O Núcleo ESG da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec) estrutura, desde 2022, um programa próprio de certificação em práticas ambientais, sociais e de governança (ESG) voltado para o setor produtivo local que faz do Estado pioneiro no assunto.
A proposta, segundo a Fiec, é traduzir padrões internacionais de sustentabilidade para o contexto da indústria cearense.
"O Ceará foi o primeiro estado a criar um núcleo de ESG dentro de uma federação. Desenvolvemos o primeiro programa de certificação antes mesmo da ABNT lançar normas específicas. A parceria com a Bureau Veritas, organismo com mais de 200 anos de atuação e presença nas principais normas ISO, trouxe credibilidade internacional", destaca Alcileia Farias, coordenadora do núcleo.
Segundo ela, o modelo já despertou o interesse de outras federações estaduais e foi apresentado em mentorias realizadas em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Alagoas. “Há outras federações no radar para 2026”, afirmou.
O programa é validado pela Bureau Veritas, organismo internacional de certificação, que atua como parceiro técnico na verificação dos processos. A metodologia, de acordo com a Fiec, foi construída a partir de normas e taxonomias reconhecidas — como a Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB) e referenciais da ONU — e adaptada às especificidades da indústria regional.
“O verbo não é ‘sou sustentável’; é ‘estou sustentável’. É um processo contínuo, que mede o grau de maturidade de cada empresa”, resume Alcileia Farias.
O programa é estruturado em 74 indicadores, distribuídos entre os eixos ambiental, social e de governança. Cada empresa é avaliada a partir de critérios de relevância, maturidade e equidade, que levam em conta o porte, o segmento e a capacidade de execução das práticas propostas.
A ideia, segundo a federação, é evitar que pequenas e médias empresas sejam penalizadas por não terem a mesma estrutura de grandes grupos.
Atualmente, conforme dados fornecidos pelo núcleo, cerca de 70 indústrias participam do processo de avaliação, e aproximadamente 30 já obtiveram a certificação. A Fiec não divulgou a lista completa das empresas, mas cita como exemplos a BCP Engenharia, a BCP Energia e a Cerbras, que teriam passado por diferentes estágios de avaliação e recertificação.
A coordenadora destaca que, em alguns casos, o diagnóstico inicial gerou ajustes de gestão que resultaram em benefícios imediatos, como redução de custos com energia e otimização de processos internos.
“Quando a empresa começa a medir o que faz, entende melhor onde pode economizar. Sustentabilidade é eficiência também”, diz.
Além do impacto interno, a FIEC aponta que a certificação pode abrir portas para novas oportunidades de negócios, especialmente em cadeias produtivas que exigem comprovação de responsabilidade socioambiental. A federação afirma que as empresas certificadas têm buscado ampliar acesso a linhas de crédito específicas e melhorar o posicionamento de marca em mercados mais exigentes.
Na avaliação de Alciléia Farias, a credibilidade da informação é um dos fatores que mais pesam no processo. “A diferença é que não estamos falando de marketing, e sim de métricas verificadas. A validação de um organismo internacional traz segurança a investidores e parceiros”, afirma.
Outro dado destacado pela FIEC é a participação de mulheres nos processos de certificação. Segundo a coordenadora, cerca de 80% das avaliações e consultorias foram conduzidas por profissionais do sexo feminino. A federação atribui esse protagonismo à presença crescente de mulheres em cargos técnicos e de gestão em áreas como engenharia, auditoria e governança corporativa.
A parceria com a Bureau Veritas é apresentada pela federação como um dos pilares do programa. Segundo a Alcileia, o organismo internacional atua na validação da metodologia e na auditoria dos processos de certificação, conferindo credibilidade às etapas.
Entre os desafios mencionados pela mentora estão a diferença de maturidade entre setores, a falta de padronização nacional de critérios e o baixo nível de digitalização de algumas empresas. Apesar disso, ela afirma que o interesse vem crescendo, sobretudo entre indústrias que buscam melhorar o relacionamento com clientes e investidores.
Ela informou que pretende publicar, ainda neste ano, um relatório consolidado com os resultados das certificações e o impacto médio das práticas implementadas. Também está prevista a ampliação do programa para empresas da cadeia de fornecedores das indústrias participantes, o que, segundo o núcleo, “pode gerar um efeito multiplicador de sustentabilidade na economia cearense”.
O núcleo estuda, ainda, uma nova rodada de mentorias com outras federações regionais, reforçando o posicionamento do Ceará como referência nacional em ESG.
“O objetivo é compartilhar o método e fortalecer a cultura da sustentabilidade na indústria brasileira. O aprendizado é coletivo”, enfatiza a mentora.
Programas de certificação em ESG vêm ganhando espaço no País nos últimos anos, impulsionados por exigências de mercado e pela pressão de consumidores. A Taxonomia Sustentável Brasileira, em desenvolvimento pelo governo federal e pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), deve servir como base para uniformizar critérios e facilitar comparações entre setores.
Enquanto o padrão nacional não é finalizado, iniciativas regionais como a da FIEC tentam preencher o vácuo normativo e criar referências locais adaptadas às realidades econômicas de cada estado. Para analistas, a consolidação desse tipo de programa pode contribuir para a difusão de práticas sustentáveis e para a integração das empresas brasileiras a cadeias globais de produção.