Cannes não é tão popular quanto o Oscar, creio que concordam. Mas, após as alegrias que o segundo nos trouxe em 2025, alguma expectativa caiu sobre o primeiro. E mais uma vez fizemos bonito: "O Agente secreto", de Kleber Mendonça Filho, levou os prêmios de Melhor Interpretação Masculina (Wagner Moura) e Melhor Diretor (Kleber) no 78º Festival de Cinema de Cannes. Coincidentemente ou não, tanto o premiado no Oscar ("Ainda estou aqui") quanto o de Cannes falam da história do Brasil, da ditadura militar, fatos que são mais fortes que qualquer ignorância.
Acima de tudo, essa coincidência mostra que não existe arte apolítica, inocente ou sem propósito. Por mais alienada que possa parecer uma obra, sempre existe uma indústria maliciosa pensando por trás. E quando essa indústria se volta para o que importa temos motivos para comemorar em dobro. No caso de Kleber, essa mesma indústria ainda acompanhou com atenção outras histórias que soam indigestas para quem não é escolado na real distopia diária brasileira. Desde o heroísmo delicado de Clara, em "Aquarius", até a revolta popular simbólica de "Bacurau", ele parece sempre preocupado em revelar o Brasil para os brasileiros. Até mesmo aquilo que precisamos entender, mas nos esforçamos diariamente para jogar embaixo do tapete. Os três filmes de Kleber citados aqui, e outros não citados, foram bem recebidos pela crítica e pelo público. São histórias reais, até as ficções. E falam muito sobre nossas vidas.