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Claudia Sheinbaum, a física que deixou a Ciência para governar o México
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Claudia Sheinbaum, a física que deixou a Ciência para governar o México

Sucessora de López Obrador será a primeira mulher eleita presidente do México. Claudia Sheinbaum carrega trajetória política ligada às lutas de esquerda e científica na defesa do Meio Ambiente. A partir de outubro, terá a missão de liderar um país marcado pela violência de gênero
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A candidata presidencial do México pelo partido Morena, Claudia Sheinbaum, parte em um carro para a Praça Zocalo após os resultados das eleições gerais na Cidade do México, em 3 de junho de 2024 (Foto: CARL DE SOUZA / AFP)
Foto: CARL DE SOUZA / AFP A candidata presidencial do México pelo partido Morena, Claudia Sheinbaum, parte em um carro para a Praça Zocalo após os resultados das eleições gerais na Cidade do México, em 3 de junho de 2024

 

Sóbria e impassível, Claudia Sheinbaum é uma cientista de renome e de esquerda que se dedicou à política e conseguiu se tornar a primeira presidente de um México, país atormentado pela violência criminal do narcotráfico e de gênero.

Sheinbaum, ex-prefeita da Cidade do México, 61 anos, venceu a eleição presidencial por ampla margem: 32 pontos percentuais a mais que a principal rival, a senadora de centro-direita Xóchitl Gálvez, segundo a contagem rápida oficial dos votos. "Não vou decepcioná-los", prometeu, emocionada, aos seguidores que celebraram a vitória em um hotel da Cidade do México na última segunda-feira, 3.

Como uma ativista estudantil na década de 1980, física ou política, Sheinbaum sempre projetou seriedade e foco. Com um rosto imperturbável, ela raramente sorria. Para vê-la sorrindo ou se divertindo, é necessário recorrer às fotos ou aos filmes antigos da família.

Como presidente eleita do México pelo partido Morena, Claudia Sheinbaum, comemora os resultados das eleições gerais na Praça Zocalo, na Cidade do México, em 3 de junho de 2024(Foto: CARL DE SOUZA / AFP)
Foto: CARL DE SOUZA / AFP Como presidente eleita do México pelo partido Morena, Claudia Sheinbaum, comemora os resultados das eleições gerais na Praça Zocalo, na Cidade do México, em 3 de junho de 2024

A campanha presidencial, no entanto, revelou uma mulher carinhosa e sorridente que distribuiu beijos e abraços entre milhares de apoiadores, e defendeu apaixonadamente o projeto do atual presidente, Andrés Manuel López Obrador.

"Não chego sozinha. Chegamos todas, com nossas heroínas que nos deram a pátria, com nossas antepassadas, nossas mães, nossas filhas e nossas netas", afirmou Sheinbaum às mulheres em seu discurso da vitória, no qual prometeu estar à "altura de nossa história".

"Pelo bem de todos, primeiro os pobres", prometeu depois em um discurso no Zócalo, a principal praça do país, ante uma multidão eufórica que agitava bandeiras e músicas de mariachis.

Guillermo Robles, um de seus colegas no Mestrado em Engenharia da Energia da prestigiada Universidad Nacional Autónoma de México (Unam), em 1987, lembra que ela era reservada. "Nem ela, nem eu éramos de socializar com todo mundo".

Depois Sheinbaum fez um Doutorado em Engenharia Ambiental na Unam, para o qual pesquisou durante quatro anos nos Estados Unidos, e fez parte do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC) que ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 2007.

O magnetismo dessa jovem de ascendência judaica estava enraizado em suas convicções de esquerda que a tornaram militante do Conselho Estudantil Universitário (CEU), opina Robles. Esse coletivo freou uma tentativa de privatização da universidade pública e foi terreno fértil para nomes do atual governo de López Obrador, seu mentor político.

Presidente eleita do México, Claudia Sheinbaum, fala com apoiadores após os resultados das eleições gerais em um hotel na Cidade do México, em 3 de junho de 2024(Foto: GERARDO LUNA / AFP)
Foto: GERARDO LUNA / AFP Presidente eleita do México, Claudia Sheinbaum, fala com apoiadores após os resultados das eleições gerais em um hotel na Cidade do México, em 3 de junho de 2024

Embora Sheinbaum "não fosse das principais" líderes, segundo Robles, seu comprometimento não diminuiu, mesmo estando grávida de sua filha, Mariana, hoje com 36 anos.

Essa convicção tem veia familiar. Sua mãe, Annie Pardo, renomada bióloga, foi expulsa como professora universitária por denunciar o massacre de estudantes de 1968 na praça Tlatelolco.

 

 

"Governar é tomar decisões... e assumir as pressões"

Presença e discrição são as marcas da atuação de Sheinbaum, cujos avós chegaram ao México vindos da Bulgária e Lituânia fugindo da Segunda Guerra Mundial. Como prefeita de um distrito da Cidade do México, enfrentou o desmoronamento de um colégio durante o terremoto de 2017 que matou 26 pessoas, incluindo 19 crianças. Metodicamente, insistiu que as irregularidades na construção não eram culpa da prefeitura.

Também gerenciou com destreza um dos momentos mais delicados como prefeita da capital (2018-2023): a pandemia e a queda de uma linha do metrô que deixou 26 mortos. O uso de métodos científicos e ferramentas tecnológicas refletiu a marca de Sheinbaum na gestão da Covid-19, que, no entanto, deixou uma elevada mortalidade.

A candidata presidencial do México pelo partido Morena, Claudia Sheinbaum, acena ao chegar a um local de votação em San Andres Totoltepec, Tlalpan, na Cidade do México, durante as eleições gerais de 2 de junho de 2024(Foto: YURI CORTEZ / AFP)
Foto: YURI CORTEZ / AFP A candidata presidencial do México pelo partido Morena, Claudia Sheinbaum, acena ao chegar a um local de votação em San Andres Totoltepec, Tlalpan, na Cidade do México, durante as eleições gerais de 2 de junho de 2024

"Tem uma capacidade de análise impressionante, de ler dados e encontrar soluções muito práticas", comenta Tatiana Clouthier, porta-voz da campanha e ex-ministra da Economia de López Obrador.

Após o colapso de uma linha de metrô em 2021, defendeu sua equipe e optou por uma polêmica negociação com a construtora da obra - propriedade do magnata Carlos Slim - para indenizar as vítimas e evitar julgamentos. "Governar é tomar decisões (...) e assumir as pressões que podem gerar", argumenta Sheinbaum em um documentário.

Para combater a violência de gênero, ela promete criar Procuradorias especializadas e oferecer aconselhamento gratuito em um país que registra a média diária de 10 assassinatos de mulheres, muitos deles tipificados como feminicídios.

 

 

Oponente ataca: "Dama de gelo"

A candidata presidencial do México pelo partido governista Morena, Claudia Sheinbaum, cumprimenta seu comício de encerramento de campanha na Praça Zócalo, na Cidade do México, em 29 de maio de 2024(Foto: ALFREDO ESTRELLA / AFP)
Foto: ALFREDO ESTRELLA / AFP A candidata presidencial do México pelo partido governista Morena, Claudia Sheinbaum, cumprimenta seu comício de encerramento de campanha na Praça Zócalo, na Cidade do México, em 29 de maio de 2024

Seu caráter imperturbável pode jogar contra. Ela nunca olhou ou chamou pelo nome sua principal oponente, a centro-direitista Xóchitl Gálvez, durante três debates nos quais foi duramente atacada. "Você continua sendo fria, sem coração, eu a chamaria de dama de gelo", disse Gálvez durante o primeiro confronto, acusando-a de não ter o "carisma" de López Obrador.

Mas a campanha também revelou uma Sheinbaum afetuosa e sorridente, formas que ela geralmente reserva para as pessoas mais próximas. Ela distribuiu beijos e abraços entre milhares de apoiadores e colocou graça e humor nos vídeos do TikTok.

Também compartilhou, em novembro de 2023, a notícia de seu novo casamento com Jesús Tarriba, seu namorado de faculdade, com quem se reencontrou pelo Facebook em 2016. Ela é atenciosa com as mulheres de sua equipe e adepta da liderança horizontal.

“Apesar de ser uma cientista, ela é uma lutadora social, o que faz uma combinação muito boa de mente e coração”, diz Clouthier.

Robles, seu colega de pesquisas há mais de uma década, destaca que ela "tem amor pelo México, não é ambição como muitos políticos. Claudia não é nada parecida com os políticos tradicionais", afirma.

 

 

M de México, M de mulher: o que muda com Claudia Sheinbaum como presidente?

"O México já não se escreve mais com M de machismo (...) se escreve com M de mãe e M de mulher", afirmou há um ano Claudia Sheinbaum. Agora eleita, ela promete combater os elevados números da violência de gênero e ajudar as mulheres a "viver sem medo".

Sheinbaum assume um país onde há quase duas décadas o ex-presidente Vicente Fox descrevera as mulheres como máquinas de lavar "com dois pés". "Nunca mais um 'calada você é mais bonita'!", afirmou a presidente eleita diversas vezes durante a campanha.

A candidata presidencial do México pelo partido governista Morena, Claudia Sheinbaum, posa para fotos com apoiadores ao chegar ao comício de encerramento de sua campanha, na praça Zócalo, na Cidade do México, em 29 de maio de 2024(Foto: PEDRO PARDO / AFP)
Foto: PEDRO PARDO / AFP A candidata presidencial do México pelo partido governista Morena, Claudia Sheinbaum, posa para fotos com apoiadores ao chegar ao comício de encerramento de sua campanha, na praça Zócalo, na Cidade do México, em 29 de maio de 2024

A representação feminina tem avançado no México: as mulheres presidem o Banco Central e a Suprema Corte, que descriminalizou o aborto a nível federal há menos de um ano. Também são maioria no Congresso, após uma reforma constitucional há 10 anos que garantiu uma cota de 50% entre as candidaturas.

Mais da metade dos estudantes da Unam são mulheres. Assim como a segunda colocada na eleição, Xóchitl Gálvez, em uma disputa sem precedentes na América Latina. 

"Como defensora das mulheres, no feminismo há 60 anos, imagine, este é o sonho que se tornou realidade", disse a senadora Olga Sánchez Cordero à AFP. "O que esta vitória significa para mim? Significa que agora posso morrer em paz", declarou a ex-ministra da Suprema Corte.

"Não acredito que os machistas vão mudar porque há uma mulher presidente, mas poderíamos ter mais direitos e formação para nos defendermos dos sexistas", diz a vendedora Norma Teófilo, de 20 anos, após votar em Sheinbaum.

Segundo a ONU Mulheres, 70% das mexicanas com mais de 15 anos no México sofreram violência pelo menos uma vez na vida. Ao somar o número de feminicídios e homicídios dolosos, os assassinatos de meninas e mulheres são em média cerca de 10 por dia, indica a ONU.

"Estamos cansados do machismo, devemos apoiar as mulheres, as mães solteiras que sofrem violência", afirma Bryan Ramírez, de 25 anos.

 

 

Presidentes mulheres eleitas na América Latina

Com a vitória de Claudia Sheinbaum nas eleições mexicanas do último fim de semana, chega a oito o número de mulheres eleitas presidentes ao longo da história na América Latina. Confira:

 

 

 

Claudia Sheinbaum: um símbolo poderoso

Para a socióloga Zeida Rodríguez, da Universidade de Guadalajara, a eleição de Sheinbaum é "algo simbolicamente muito poderoso". "Espero que se torne mais normal que os homens sejam liderados por mulheres (...) Pode ser o início de outra etapa", declarou.

A socióloga considera que ao ocupar este cargo, Sheinbaum pode contribuir para a valorização das mulheres, mas alerta para uma maior "violência política de gênero", visto que o avanço das mulheres "exacerbou as expressões sexistas, em vez de diminuí-las".

Pamela Starr, especialista em México da Universidade do Sul da Califórnia (USC), estima que Sheinbaum será mais sensível às mulheres do que o atual presidente Andrés Manuel López Obrador (AMLO). "Terá uma política específica em relação ao feminicídio que AMLO não queria ter", afirma.

Presidente eleita do México pelo partido Morena, Claudia Sheinbaum, parte em um carro para a Praça Zocalo após os resultados das eleições gerais na Cidade do México, em 3 de junho de 2024(Foto: CARL DE SOUZA / AFP)
Foto: CARL DE SOUZA / AFP Presidente eleita do México pelo partido Morena, Claudia Sheinbaum, parte em um carro para a Praça Zocalo após os resultados das eleições gerais na Cidade do México, em 3 de junho de 2024

A nova mandatária propõe ampliar a nível nacional medidas bem-sucedidas de seu mandato como prefeita da Cidade do México, como uma promotoria dedicada aos feminicídios - e a investigação obrigatória de cada morte por este crime - e ao combate à violência doméstica, bem como a contratação de advogadas em todas as pastas do Ministério Público.

Starr alerta ainda sobre uma possível relação com Donald Trump, caso ele vença as eleições de novembro nos Estados Unidos. "Sabemos que Trump tende a ofender as mulheres, por isso suspeito que ele testará Sheinbaum para ver o quão forte ela é", estimou.

 

 

Outras presidentes

Outras mulheres ocuparam ou estão atualmente na presidência de países latino-americanos, mas não foram eleitas pelo voto popular para chegarem aos cargos. Confira:

 


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