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Forjado por Alan Neto, Sérgio Ponte revisita carreira, conta causos e se declara ao irmão
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Forjado por Alan Neto, Sérgio Ponte revisita carreira, conta causos e se declara ao irmão

Âncora do programa "As Frias do Sérgio" e responsável pela Noite das Personalidades Esportivas, jornalista relembra parceira pessoal e profissional com o irmão, detalha episódios marcantes e explica por que é o Repórter Bi Bola de Ouro
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FORTALEZA-CE, BRASIL,11.08.2025:  Azuis com Sérgio Ponte  (Fotos: Fabio Lima) (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA FORTALEZA-CE, BRASIL,11.08.2025: Azuis com Sérgio Ponte (Fotos: Fabio Lima)
Da coluna social ao esporte, do jornal impresso ao rádio e à televisão, Roberto Sérgio de Barros da Ponte construiu a trajetória de quase 60 anos no jornalismo cearense com o estilo polêmico, incisivo e astuto. Não se furta a dar opiniões e nem dispensa informações de bastidores ou uma boa entrevista, o que rendeu muitas notícias exclusivas na carreira.

Guiado pela referência no irmão mais velho — por quem foi criado como um filho —, ele construiu estilo próprio e tornou-se o "Repórter Bi Bola de Ouro", âncora de um programa que já existe há 54 anos ("As Frias do Sérgio", no ar desde 1971) e responsável por uma das principais premiações do esporte brasileiro (Noite das Personalidades Esportivas).

Conviveu com diferentes gerações de jogadores e dirigentes, cultivou amizades com nomes relevantes e colecionou inimizades que prefere não relembrar.

Pai de Renata, Roberta e Rebeka e avô de cinco netos, Sérgio Ponte, sem dúvida, orgulha-se de ser irmão daquele que o introduziu na crônica esportiva e de quem sempre esteve próximo: Alan Neto. Melhores amigos, eles levaram a parceria para o ar em 2011, quando o "Trem Bala" ultrapassou as ondas do rádio e foi para a TV O POVO.

Sérgio não esconde a saudade e a emoção ao falar do irmão. Depois de 530 dias da última viagem do Trem Bala, o caçula ainda se considera em luto.

As partidas do neto Roberto Sérgio de Barros da Ponte Neto, um ano antes, e do também irmão Helder Ponte, um ano depois, abalaram o Bi Bola de Ouro, que trata as transmissão na Rádio O POVO CBN e "As Frias do Sérgio" como válvulas de escape após encarar uma depressão.

Aos 74 anos, ele admite que sofre pressão em casa para pôr o pé no freio, sobretudo da esposa Inês Helena. Mas entende que ainda não é o momento de desligar o microfone e nem deixar de realizar o evento anual, que chega à 53ª edição em 2025.

Munido de anotações e a matéria de um ano da morte de Alan Neto em mãos, Sérgio Ponte recebeu O POVO em casa, puxou memórias e disparou opiniões durante quase duas horas de entrevista.

O POVO - Por que você quis ser jornalista?

Sérgio Ponte - Eu acho que já nasci com essa veia. Por exemplo, eu tinha 7, 8 anos de idade, morava em casa cheia de irmãos, ficava na rede sozinho, narrando futebol. Eu mesmo bolava os times.

Marca de refrigerante, marca de cigarro, jogava um contra o outro. Eu narrava e gritava gol, entendeu? A ponto da mamãe me proibir, porque os punhos (da rede) estavam todos se quebrando.

E aí, lá em casa, tinha o Flávio (Ponte), que, apesar de ser jornalista mais dedicado ao jornal, chegou a ser chefe de redação do O POVO durante muito tempo, tinha o Alan (Neto), que era radialista, tinha o Hider (Ponte), que também estava dando uma ajudinha na rádio, iniciando.... Aí, eu enveredei por esse caminho, sabe? Sempre gostei de futebol, sempre narrei em casa, aí você fica pegando gosto.

Me acostumei a andar com o Alan. O Alan fazia aquelas reportagens dele, tem até uma foto no Jornal O POVO, histórica, do Pelé lá, Beira-Mar, e eu gazeei aula do Liceu, um gravador que eu tinha arrumado e fui gravar a entrevista com o Pelé.

Depois, ele foi para o Savanna, e onde ele (Alan Neto) ia, eu era o intruso. Eu ia lá e falava: "Vou contigo". Aí, eu fui ser, sempre quis isso.

OP - Então você sempre gostou de futebol?

Sérgio - Sempre gostei de futebol, sempre acompanhei futebol. Sou fã de programas de rádio, continuo ouvindo, embora o nível esteja mais baixo do que eu imaginava, mas a gente lida com isso. E eu acho o futebol uma terapia para mim. Eu participar da jornada (esportiva, da rádio O POVO CBN), para mim, é uma terapia. Fazer o que a gente gosta é bem diferente e melhor.

OP - E como essa relação se tornou mais profissional?

Sérgio - Com 16, 17 anos, em 1967, eu participava do "Esporte no Ar", que era o programa que o Alan tinha. Aí, ele me nominava de repórter amador. Eu ia lá para o treino no Ceará, assistia aos treinos e levava as notícias para ele. Aí, ele mandava eu participar do programa.

Fui tomando gosto com aquilo. Em 1968, eu entrei realmente, me credenciei, me associei na Apcdec (Associação Profissional dos Cronistas Desportivos do Estado do Ceará). Eu sou um dos caras mais antigos da Apcdec.

Antes, no jornal (impresso), eu fiz várias coisas, não apenas no futebol. Eu fui repórter do Edmundo Vitoriano, que era um baita colunista social da época, de 1969 a 1972, 1973. Ele me pagava e eu trabalhava com ele. Fiz também coluna sobre rádio, sobre clubes sociais.

Aí, eu fui pra rádio, comecei a participar do programa do Alan. Em 1971, eu tive vontade de fazer o meu programa. Como lá em casa a gente brincava muito que tinham as quentes do Alan e as brasas do Hider, aí eu optei pelas minhas "frias".

Comecei fazendo, um dia de outubro, por dez minutos. Não lembro se era o Edson Silva ou o Paulo Oliveira que estava na rádio à noite. Ele abria a exceção de 10 minutos e eu comecei a fazer as Frias, sem me desvincular do programa do Alan.

OP - Quando você tomou gostou pelas notícias de bastidores? 

Sérgio - Puxei ao Alan. Ele começou o esporte lá na rádio O POVO em 1961 e a coluna dele começou em 1965, na Gazeta de Notícias, depois foi para O POVO... Aquela história das notícias de bastidores, sabe? Eu ficava muito atento à reportagem, à entrevista, o que diferenciava o entrevistado.

Tem a história do Tostão, que ele (Alan Neto) contou muitas vezes na coluna dele, que estava esperando lá no hall, enquanto ele (Tostão) almoçava. Aí, depois o sacana foi para o piano (imita sons de notas musicais). Eu não aguentei e falei: "Rapaz, vai parar de tocar isso não?" (risos). Ele ficou p da vida: "Eu não vou mais dar entrevista, não". "Pois não dê". Aí, o Alan falou: "Tu é doido?", "doido o quê, vou passar a tarde todinha aqui?". Eu com uma fome danada, esse homem comeu, se empanzinou e tocando isso.

Eu gosto dessas coisas, sempre fui repórter. Sempre gostei de ser repórter, não sou comentarista, narrador não tenho condições de ser, não tenho goela suficiente, gogó para narrar futebol. Sempre fui repórter.

OP - Ao longo de todos anos, quais os furos de notícia mais marcantes que você divulgou? 

Sérgio - Não, eu não me lembro assim, não, dessas coisas. Lembro assim, de queda de treinador... Ah, me lembro, por exemplo, da contratação da dupla Tome Gol, que o Ceará contratou. Perdeu o título (do Campeonato Cearense) do Fortaleza, em 1964, aí o (ex-presidente Elias) Bachá, no dia seguinte, anunciou a contratação do Fernando Carlos e do João Carlos.

Um jogava no Ferroviário e o outro jogava no América-CE. Com isso, esfriou a grita... O Bachá, um dirigente da época, ele e o Otoni Diniz se rivalizavam, um no Ceará, e o outro, no Fortaleza. Ele encontrou uma maneira de dar uma suavizada, consolar o torcedor do Ceará. Quem me deu essa informação foi um funcionário dele, da Casa Bachá.

O Bachá era engraçado, ele administrava o Ceará sem sair de lá, da Casa Bachá, ali na Floriano Peixoto. O Fialho, José Maria Fialho, era o grande assessor dele, o porta-voz dele. Aí, o funcionário dele me disse. Comecei a comprar coisas com ele lá, ele sabia que eu era repórter, aí ele disse: "Olha, o Ceará fechou com dois jogadores".

Ele não sabia muito dos caras: "Um é artilheiro, fez o campeonato pelo América, e o outro é um galalau, moreno, alto. Eu sei que ambos terminam com Carlos". Aí eu disse: "Fernando Carlos e João Carlos". Aí eu soltei essa notícia no início do dia.

Outra: demissão de treinador. Muito especula fulano, ciclano. Eu, por acaso, estava lá no gabinete do André (Figueiredo) e vi ele fechando com o PC Gusmão. Anunciei na rádio, a concorrência desmentiu e ele (André) disse: "Você está ouvindo a conversa, mas não revela nada". Ora, não revelar nada... Soltei a notícia.

No outro dia, o telefone toca — naquele tempo não tinha celular —, mas era ele, e eu nem atendi, sabendo que era ele. Vai me dar carão? Jornalista não pode guardar notícia. Não pode é inventar, mas furar... A gente vive disso.

OP - Com tantos anos de estrada, você certamente colecionou boas relações e atritos. Com quem você teve uma maior aproximação? Tiveram inimizades também?

Sérgio - Caso de inimizade eu prefiro não falar. Prefiro não falar porque... Deixa para lá. Hoje, o cara é político, está em outra esfera. Eu me dava bem com o Robinson (de Castro, ex-presidente do Ceará), me dava muito bem com ele.

Questionava o Robinson pelo fato que ele não deixava ninguém ir para o "Trem Bala", na época que o "Trem Bala" surgiu, que foi na TV O POVO. Me dava muito bem com Jorge Mota (ex-presidente do Fortaleza), ligava muito para ele, na época difícil que o Fortaleza passou e ele foi obrigado a deixar o cargo, renunciar, eu dei todo o apoio. 

Anteriormente, o Péricles Mulatinho, na época das vacas magras, que o Fortaleza e os outros times não tinham o vil metal (dinheiro), ele se sacrificou pelo Fortaleza. Eu me dava muito bem com ele, com o Franzé Moraes, um dirigente acima do tempo e do espaço. Brigar, a gente briga, discute... Às vezes eles se chateavam porque dei notícia. "Eu dei, porque se eu não der, fulano vai dar, ciclano vai dar".

OP - O Alan Neto te deu a alcunha de "repórter Bi Bola de Ouro", que você acabou adotando. Por que Bi Bola de Ouro? 

Sérgio - É o seguinte, o José Jorge era repórter, era jornalista lá da Sport Press, no Rio de Janeiro. E trabalhava, se associava ao dono do Jornal dos Sports, que era cearense (José Dias). E o José Jorge tinha uma promoção anual, Bola de Ouro. E ele fazia (o prêmio) Bola de Ouro, só que era muito pelo atacado.

Fazia uma festa englobando gente de futebol, jogador, repórter, artista, dirigente... O rapaz era um vendaval, uma coisa extraordinária. Aí, o Zé Jorge ligou pra mim, perguntando como é que eu via a escolha. Alguém deve ter... Deve ter sido o cara da Sport Press que sugeriu. "Olha, eu quero lhe homenagear como repórter de rádio". Tudo bem. Eu me lembro que ele fez uma festa, em 1970, no Jockey Club do Rio de Janeiro. Era uma festa com mais de 100 homenageados.

Claro, nem todo mundo estava presente, mas ele tinha muito prestígio, a Sport Press, na época: estavam (ex-presidente da CBD e da Fifa, João) Havellange, Francisco Horta, grandes dirigentes, aquela turma toda. Aí, anunciavam. Primeiro, você ia lá, recebia o troféu: "Repórter esportivo, o melhor repórter do Nordeste, Sérgio Ponte, da Rádio Iracema, de Fortaleza".

Fez a primeira festa, eu fui. Um ano depois, ele repetiu. Bi Bola de Ouro. Aproveitei o fato e me rotulei, sabe? Repórter Bi Bola de Ouro. Aí pegou.

OP - E como surgiu a Noite das Personalidades Esportivas? 

Sérgio - Bom, eu tinha sido homenageado em 1970 e 1971, como Bi Bola de Ouro. Eu comecei "As Frias" em 1971. O programa era dia de domingo, dez minutos, e eu sempre querendo inovar... "Rapaz, eu vou prestigiar, não vou deixar passar a limpo essa data, não".

Pedi ao Zé Leite Jucá, que eu assessorava: "Zé Leite, me ajuda, vou homenagear um cara na Noite das Personalidades, vou fazer a primeira festa. Me consegue um troféu lá da BD Sports". Fui lá, o Eladio me deu uma medalha de honra ao mérito. Aí eu chamei, na época, o Paulino Rocha (ex-comentarista esportivo e deputado, morto em 1979). Foi o primeiro que eu homenageei. Lá no estúdio da Rádio Iracema. Segundo (ano), já não era mais um (homenageado), eram dois. Depois, três. Aí, você começa a pegar corda, no bom sentido...

O programa foi crescendo, já não ficou mais num horário de 10 minutos, estendeu mais, não era mais domingo, era sábado... O Alan fazia o programa de segunda a sexta, na Rádio Iracema, e eu fazia aos sábados. 

Me lembro que o primeiro grande evento foi na pérgula do BNB Clube, em 1996. Aí, eu já homenageei dirigente, um jogador, um treinador, um árbitro, dirigente amador, dirigente sindical e dirigente de clubes sociais. 

OP - Queria que você contasse histórias marcantes com esses grandes nomes. Você sempre fala da amizade com o Felipão, o Galvão Bueno gravou uma chamada para As Frias...

Sérgio - É a única chamada que ele (Galvão Bueno) fez para rádio. Para rádio, não, eu acho que para todo mundo.

O Felipão é um irmão. Não é nada daquele turrão. Nada. Absolutamente nada. Vieram ele, a esposa, trouxe os dois filhos, Fabrício e Leandro.  A gente leva ele para almoçar em casa, jantar em casa. Todo mundo querendo bater foto com ele. Fomos jantar num restaurante ali, na Silva Jatahy, e ele não era mais treinador da seleção. Quando o pessoal viu que era ele, não parou de gente.

E aí eu me lembro porque foi uma coisa que marcou muito, ele não era mais treinador da seleção, anunciava que jamais voltaria para a seleção. Quando ele se levantou e foi embora, o pessoal lá do restaurante, de pé, aplaudiu o Felipão. A dona do restaurante foi lá e perguntou se ele podia ir na cozinha, que tinham uns portugueses que trabalhavam lá.

Ele foi na cozinha, bateu foto, deu autógrafo. Eu disse até para ele: "Está aí, Felipão, o fato de você não voltar para a seleção. Não volte, não, meu irmão. Você vai ser sempre lembrado como o homem do pentacampeonato". E ele me garantia que não voltava. Mas voltou.

OP - Uma similaridade em quase todas as suas respostas é a referência ao nome do Alan. Como era sua relação com ele, não só de irmão, mas também profissional?

Sérgio - Eu tenho até uma matéria que você (Victor Barros, jornalista) fez, no (dia de) um ano de morte do Alan. Feito e assinado por você: "Irmão de vida e parceiro inseparável". Eu sempre tive muita afinidade com ele. Lá em casa, nós somos 11 irmãos: uma mulher e dez homens. Como eu gostava muito de rádio, de esporte. Ele via que eu tinha essa tendência. O papai trabalhava no Interior, era fiscal de obras e açudes no Interior, vivia muito fora, disse, uma vez, que ele (Alan Neto) tomasse conta de mim. "Eu não vou estar aqui, eduque o Bebeto. Faça de conta que você é o segundo pai dele".

E eu sempre copiava vários exemplos dele, não só como irmão. A maneira como ele economizava dinheiro... Me ensinou uma coisa: "Olha, se você ganhar mil reais, você gasta 900, guarda 100 para uma emergência". Essas pequenas coisas, sabe?

A correção de opinião, a maneira que ele fazia, ele transformava um limão numa limonada. Um fato desse tamanho, o povo esperava as 18 horas para ouvir o "Superlativo", o programa do Alan, depois foi o "Trem Bala". Enfim, eu fui moldando ao estilo dele. Nós tivemos uma parceria muito grande, muito mais de amigo do que de irmão.

Alan casou-se, foi morar lá perto do São Sebastião, eu ia todo domingo pegar o dinheiro para comprar o almoço dele. Ele me dava um agrado maior. "Aí, para você voltar de táxi". Eu não era besta, economizava e ia de ônibus mesmo.

Profissionalmente, então, nós tivemos uma ligação muito grande. Eu coletava notícias para ele, participava do programa dele. O (João) Dummar (Neto, presidente executivo do Grupo de Comunicação O POVO) adorava o "Trem Bala" na rádio, aí foi uma vez lá na rádio, que era na Praia de Iracema, assistir ao programa no estúdio.

O Alan falando, dando a notícia e tal. Ele (Dummar) ficou empolgado e botou na cabeça de inovar: fazer o "Trem Bala" na TV O POVO. Nessa época, o Alan estava na TV Jangadeiro. 

Aí, o Dummar me chamou e disse: "Eu vou lhe dar uma missão importantíssima, mas não falhe, não. Convença o Alan a fazer o programa aqui. O que você acha da ideia?". E eu disse: "Acho a ideia magnífica". "Nós vamos sacudir a cidade e nada melhor do que trazer o Alan, com toda a equipe, aqui para a TV. Convença ele a vir".

Aí, eu comecei a fazer a cabeça dele. TV Jangadeiro, audiência extraordinária; TV O POVO, iniciante. Eu fiz a cabeça dele, foi difícil. O tiro certeiro foi: "Tu sempre sonhou em ser o âncora do programa. Tu não é o âncora na TV, na TV tu é o comentarista, o analista. O que tu faz na TV, tu faz todo dia na rádio. Tu precisa se expandir, precisa ser o âncora, precisa ser o nome do programa".

De 2011 a 2017, meio-dia, segunda a sexta, "Trem Bala". Nós passamos lá cinco anos e dez meses. Em de janeiro de 2017, ele nos chamou, eu e o Alan, para dizer que a televisão ia mudar de programação, mas não queria que o programa acabasse. "Vamos fazer o seguinte: vocês podem ir, eu cedo vocês para qualquer emissora. Vocês podem ir, mas com uma condição: vocês vão emprestados pelo Grupo O POVO".

Aí vem a chance da gente ir para a TVC. Comunicamos a ele. Sempre eu, né? Eu ia, comunicava, falava em nome do Alan. "Tem algum problema?", "vocês vão, mas vão por empréstimo, estão cedidos". O programa na TV foi de 2017 a 2023, no dia 25 de agosto. Arrebentou. Foi a maior audiência da TV Ceará em todos os tempos. O fenômeno que o programa era, realmente. No YouTube era no Brasil todo.

OP - Qual era o grande diferencial do "Trem Bala" e do Alan Neto?

Sérgio - A verdade. O zelo, a determinação, a vontade, o tesão que ele tinha pelo programa. Ele queria o programa bem feito. Ele queria, acima de tudo, a verdade. Ele queria polemizar. Ele adorava isso. Polêmico.

"Alan, a turma está te esculhambando", "deixa esculhambar". O Dummar tem uma frase muito interessante, que até hoje está gravada: "O 'Trem Bala', ou o cara gosta ou odeia". E quem odiava o "Trem Bala" ou a figura do Alan, não deixava de assistir. E quem gostava, duplicava. Quantas pessoas foram naquele "Trem Bala", na Cadeira Elétrica (bloco de entrevista do programa), e sofreram na mão da gente não está no gibi. O pau cantava.

O Alan é uma pessoa... Até hoje, sinceramente, eu tenho uma lembrança dele total. Entrei numa depressão, já perdi nove quilos. Nada, para mim, tem mais sentido. Terminou, o Alan morreu, aí o Dummar nos chamou para falar do futuro do "Trem Bala".

"Dummar, quer minha opinião? Acaba o programa. Não tem o menor sentido. O programa 'Trem Bala' foi criado por você para ele. Ele, Alan Neto, é o carro-chefe do programa. Alan Neto é audiência, é o repórter acima de qualquer suspeita. Quer vai assistir o "Trem Bala", vai assistir esperando o furo dele, a maneira dele criar, a Cadeira Elétrica, olha o dedo...".

Por exemplo, eu jamais me sujeitarei a fazer o "Trem Bala" no lugar dele. Fazia quando ele estava doente. E eu não gostava, a prova é tanta que o Lucas Mota (editor do Esportes O POVO) depois assumiu. Eu gosto de estar na bancada. Mas agora, ele morto, nem na bancada eu vou mais. Acabou. Ele disse: "É, você tem razão, eu estava pensando nisso".

OP - Quando vocês foram para a internet, muitas coisas viralizavam. Apesar de vocês não terem tanta intimidade com tecnologia, as repercussões chegavam para vocês? 

Sérgio - A Alana gravava o que aparecia, passava para ele. Eu tenho um irmão que mora há muito tempo em São Paulo. "Mata a saudade do nosso irmão, veja aí no YouTube". Ele acompanhava a mandava: "Fabuloso, maravilhoso". Ele (Alan Neto) tomava conhecimento. Eu apenas dizia para ele: "O fulano ligou, o YouTube está bombando". "Rapaz, isso não é 'corda', não?".

Depois que o "Trem Bala" acabou, eu vou ao jornal, não passo ali (no estúdio da TV). No estúdio da rádio, eu dobro à direita. Um dia, eu me lembro que quando fomos voltar para o jornal, no YouTube, os funcionários abraçando ele, festejando, pedindo selfie... Aquilo deixava ele muito feliz, muito feliz mesmo. "Está vendo aí, Alan? Esse pessoal está aqui para te ouvir. Tu é um grande nome, vai abrir portas, vai ser visto no Japão no YouTube".

Por mais que a gente dissesse para ele, ele ficava com um pé na frente e outro atrás, mas a filha, Alana, fazia isso, a Júlia (neta), os irmãos, os parentes, os meus amigos... "Estou gostando do programa. Vocês não têm medo de apanhar?". "Tem nada, rapaz. Depois de velho, não tenho medo de apanhar coisa nenhuma".

OP - Você sempre foi muito ácido, um estilo contundente para criticar, mas sempre manteve boa relação com fontes para obter informações e entrevistas. Como você consegue equilibrar isso?

Sérgio - Eles entendem isso. O Robinson (de Castro) tinha me dito, um caso mais específico, eu tinha muito contato com ele, de que o João Paulo seria o candidato dele (à presidência do Ceará). Foi outro furo também que eu dei.

"João Paulo é o meu candidato". Era o diretor financeiro. Aí, uma vez, nós estávamos tomando café, eu e o Alan, e convidei o Robinson para ir, para ele passar umas ideias. E ele gostava muito de ouvir a gente. Aí, ele levou o João Paulo.

Eu disse para ele: "O Robinson é tido como um homem mau pela torcida de Ceará, por uma série de fatores, e muitos desses fatores ele não teve culpa nenhuma, foi vítima. É a sua maneira de pensar, de agir. Primeiro, traga a torcida para junto de você".

"A gente vai criticar você. A gente critica o presidente, não a pessoa". É assim que eu lido com as pessoas. Eu faço alguma crítica, não é ao cidadão. Diferente de muitos que criticam o ser humano. Não, eu não critico o ser humano. 

O presidente do Ferroviário é o Aderson Júnior. O pai dele foi meu grande amigo, Aderson Maia, meu guru, meu amigo, amigo meu, de minha família, foi amigo do Flávio, trabalhou com o Flávio, meu amigo. Eu jamais terei condições de criticar o Adersinho, que conheci menino, pequeno.

Aí, eu traço essa ideia, porque as pessoas me conhecem. Sabem que eu sei ser crítico, eu sou polêmico.

OP - Hoje há um movimento, até de jornalistas mais experientes, de revelar o clube do coração. Você já pensou em fazer isso?

Sérgio - Na intimidade, eu sou Ceará. Mas aposto, duvido, quem, por acaso, veja eu fazer uma crítica ou elogiando o Ceará em detrimento dos outros. De maneira nenhuma. Na hora de elogiar, eu sei separar o joio do trigo. Na hora de criticar, eu critico. Na hora de elogiar, eu elogio.

Vale para o clube, vale para o dirigente. Eu não faço campanha acirrada contra fulano, beltrano, ciclano, de jeito nenhum. Para ninguém pegar nessa munheca. "Ah, porque o Sérgio Ponte...", não, não pega na munheca. Eu tenho livre arbítrio. Eu não critico o cidadão, critico o dirigente. Se não quer receber críticas, saia do futebol.

OP - Você quer ser lembrado com o Sérgio das Frias, o Sérgio da Noite das Personalidades ou o Sérgio irmão do Alan Neto?

Sérgio - O Sérgio repórter. É o que me marca. "Ele fez 'As Frias do Sérgio'"... Uma coisa interessante: já faz um ano que o Alan morreu. Não se viu ninguém, nenhum vereador, apresentar um projeto de lei dando o nome de uma rua, de uma praça. Sabe por quê? Porque nós, da imprensa esportiva, somos relegados a plano inferior.

O que esse homem fez em prol do futebol... Nunca, até hoje. Já passou um ano e três meses. Uma rua, um nome de uma praça esportiva, uma Areninha. Poxa, será que esse homem não deixou um legado? É por isso que eu criei a comenda Alan Neto: para imortalizar o Alan, para deixar viva a memória dele.

Data da festa
Na entrevista, Sérgio lamentou que a Noite das Personalidades Esportivas de 2025 seria realizada ainda em meio ao Campeonato Brasileiro, que estava previsto para acabar em 21 de dezembro. No entanto, a CBF antecipou para dia 7, justamente um dia antes da festa

Primo e produtor
Um dos entrevistadores destas Páginas Azuis, Victor Barros foi produtor do "Trem Bala" no YouTube do O POVO. O sobrenome em comum, à época, chamou atenção de Alan e Sérgio, que descobriram o parentesco e passaram a chamá-lo de "primo"

No rádio e no YouTube
Sérgio Ponte apresenta jornadas esportivas na Rádio O POVO CBN e Rádio O POVO CBN Cariri, que também são exibidas no YouTube do O POVO e do Esportes O POVO. Além disso, aos sábados, das 18 horas às 20 horas, comanda "As Frias do Sérgio", também com transmissão na rádio e na internet 
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