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Reserva de recursos para negros está na pauta do TSE
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Reserva de recursos para negros está na pauta do TSE

| Eleições 2020 | Tribunal Superior Eleitoral (TSE) retoma votação sobre medida que pode criar reserva de recursos do fundo eleitoral para candidatos negros
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O ministro Luís Roberto Barroso é o relator do processo (Foto: Agência Brasil
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Foto: Agência Brasil O ministro Luís Roberto Barroso é o relator do processo

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) discute nesta semana medida que estipula reserva de recursos e de tempo de propaganda em rádio e TV para candidatos negros. Até agora, o placar é de dois votos favoráveis à ação. A data prevista para a retomada da discussão é quinta-feira, 20.

Resultado de consulta ao TSE feita pela deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ), a proposta obriga partidos a destinarem proporcionalmente verba oriunda do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (FEFC) e do fundo partidário para postulantes pretos.

Presidente do TSE e favorável à adoção do mecanismo, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou, na sessão de 30 de junho, que "o racismo brasileiro é estrutural" e que "isso significa que, mais do que um problema individual, está inserido nas estruturas políticas, sociais e econômicas e no funcionamento das instituições".

"Sob o prisma da igualdade", prosseguiu Barroso, "há um dever de integração dos negros em espaços de poder, noção que é potencializada no caso dos parlamentos".

Nas eleições de 2018, citou o magistrado, 47,6% dos concorrentes a vagas de deputado federal ou senador eram negros, mas somente 27,9% se elegeram, associando o baixo índice à falta de investimento.

O POVO conversou com dirigentes partidários e parlamentares cearenses da direita à esquerda. De modo geral, as legendas celebram as possíveis mudanças na legislação eleitoral, mas ponderam sobre o tempo para que se adaptem.

À frente do PSB no Ceará, o deputado federal Dênis Bezerra avalia que esse instrumento "é fundamental para incluir e ampliar a participação dos negros na política, da mesma forma que hoje se potencializam as candidaturas das mulheres".

Bezerra pontua, no entanto, que "nem os partidos e nem a população se prepararam para esse processo com essa condição, podendo criar distorções" caso se implemente em 2020. Em seguida, defende a ampliação da reserva também "para outras minorias, como a comunidade LGBTQIA , deficientes físicos", com "regras claras, objetivas e com debate amplo".

Presidente do PT em Fortaleza, o vereador Guilherme Sampaio considera que a discussão no TSE "abre espaço de reflexão e poderá resultar numa modulação que represente avanço no combate ao racismo, também no âmbito da legislação eleitoral".

Questionado sobre a decisão que pode resultar na reserva de recursos para negros, Capitão Wagner, deputado federal e presidente do Pros no estado, respondeu: "Sou a favor de tratamento igualitário para todos".

Colega de Wagner na Câmara dos Deputados, Heitor Freire (PSL) criticou a alteração proposta na ação sob relatoria de Barroso. Dirigente no Ceará da sigla que já abrigou Jair Bolsonaro, hoje sem partido, Freire disse que se o TSE "criar cada vez mais regras para as candidaturas, esse processo vai acabar perdendo a sua naturalidade, visto que isso vai pressionar os partidos a procurarem candidatos sem interesses políticos, apenas para preenchimento das diversas cotas".

Cientista político e professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Emanuel Freitas entende, porém, que não se trata de criar barreiras, mas assegurar condições de igualdade na disputa.

"É mais uma legislação que pretende corrigir problemas estruturais da sociedade brasileira, como anteriormente havia sido a regra em torno de candidaturas de gênero", explicou.

 

Ponto de vista

André Costa: Reserva de recursos é decisão justa, adequada e necessária

O julgamento pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) da consulta eleitoral sobre reserva de vagas, recursos financeiros e tempo de TV e rádio na propaganda eleitoral para candidaturas negras (pretas e pardas) recoloca na ordem do dia o debate sobre a sub-representação de pessoas negras no espaço de poder e de decisão e sobre o subfinanciamento de suas campanhas eleitorais.

Decorridos mais de 132 anos da antiabolição da população negra, a relação entre escravidão e racismo são evidentes, pois esta tragédia social não apenas perpetua as relações de desigualdades econômicas entre negros e brancos, mas também ocupa o imaginário nacional, determina o comportamento de grande parcela dos brasileiros e naturaliza a ausência de pessoas negras nos poderes públicos.

A adoção de ações afirmativas – medidas públicas ou privadas especiais, temporárias e compensatórias para minimizar as desigualdades causadas pelo racismo institucional e pelo racismo estrutural –, na modalidade de cotas, é necessária e imprescindível para inclusão da população negra na educação superior e no mercado de trabalho, mas também para aumentar a sua representatividade nos parlamentos.

Não tenho dúvidas de que a fixação de cota racial para pessoas negras nos órgãos partidários, nas campanhas eleitorais e nos parlamentos, bem como na distribuição dos recursos dos fundos partidário e de financiamento de campanhas e no direito de antena, é uma decisão justa, adequada e necessária e, em alguns anos, mudará a composição dos poderes legislativos.

André Costa é advogado especializado em Direitos Políticos e no Direito Eleitoral, conselheiro federal da OAB e presidente do Instituto Cearense de Direito Eleitoral

 

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