O sonho de viajar para fora do País acompanha a estudante Vitória Lima Albuquerque desde a infância. Aos 17 anos, ela está a um passo de realizá-lo. A adolescente, natural de Itapipoca, está entre os 50 brasileiros selecionados para o programa Jovens Embaixadores 2022, iniciativa da Embaixada dos Estados Unidos que leva estudantes do ensino médio da rede pública de ensino no Brasil para um intercâmbio nos EUA.
Vitória conseguiu a vaga por meio do projeto Correspondestes O POVO, do qual participa desde 2019. A ação, realizada pelo Grupo de Comunicação O POVO, reúne jovens de todas as regiões de Fortaleza em atividades educacionais com foco na inclusão social por meio da comunicação. A estudante conta como as atividades desenvolvidas no projeto despertaram nela o interesse pela Educação. Por acreditar nisso e na sua própria capacidade, Vitória embarca para a viagem internacional no próximo dia 1º de julho, junto com os outros 49 jovens embaixadores brasileiros.
O roteiro da viagem, que se estende até o dia 18 do mesmo mês, inclui passeio especial pela capital Washington, DC, visitas a cidades históricas e participação nos eventos em alusão à Independência norte-americana, celebrada no dia 4 de julho. Agora, Vitória aproveita o tempo que ainda resta antes do embarque para aprimorar o inglês e resolver pendencias burocráticas. Aluna do 3º ano do ensino médio, ela também revela como pretende transpor fronteiras pessoais para as realizações que pretende alcançar.
O POVO - Como surgiu o interesse em participar do programa Jovens Embaixadores?
Vitória Albuquerque - Mesmo sem conhecer o programa Jovens Embaixadores, eu sempre sonhei em viajar e estudar fora. Então, esse desejo sempre me impulsionou a pesquisar e ir atrás de oportunidades que me proporcionassem isso. Eu compreendi plenamente o que era o programa Jovens Embaixadores quando meu monitor escolar anunciou a abertura das inscrições para participar do programa, em março. Me inscrevi e quanto mais eu pesquisava, mais vontade eu tinha de participar e mais me emprenhava em passar as etapas do processo seletivo.
O POVO - E o processo seletivo, como foi?
Vitória Albuquerque - Foi bastante demorado. Foram quatro etapas no total: 1º) Preenchi um questionário no site do programa para ver se eu correspondia aos requisitos da embaixada; 2º) Precisei enviar um monte de papelada comprovando o que eu falei no primeiro questionário (essa com certeza foi a etapa mais chata), o que incluía a comprovação de ser baixa-renda, um questionário assinado pelo coordenador do projeto Correspondentes O POVO e autenticado no cartório, histórico escolar, entre outras coisas; 3º) Fui selecionada para fazer a prova escrita dissertativa de inglês, que consistia em fazer mini redações em inglês. Nessa prova, eu estava bastante insegura. Nunca fiz curso de inglês. e todo o conhecimento que eu tinha vinha do aplicativo Duolingo, da Internet e das entrevistas as quais eu assistia da Rihanna no YouTube [risos] . Mas, graças a Deus, deu tudo certo, e eu tive a certeza que o esforço e o estudo individual é muito mais valioso do que a condição de pagar um cursinho ou coisa assim; 4º) Por fim, fui selecionada para uma prova oral de inglês com os coordenadores do programa. Nessa etapa, foi bastante tranquilo. Os representantes da embaixada responsáveis pelo programa foram muito compreensíveis e tornaram a entrevista em inglês uma conversa muito agradável.
O POVO - Desde quando você é correspondente O POVO e quais atividades tem desempenhado no projeto?
Vitória Albuquerque - Desde 2019, e já participei em programas de rádio na O POVO CBN, falando sobre a problemática da dependência química na juventude, tema esse que me prendeu de forma muito particular, porque é uma problemática presente na minha família. Fazer parte desse projeto me ajudou a olhar essa situação de uma forma mais humanitária. Participei ainda da criação de matérias, como na Virada Sustentável, tive a oportunidade de entrevistar ativistas e de ter textos divulgados no jornal.
O POVO - Como você acha que as atividades desenvolvidas no projeto podem te ajudar durante o intercâmbio?
Vitória Albuquerque - Vão ajudar em muitas áreas, principalmente na comunicação. Foi por causa do O POVO que aprendi a me comunicar sem vergonha com as pessoas ao meu redor e a ter mais confiança na exposição das minhas ideias. Então, isso será refletido durante a minha participação no programa, com certeza. Além do que, me deu uma bagagem de conhecimento muito rica sobre o Ceará e suas nuances, bagagem essa que eu acredito que vai me ajudar bastante nos momentos em que eu precisar representar meu Estado.
O POVO - O que você mais espera dessa viagem e como irá se preparar para ela?
Vitória Albuquerque - Eu espero muitas coisas boas, como aprimorar meu inglês, por exemplo. Além de conhecer pessoas interessantes e aprender com elas. Quero absorver tudo que esse programa tiver para oferecer. Estou me preparando da mesma forma que sempre me preparei: fazendo minhas atividades no Duolingo e testando a minha pronúncia com as músicas internacionais. Quanto aos projetos que terei de apresentar lá, estou apenas guardando ideias para discutir com meus colegas de intercâmbio. No momento, estou me preocupando mais com toda a papelada necessária para o embarque e em juntar uma graninha para a viagem.
O POVO - Como sua família recebeu a notícia de sua aprovação no processo seletivo? Eles estão tão ansiosos para a viagem quanto você?
Vitória Albuquerque - Nossa! Foi um momento mágico quando o resultado saiu. Todos em casa vibraram muito e estão me dando bastante apoio e suporte para resolver as burocracias relacionadas à viagem. Vivo com meus padrinhos aqui em Fortaleza, e só devo a eles muita gratidão. Pois desde o início do processo seletivo, sempre me incentivaram e me deram a confiança de que eu era capaz. São pessoas de luz, que Deus colocou no meu caminho para que este ficasse mais fácil. Quando saiu o resultado, eu estava na presença deles e nós já estávamos esperando isso há dois dias. Foi um momento de êxtase, eu aprendo muito com meus padrinhos e eles me fazem entender de forma quase filosófica qual o papel de uma família. Principalmente porque eles meio que me adotaram aqui na Capital. Minha mãe e toda minha família materna é de Itapipoca e, até onde eu sei, todos vibraram muito por lá também. Saí até em um jornal online do município [risos].
O POVO - Conseguir uma das 50 vagas no grupo de Jovens Embaixadores não deve ter sido uma tarefa nada fácil. O que você acha que foi o seu diferencial nesse processo?
Vitória Albuquerque - Eu sinceramente não sei. No Brasil tem muitos jovens incríveis, que com certeza também seriam capazes de fazer valer essa oportunidade. Fui bastante aberta no processo seletivo, falei sobre minha família, motivações, sonhos, condições, limitações…Tudo com muita transparência. Acho que eles gostaram, e fico imensamente feliz com isso. Talvez a transparência tenha sido um ingrediente fundamental nesse processo, pois demonstrei o quanto estava disposta a aprender e a aprimorar aquilo que não estava 100%.
O POVO - Esse é o seu último ano no ensino médio e você está prestes a viver uma experiência inédita e que pode ser transformadora. Você já faz planos para o futuro?
Vitória Albuquerque - Sim, faço muitos. Como a maioria dos jovens da minha época, sou bastante ansiosa e o “futuro” está sempre alugando um triplex na minha cabeça [risos]… Espero que essa seja apenas a primeira viagem entre muitas outras e que me abra portas as quais eu não sou nem capaz de vislumbrar neste momento. No mais, estou tentando fazer a minha parte e me qualificando a medida que o tempo passa. Cogito cursar Direito aqui no Brasil, e preferencialmente numa faculdade pública, então meus esforços equivalem a esse objetivo. Acredito que só podemos mudar as leis e as regras da sociedade a partir do momento que nós as conheçamos, e essa crença tem regido as minhas metas neste momento. Sei que quero atuar numa área que envolva o social, mas ainda não bati o martelo em nenhuma profissão, estou analisando com cuidado todas as minhas possibilidades e gosto de mantê-las em sigilo, até que deem certo. Por enquanto, só posso dizer que são planos bastante ambiciosos [risos].
O POVO - Você estuda em um colégio militar, onde as regras são muito diferentes em relação a uma escola regular. Como esse modelo de ensino contribui para a sua formação estudantil e cidadã?
Vitória Albuquerque - Bom, a disciplina com certeza é o diferencial do colégio, e ele contribui para a minha formação exatamente nesta área. Nem sempre fui uma pessoa disciplinada e, para falar a verdade, estou tentando ganhar esse adjetivo a cada dia que passa. Eu entrei no colégio este ano e já aprendi muitas coisas, principalmente relacionadas ao meu comportamento e a forma como eu gostaria de “credibilizar” minha imagem. Questões como apresentação pessoal e postura nunca foram meu forte, e eu nunca tinha me dado conta sobre o quanto essas questões são importantes para a convivência e ascensão social, então o colégio tem me ajudado bastante nesta área. Além da disciplina que se precisa ter nos estudos e nas obrigações diárias. “Formar bons cidadãos” é um lema que está presente no slogan e no hino do colégio e posso garantir, como uma estudante do Colégio da Polícia Militar do Ceará, que a escola é coerente com esse lema e faz jus a boa fama que tem.
O POVO - Você se considera uma estudante acima da média?
Vitória Albuquerque - Não, de forma alguma. Eu estou totalmente na média, não sou nem uma gênia e tenho muito medo de passar essa mensagem para outras pessoas. Tudo que consegui foi na base de muito esforço, muito estudo e muita preparação. Não nasci numa família rica e entendi muito nova que quando minha mãe me mandava estudar, ela não estava apenas me fazendo um pedido… Ela estava me fazendo um apelo. O estudo é a única forma de ascensão possível para nós, seres comuns, que não nascemos com nenhum grande talento ou herança predestinada. Gosto de ser um exemplo positivo de como a educação é capaz de mudar vidas, pois tudo que conquistei até aqui foi graças ao estudo e as oportunidades que somente a educação pode oferecer, então eu boto muita fé nessa causa e é nela que deposito todo o meu ativismo. Quero mostrar para as pessoas que o estudo vale a pena e que ninguém nasce sabendo de tudo, sempre há um processo. Já tirei notas baixas, já chorei por achar que não era capaz de entender um conteúdo de matemática e já fui rejeitada em muitos processos seletivos… e isso também faz parte da minha história. O importante é não desistir e não se autossabotar, pois nem um esforço será inútil e as oportunidades sempre aparecem para aqueles que as buscam.
O POVO - Com 17 anos de idade, o que de mais importante você aprendeu até agora na vida?
Vitória Albuquerque - A ser resiliente. Apesar da pouca idade, já recebi muitos “nãos”, e esses “nãos” me ensinaram muito, principalmente sobre a importância de saber recalcular a rota e encontrar o caminho do “sim”. Além disso, tenho a sorte de ter uma mãe que me ensinou desde cedo a não desistir dos meus sonhos e a nunca deixar ninguém “segurar os meus pulsos”, acho que absorvi isso dela pelos poros, pois ela nunca falou claramente sobre isso comigo, mas sempre me ensinou pelo exemplo. Minha mãe é uma mulher do Interior, que engravidou de mim na adolescência, é mãe solo e só conseguiu terminar o ensino médio depois dos 20 anos, por meio do supletivo, superando muitas dificuldades. Hoje, ela é formada em Fisioterapia e conseguiu passar num concurso de residência, se tornando a primeira da família a conseguir um diploma de graduação. Para falar sobre o que eu aprendi de mais importante até aqui, eu realmente preciso falar da minha mãe, pois muito do meu aprendizado vem dela e do que ela me passa. O meu foco e os meus esforços são impulsionados pelo meu amor a ela e pelo sonho de proporcionar uma vida melhor para nós duas. Apesar disso tudo, tenho consciência que só tenho 17 anos e muito chão pela frente… Então, espero deixar essa resposta mais rica daqui a alguns anos [risos].