Por 4 votos a 1, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve decisão liminar que assegurava acesso a mensagens do ex-juiz Sergio Moro e de procuradores da Operação da Lava Jato ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A ação, apresentada por grupo de procuradores encabeçado por Deltan Dallagnol, ex-coordenador da força-tarefa de Curitiba, pleiteava que a Corte impedisse que a defesa do petista fizesse uso desse conteúdo, apreendido durante a Operação Spoofing e ao qual teve acesso após decisão provisória de janeiro passado.
Votaram contra o recurso os ministros Ricardo Lewandowski, Nunes Marques, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes, presidente do colegiado. Relator da Lava Jato, Edson Fachin foi o único a se manter contra a disponibilização das mensagens.
Em seu voto, Lewandowski disse que é “extremamente grave e impactante o que veio à tona (nas conversas) e que deve causar perplexidade em todos aqueles com mínimo conhecimento do que seja o devido processo legal”.
Em seguida, o magistrado afirmou, contudo, que não se detinha no mérito, mas que concedia “à defesa que tivesse acesso a elementos de convicção que estavam em poder do Estado e que se encontravam no bojo de uma ação penal na qual os tais hackers foram condenados, com base inclusive numa primeira perícia no material arrecadado”.
Por esses diálogos, postula a defesa de Lula, estaria caracterizada uma colaboração entre juiz e procuradores que extrapola o campo legal e vicia o processo, que acabou por condenar Lula no caso do tríplex do Guarujá – o petista também foi alvo de condenação no inquérito do sítio de Atibaia.
Indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) a uma vaga no STF, Nunes Marques também ressaltou que não se tratava, ali, de fazer “qualquer juízo de mérito acerca da validade ou autenticidade do material coletado na operação”.
“Limito-me”, continuou Marques, “nos precisos termos do voto do ministro relator, a conferir acesso à defesa do reclamante ao referido material, permitindo, assim, o fiel cumprimento da decisão”.
Mendes, que é relator do pedido de suspeição de Moro, expôs que “a breve análise dos diálogos sugere que a falta de acesso a eles pode ter afetado o direito de defesa do paciente (Lula) e de outros pacientes” e que, “por isso, é de rigor o reconhecimento do direito de acesso”.
O magistrado acrescentou, em tom incisivo: “Ou nós estamos diante de ficção, ou nós estamos diante de um caso extravagante. É o maior escândalo judicial da história da humanidade, é disso que estamos falando. A ‘República de Curitiba’ envergonha os sistemas totalitários, eles não tiveram tanta criatividade”.
A decisão do Supremo abre caminho para que Lula possa robustecer a tese da defesa, segundo a qual o então juiz Sergio Moro agiu parcialmente no seu julgamento. Essa ação deve ser analisada pela STF no início de março, sugeriu Gilmar Mendes.
Vice-presidente do diretório nacional do PT, o deputado federal José Guimarães festejou o resultado. “Temos que comemorar não simplesmente porque a Justiça está sendo feita com o ex-presidente, mas sobretudo porque o STF chama o feito à ordem e diz para o Brasil que ninguém está acima da lei, nem procurador nem juiz nem ninguém”, avaliou.
Para o petista, a rejeição do recurso dos procuradores é importante “para repor a verdade e o país conhecer as arbitrariedades que Moro cometeu no comando da Lava Jato”, garantindo a sua suspeição.
Entusiasta da Lava Jato, o procurador Fredy Bezerra de Menezes classifica a decisão como “absurda”. “Qual o sentido de, mesmo sem saber se as mensagens vão poder ter validade de prova, liberar o acesso? E, ao mesmo tempo, olha o precedente que vai causar se disser que mensagens roubadas podem ser validadas num processo judicial”, questiona.