Ao participar por mais de duas horas de um ato a favor do seu governo e com críticas ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal (STF) ontem à tarde, o presidente Jair Bolsonaro ignorou a orientação de sua equipe médica e diretrizes do Ministério da Saúde para tratar a epidemia do coronavírus. O presidente deixou o isolamento que deveria fazer por ter se encontrado, em viagem aos Estados Unidos semana passada, com ao menos 11 brasileiros que já tem a doença e cumprimentou apoiadores que se aglomeravam em frente ao Palácio do Planalto. A atitude foi criticada por médicos e autoridades políticas.
Análise feita pelo jornal O Estado de S. Paulo a partir do vídeo da participação de Bolsonaro no ato mostra que ele teve contato físico com 272 pessoas em cerca de 58 minutos de interação na frente do palácio. O número leva em conta apoiadores de quem o presidente pegou o celular para tirar selfies e aqueles que foram cumprimentado. Infectologistas e até aliados próximos de Bolsonaro reprovaram a atitude. Segundo especialistas em doenças infecciosas, o presidente errou ao ignorar a recomendação de isolamento e expor os manifestantes ao risco de contaminação pela covid-19 (caso esteja com o vírus incubado); ao não proteger a si próprio e ter contato com uma aglomeração que pode incluir pessoas infectadas; e ao não dar o exemplo à população de que deve ser levada a sério a orientação feita pelo Ministério da Saúde para que se evite aglomerações.
Bolsonaro também foi assunto de políticos, por ter participado de manifestações que atacam diretamente o Parlamento. O presidente do Congresso, o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) classificou o comportamento do presidente como "inconsequente" e um "confronto" à democracia, enquanto o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que Bolsonaro deveria estar "coordenando um gabinete de crise para dar respostas e soluções para o país", em vez de ir ao protesto.
No fim do dia, o presidente comentou o assunto em uma entrevista à CNN Brasil e desafiou Maia e Alcolumbre a irem "às ruas". "Gostaria que Maia e Alcolumbre saíssem às ruas como eu. Saiam às ruas e vejam como vão ser recebidos", disse. Apesar disso, o presidente afirmou que está disposto a se reunir com os dois parlamentares para alinhar uma "pauta de interesse da população"
Bolsonaro deixou o Palácio da Alvorada ontem por volta das 12h10min e acompanhou uma carreata em defesa do seu governo. Depois, às 13h, apareceu na rampa do Palácio do Planalto. Ele só voltou ao Alvorada às 14h30min.
Os manifestantes gritavam "Fora Maia" e um deles chegou a pedir que o presidente fechasse o Congresso Nacional. Os apoiadores também criticaram o presidente do STF, Dias Toffoli. O presidente também divulgou imagens que identificou como sendo de manifestações em outras dezenas de cidades, como Recife, Fortaleza, Porto Alegre, Vila Velha, Icaraí, Foz do Iguaçu, Mogi Mirim, Francisco Beltrão, Ribeirão Preto, Maceió e Campinas. (agência Estado)
Uma "faxina" no Congresso e Superior Tribunal Federal (STF) era o discurso que se repetia entre os apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) durante ato pró-governo na tarde de ontem, na Praça da Imprensa. O público, predominantemente formado por idosos - grupo de risco do novo coronavírus (COVID-19) -, minimizou a necessidade do senso coletivo em meio à pandemia.
Nas faixas, alguns pediam por intervenção militar e diziam que o "verdadeiro vírus do Brasil" está nas instituições. Quando questionados sobre a recomendação do Ministério da Saúde de evitar aglomeração, afirmavam que ainda não havia riscos. Segundo o vice-presidente do Conexão Patriota e um dos organizadores da manifestação, Roberto Barros, a data chegou a ser remarcada.
"Quando o presidente falou, chegamos a adiar, mas recebemos o pedido do povo dizendo que queria ir para rua", justifica, acrescentando que orientou o uso de máscaras e que pessoas com sintomas não comparecessem.
Por volta das 16h30, a Praça da Imprensa ficou parcialmente ocupada pelos manifestantes. Em alguns momentos, eles se deslocavam até a Avenida Desembargador Moreira para travar o tráfego de veículos e buscar apoio dos motoristas. Poucos protestantes cobriam os rostos com máscaras descartáveis pintadas de verde e amarelo, bonecos infláveis do presidente compunham o cenário para as selfies dos bolsonaristas, camisas e bandeiras eram vendidas por R$ 20.
Entre danças, canto do hino nacional e orações, falavam em "acabar com o aborto, ideologia de gênero, invasores de terra, indústria da multa, ambientalistas, naturalistas. Segundo a organização do evento, cerca de 10 mil pessoas participaram do ato.
Para a aposentada Egídia Rebelo, 65, o coronavírus ainda não é um risco em Fortaleza e o importante é sair às ruas para apoiar o Governo. "O Bolsonaro não pode fazer nada com esse STF que está aí. Deveríamos fazer uma limpeza", disse.
Os principais alvos de críticas eram os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), Dias Toffoli (STF), Rodrigo Maia (DEM-RJ), ministro Gilmar Mendes, além do Partido dos Trabalhadores (PT) e a imprensa. O movimento foi encabeçado pelos grupos de direita: Consciência Patriótica, Endireita Fortaleza, Oração por Bolsonaro e Conexão Patriótica.