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Queda da tarifa recíproca agrava situação dos exportadores de coco, alerta setor
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Economia

Queda da tarifa recíproca agrava situação dos exportadores de coco, alerta setor

Na prática, a revogação dos 10% desfavorece os exportadores de coco brasileiros, especialmente ao zerar as taxas para concorrentes como a Ásia, mantendo uma sobretaxa de 40% sobre os produtos do Brasil
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PRODUTORES rurais de coco, no Ceará, sofrem perdas e vendem a preços baixos apenas para subsistência (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS PRODUTORES rurais de coco, no Ceará, sofrem perdas e vendem a preços baixos apenas para subsistência

Rita Grangeiro, fundadora da Associação Nacional dos Produtores de Coco (Aprococo), diz que a redução tarifária de 10%, anunciada na sexta-feira, 14, pelo presidente dos EUA, Donald Trump, atrapalhou ainda mais os exportadores de coco, especialmente no Ceará.

“Todos pagavam 10, todos os países. Se você retira os 10 de todo mundo e deixa os nossos 40, nós estamos agora competindo 40 com zero. É pior, muito pior para nós”, explica.

Segundo ela, com a medida, o coco brasileiro saiu no prejuízo com relação ao principal concorrente, a Ásia, que teve a tarifa zerada, criando uma desvantagem de 40% para os produtores locais. Ou seja, a retirada desses 10% para todos os países zerou o custo tarifário dos concorrentes;

Essa mudança, aponta Rita Grangeiro, somada a uma supersafra e à falta de escoamento devido a problemas climáticos e logísticos, está causando um prejuízo significativo e o secamento do coco no pé, comprometendo safras futuras.

“Os cocos estão secando no pé. Esse é o grande problema. Quando você deixa um coqueiro que é verde, com o coco secando, ele vai atrasar as futuras safras. As safras futuras já estão comprometidas. O produtor não tem dinheiro para cuidar dos coqueiros”, alerta.

A produtora se queixa da ausência da ajuda governamental prometida, incluindo crédito e subvenções, e a falta de implementação de programas de compra, como para merenda escolar, agravando o que ele chama de “caos na cultura do coco”.

“A subvenção que viria para o coco até agora não chegou na indústria exportadora, que é quem compra do produtor”, diz Rita Grangeiro. Nem mesmo o programa de compras prometido para a merenda escolar ainda não aconteceu, segundo ela.

“As indústrias estão exportando com prejuízo para manter o mercado, enquanto os produtores rurais sofrem perdas e vendem a preços baixos apenas para subsistência”, pontua.

Economista avalia que a redução tem efeito limitado

Para João Mário de França, professor do curso de pós-graduação em Economia, da Universidade Federal do Ceará (UFC), e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ibre), a revogação da taxa recíproca de 10% tem efeito limitado na economia, especialmente a cearense. Mesmo assim, ele diz estar confiante nas negociações entre Brasil e EUA e numa redução mais significativa na tarifa imposta aos produtos brasileiros.

“O impacto foi mínimo porque a medida americana revogou apenas a chamada taxa recíproca de 10%. A tarifa mais significativa e elevada, de 40%, o chamado “tarifaço”, que foi atribuída a questões políticas e críticas ao sistema judiciário brasileiro, ainda permanece”, afirma.

No Ceará, os setores que foram "em tese beneficiados" por essa redução recíproca de 10% incluem frutas, castanha de caju e ceras vegetais. Nacionalmente, a medida beneficia diretamente 80 itens que o Brasil vende aos EUA, mas a sobretaxa de 40% continua a afetar a maior parte dos produtos brasileiros.

O economista sugere que a negociação futura para a redução da tarifa de 40% será impulsionada por pressões econômicas internas nos EUA e pode envolver concessões brasileiras em áreas como regulação de big techs e patentes.

De acordo com ele, as negociações tarifárias entre EUA e Brasil são influenciadas por uma complexa interação de fatores geopolíticos (alinhamento político, ideologia) e pressões internas nos EUA (questões econômicas e inflacionárias).

João Mário lembra que, inicialmente, a imposição da elevada tarifa de 40% no comércio Brasil-EUA foi atribuída a questões políticas e a críticas ao sistema judiciário brasileiro. Por isso, segundo ele, o componente geopolítico é fundamental para entender a nova dinâmica tarifária no comércio internacional.

As tarifas não são mais impostas apenas por razões econômicas pelo governo americano, mas também por questões de alinhamento político. Países que compartilham a mesma ideologia do governo americano tendem a ser favorecidos. Como é o caso da Argentina, que acabou sendo fortemente beneficiada com a queda da tarifa recíproca, passando a ter praticamente taxa zero.

Países que estão menos alinhados com o pensamento dominante no governo americano enfrentam mais dificuldades na relação comercial, como é o caso do Brasil. Segundo João Mário, a tarifa de 40% é desproporcional e injusta, carecendo de justificativa econômica, possuindo apenas uma justificativa ideológica ou política.

O economista destaca que, embora o componente ideológico seja importante, as pressões internas nos EUA são vistas como o principal motor para uma potencial redução da tarifa de 40%. Ele pontua que o presidente Trump tem recebido pressões do próprio mercado americano. Os produtos brasileiros estão chegando mais caros aos EUA.

De acordo com ele, há reclamações por parte dos importadores e dos consumidores, que sentem o aumento do preço, afetando seu poder aquisitivo. “A questão da inflação pressiona o governo americano a reduzir as tarifas, principalmente no que diz respeito à carne e ao café, que têm afetado o bolso do americano”, pontua João Mário.

Outro ponto favorável ao Brasil nas negociações, é o fato de que o governo americano está sofrendo questionamentos do próprio sistema judiciário americano e do Senado com relação às tarifas. “pressões internas sugerem que as negociações tenderão a caminhar em direção a aspectos econômicos, o que pode destravar o processo político de recuo da tarifa”, diz o economista.

João Mário explica que para que o impacto das tarifas seja significativamente reduzido, e, dado o interesse de ambos os lados em aspectos econômicos, espera-se que haja exigências e concessões.

“O governo americano pode fazer exigências ao governo brasileiro - não exigências políticas ou ligadas ao sistema judiciário, pois isso não faria sentido, focando em questões objetivas e econômicas”, afirma o economista. Na avaliação dele, as negociações podem convergir para demandas americanas relacionadas à regulação das big techs, a questão dos minerais preciosos, como as terras raras, e litígios relacionados a patentes.

“Assim como há demandas americanas, existem demandas do governo brasileiro. A negociação deve caminhar no sentido de ambos os lados cederem em alguns pontos para que o Brasil obtenha alguma redução tarifária”, destaca.

Isenta apenas 3 tipos de suco de laranja e a castanha-do-pará

No sábado, dia seguinte ao anúncio da revogação da tarifa de 10%, o vice-presidente Geraldo Alckmin detalhou o impacto para o Brasil da redução em alguns produtos.

Segundo Alckmin, apenas quatro produtos passam a ter isenção completa de tarifas para os EUA: três tipos de suco de laranja e a castanha-do-pará. Os outros 76 continuam sujeitos à tarifa de 40%, entre os quais cafés não torrados, cortes de carne bovina, frutas e hortaliças.

Com a medida, o percentual das exportações brasileiras isentas de qualquer tarifa extra adotada na gestão Trump passou de 23% para 26%, disse Alckmin, o que representa, no total, cerca de US$ 10 bilhões em vendas aos EUA.

O principal item beneficiado foi o suco de laranja, cujas exportações para os americanos somam cerca de US$ 1,2 bilhão ao ano. Vão para os EUA cerca de 40% de todo suco brasileiro enviado ao exterior, cuja produção se concentra no estado de São Paulo. O produto já estava isento da tarifa de 40% sobre o Brasil - ao lado de itens como petróleo e aviões. Agora, o suco ficou livre também da taxa de 10%.

Já o café, por exemplo, continuará taxado em 40%. "Nós vamos continuar trabalhando para reduzir mais. Realmente, no caso do café, não tem sentido, a tarifa ainda é alta, e o Brasil é o maior fornecedor de café para os Estados Unidos", destacou Alckmin, ao conceder coletiva a jornalistas no Palácio do Planalto (Com agências).

Mais notícias de Economia

Sefaz informa que liberou R$ 6,65 milhões entre crédito e subvenção econômica

A Secretaria da Fazenda do Ceará (Sefaz-CE) informa, por meio de nota enviada ao O POVO que segue recebendo e analisando os pedidos de ajuda das empresas afetadas pelo aumento das tarifas aplicadas sobre as exportações brasileiras com destino aos EUA.

Segundo a pasta, até o momento, cerca de R$ 6,65 milhões foram liberados após análises econômicas, entre aquisição de crédito e subvenção econômica. O valor corresponde a 33,25% dos R$ 20 milhões reservados para o socorro às empresas cearenses, por meio de decreto assinado pelo governador do Ceará, Elmano de Freitas (PT), no início de setembro.

A Sefaz diz que as medidas adotadas pelo Governo do Ceará têm contribuído para o equilíbrio do setor exportador cearense, ajudando na manutenção dos empregos e da renda no Estado.

"Mesmo com o tarifaço, o Ceará demonstrou um crescimento notável nas exportações para os Estados Unidos, com uma alta de 318% em outubro deste ano em comparação a outubro de 2024. Em agosto e setembro, o estado cearense já tinha apresentado incremento de 152% nas exportações para o território estadunidense em relação ao mesmo período do ano passado, demonstrando a força da economia cearense e a efetividade das iniciativas", informou em nota.

Esses números, no entanto, não levam em consideração que o relatório "Ceará em Comex" da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec) até setembro de 2024 mostram que as exportações de ferro e aço do Estado sofreram impacto devido a atrasos nas averbações dos registros de exportação.

Mesmo assim, a Sefaz faz uma análise positiva das exportações cearenses pós-tarifaço. A pasta informa que o período ainda serviu de oportunidade para a abertura e o fortalecimento de mercados ao redor do globo. "Entre agosto e outubro, as exportações cearenses com destino a Suécia, Gana, Polônia, México, Líbano, Índia, entre outros, cresceram significativamente."

"Além disso, as negociações do Governo Federal com o governo dos EUA já resultaram na redução da tarifa para cerca de 200 produtos", diz a nota.

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