Guilherme de Jesus da Silva escreveu as páginas mais vitoriosas da história do Fortaleza. Dos 107 anos do clube, esteve presente em nove e foi da Série C à final da Sul-Americana, com quase 400 jogos disputados, dez taças levantadas, campanhas históricas e identificação com o Leão. Tinga virou um torcedor em campo e entrou para a galeria dos maiores ídolos do Tricolor.
Cria do Grêmio, o pacato gaúcho de Porto Alegre (RS) chegou ao Pici em 2015, após passagem pelo modesto Boa Esporte-MG. Aos 21 anos, era uma aposta de um Fortaleza que se reconstruía para mais um ano de Terceirona e que tinha o desafio de evitar o pentacampeonato estadual do rival Ceará. E o camisa 2 foi peça fundamental para o título ser tricolor, já que deu a assistência para o famoso gol de Cassiano.
O defensor foi para o Bahia e também defendeu o Juventude, mas o destino o trouxe de volta para o Leão, em 2018. E, a partir dali, Tinga e Fortaleza deram início a uma trajetória vencedora, com gols marcantes, liderança interna e espírito vibrante do capitão.
"Sempre falei que eu não sou nada sem o Fortaleza. O Fortaleza me deu tudo: oportunidade de jogar, uma vida, uma família. Aqui é uma família, eu me sinto em casa", contou o ídolo tricolor, em entrevista às Páginas Azuis do O POVO, em abril de 2023.
O lateral-direito conquistou mais cinco títulos do Campeonato Cearense, sendo pentacampeão de fato (2019 a 2023); três da Copa do Nordeste (2019, 2022 e 2024) e um da Série B (2018). Esteve presente nas duas campanhas de G-4 no Brasileirão, nas disputas da Libertadores e no vice-campeonato da Copa Sul-Americana de 2023. Virou até mosaico nas arquibancadas.
Dono de fala mansa, Tinga tinha estilo vibrante nos vestiários, com discursos inflamados, e em campo, aguerrido a cada disputa de bola. Criou rápida identificação com o clube, o que fazia os torcedores verem o dono da camisa 2 e da braçadeira de capitão como um representante deles em campo. O defensor não se furtava a falar nos momentos difíceis e exibia sinceridade rara nas entrevistas, por vezes em tom de desabafo após derrotas.
Como jogador do Fortaleza, ainda na primeira passagem, o lateral-direito disputou os Jogos Pan-Americanos de 2015, no Canadá, e ganhou a medalha de bronze. No decorrer da segunda passagem, recebeu proposta do Cruzeiro — à época chefiado por Ronaldo Fenômeno —, mas recusou e renovou contrato com o Tricolor.
Passados 389 jogos, 26 gols e 35 assistências, Tinga encerrou a trajetória pelo Pici. O contrato que iria até abril de 2026 foi rescindido de forma antecipada, e o defensor de 32 anos vai atuar pelo Coritiba na próxima temporada. O clube preparou uma homenagem na despedida do capitão, que fez apenas 24 jogos em uma temporada marcada por resultados negativos e finalizada com o rebaixamento para a Série B.
O camisa 2 também não exibiu o mesmo desempenho de outros anos, em que foi peça importante sob o comando de Rogério Ceni e Juan Pablo Vojvoda — atuando até como zagueiro. Mas o desgaste natural de uma relação longeva não abala a grandeza de Guilherme de Jesus da Silva na história do Fortaleza, muito menos a idolatria, apesar de ele não se considerar entre os principais nomes da história do clube.
"Eu sempre falo que eu só vou ser ídolo depois que eu parar e ver o que conquistei, o que atingi, que as coisas aconteceram. Depois eu vou ver. Agora eu sou mais um, tenho que batalhar todo dia", disse Tinga, há dois anos, às Páginas Azuis. Ele batalhou e virou ídolo.