder municipal, foi vetado.
A justificativa para o veto é que a "proposição legislativa é inconstitucional e contraria interesse público ao afastar a competência da União de gerir e fiscalizar praia marítima, que constitui bem da União, de uso comum do povo", acrescentando que traria "prejuízo do direito ao livre acesso e da preservação ambiental".
A declaração destaca os empreendimentos como espaços culturais importantes, valorizando a gastronomia local e eventos tradicionais.
Para Fátima Queiroz, presidente da Associação dos Empresários da Praia do Futuro (AEPF), a sanção é uma grande conquista e confirma o potencial turístico e cultural do local, além de reconhecer o trabalho dos barraqueiros.
"As barracas, na verdade, são um grande esteio para toda essa população que vive aqui no bairro Praia do Futuro, que é um bairro, de certa forma, abandonado pelo poder público e não tem todos os serviços necessários da comunidade. E as nossas barracas têm esse papel importante de dar uma condição social melhor às pessoas que moram por meio do emprego e da geração de renda", afirma.
Além disso, ela enfatiza o pioneirismo desse negócio, inventado há quase 70 anos. "Estruturas tão simples que foram, tão rudimentares, chegam a esse patamar para atender toda a população de Fortaleza, toda a população do Brasil e a um público internacional que só tem elogios para as nossas estruturas”, exaltou Fátima.
Já a presidente da Associação das Mulheres Empreendedoras do Ceará (AME), Cícera Silva, que representa os ambulantes e massoterapeutas da Praia do Futuro, qualificou a decisão como fundamental para quem trabalha nesses empreendimentos direta ou indiretamente.
"A partir do momento que a Praia do Futuro passa a ser um patrimônio cultural, nós vamos assegurar e garantir respeito e dignidade aos trabalhadores e as trabalhadoras que ali sobrevivem e resistem. Além de valorizar mais o mercado imobiliário", pontuou.
O governador do Ceará, Elmano de Freitas, defendeu a importância de se encontrar a permanência das barracas com a garantia do acesso livre da população às suas praias. “A dinâmica econômica que ali tem é um diferencial importante do turismo de Fortaleza”, disse.
O secretário do Turismo do Ceará, Eduardo Bismarck, admite que “há uma preocupação com relação ao uso delas e ao tamanho que adquiriram ao longo do tempo”.
Contudo, ele afirma considerar “importante que haja um reconhecimento daquilo que está lá atualmente, para que permaneça como se encontra”.
O texto da declaração também ressalta ainda o impacto econômico com geração de mais de 20 mil empregos diretos e indiretos, além de um faturamento anual de R$ 300 milhões.
A aprovação ocorre em meio a uma disputa judicial que se arrasta desde 2005 sobre a demolição das barracas da Praia do Futuro, que ocupam a faixa de areia considerada área pública da União.
PANORAMA DAS BARRACAS
- Existem 153 empreendimentos na faixa de areia sem licenciamento ambiental e quase todos cerceando o livre acesso da população à praia e ao mar.
- Do total, 110 possuem cadastro na SPU, possuindo Registro Imobiliário Patrimonial (RIP). Destes, 98 excedem as dimensões previstas pelo RIP e nunca recolheram qualquer valor aos cofres públicos pela área excedente (até 14 mil m²).
- Existem também 43 empreendimentos sem registro RIP na SPU e que não recolhem qualquer valor aos cofres públicos (instalados há muitos anos).
HISTÓRICO DE CONFLITO
- Decisão da Justiça Federal de 2017, a partir de ação impetrada em 2005, autorizou a demolição das 43 barracas sem RIP e não autorizadas pela SPU. Também foi determinada a redução das demais barracas às dimensões dos RIPs, à data do Agravo de Instrumento (2006) e a remoção dos obstáculos que impedissem o acesso à praia e ao mar.
- O prazo dado pela Justiça para cumprimento da decisão era até o dia 4 de abril de 2019. Mas as determinações não foram cumpridas, mas chegou-se a um acordo com a criação do Fórum Permanente da Praia do Futuro pelo MPF, em 2017, para reunir entidades que são impactadas direta e indiretamente sobre a questão.
- Em abril de 2019, o Fórum apresentou uma proposta de Termo de Referência para a requalificação prevendo um concurso nacional e outras medidas, que são encaradas pela União como contraposições à decisão da Justiça, como a manutenção das 43 barracas sem RIP, a permanência na faixa de areia dos empreendimentos existentes sem redução de tamanho conforme a documentação, com a remoção dos obstáculos sob as expensas da União e não dos barraqueiros.
- Outros pontos que não foram aceitos pela União é a anistia de valores devidos, além do pedido de concessão de novos RIPs entre 500 m² e 1.500 m², além de conceder RIP para as barracas que não possuem documentação.
- A SPU lembrou, na ocasião, que a legislação sobre ocupação da zona costeira diz que as praias marítimas são bens da União. E que ao aceitar a proposta do Fórum estaria com o ônus ao abrir precedente prejudicial de manutenção de ocupações em praias, além da renúncia a receitas federais.
- Já em novembro de 2024, a SPU propôs, dentre outros pontos, a permanência de até 60 barracas por um prazo de 20 anos, com licitação a cada período, conforme previsto no plano de 2017 do Ipplan Fortaleza. Haveria o alargamento do calçadão para 44 metros (14 metros do calçadão existente 30 metros para edificações) do limite do meio-fio da pista de rolamento da avenida.
- No dia 8 de janeiro de 2025, presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou a lei que reconhece as barracas da Praia do Futuro, em Fortaleza, como Patrimônio Cultural Brasileiro, mas vetou trecho que garantia a manutenção da atual estrutura das barracas, com intervenções sendo autorizadas apenas pelo poder municipal.