No meu último artigo neste jornal, "As leis não bastam..." (16/3/2025), fiz uma análise que, mesmo com a imprescindível evolução legislativa brasileira de proteção aos direitos das mulheres, a violência de gênero aumentou. E escrevi sobre os "Red Pills", grupos de homens que defendem o machismo e a misoginia na internet.
Volto ao assunto. Noutra perspectiva: a influência extrema da "machosfera" sobre adolescentes no ambiente virtual, situação retratada na série "Adolescência" (Netflix). Ela apresenta a história de Jamie, 13 anos, acusado de assassinar uma colega após ser exposto a conteúdos misóginos online e sofrer cyberbullying.
Os fóruns virtuais de oposição ao feminino, representados na ficção, revelam também os "incels", abreviação de involuntary celibates (celibatários involuntários), homens que culpam as mulheres por sua incapacidade de encontrar uma parceira sexual.
No episódio em que a polícia interroga Jamie sobre imagens sexuais de mulheres e mensagens agressivas que ele compartilhou no Instagram, mostra a facilidade com que adolescentes acessam pornografia, encontro que impacta diretamente na construção da identidade sexual e afetiva dos jovens, gerando expectativas irreais e comportamentos de objetificação e controle.
Jamie, desde pequeno, demonstrava interesse pela arte, mas era incentivado pelo pai a praticar futebol e luta. Esse conflito entre as preferências pessoais e as expectativas paternas gerou sentimentos de vergonha e frustração e prejudicou seu desenvolvimento emocional.
"Adolescência" traz à tona o colapso escolar, com desrespeito a professores e especialmente professoras, discursos de ódio e bullying em diversos níveis.
A representação vai além da ficção. Faz refletirmos sobre educação, responsabilização, cuidado e abandono digital. Evidencia como a família, a escola e os conteúdos consumidos em espaços virtuais moldam a vida juvenil e escondem sinais de dor e de sofrimento. Demonstra como um menino, sem histórico de violência familiar, atravessa um processo de alienação ao se expor a ideias virtuais radicais e se isola cada vez mais. Simboliza o distanciamento geracional e a desconexão não só digital, mas afetiva na família, perdida em meio ao cotidiano.
Pais, mães, educadores e cuidadores precisam reintroduzir a escuta, o afeto e a empatia nas relações. Equilibrar autoridade e compreensão. Estabelecer limites claros, aliados ao diálogo educativo, ajuda a garantir que os jovens compreendam as consequências de suas escolhas e adquiram um senso de comprometimento. A responsabilidade parental não significa controle absoluto, mas a construção de uma base sólida de confiança e respeito mútuo, com regras de segurança e privacidade, especialmente na internet.