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Enfraquecido politicamente, impopular e com saúde frágil, Lula tentará reeleição?
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Enfraquecido politicamente, impopular e com saúde frágil, Lula tentará reeleição?

Decisão sobre reeleição dependerá de saúde, economia e reconstrução da base aliada
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Presidente Lula acena ao chegar à cerimônia de anúncio da solução habitacional para os moradores da favela do Moinho, em São Paulo, em 26 de junho de 2025 (Foto: NELSON ALMEIDA / AFP)
Foto: NELSON ALMEIDA / AFP Presidente Lula acena ao chegar à cerimônia de anúncio da solução habitacional para os moradores da favela do Moinho, em São Paulo, em 26 de junho de 2025

Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já deixou claro, mesmo que ainda informalmente, que pretende disputar a reeleição em 2026. “Podem ter certeza de uma coisa: se eu estiver bonitão do jeito que estou, apaixonado do jeito que estou e motivado do jeito que estou, a extrema direita não volta a governar esse país”, afirmou no início de junho durante Congresso Nacional do PSB.

Diferentemente de 2006, quando buscava o segundo mandato com aprovação de mais da metade dos eleitores, Lula hoje lidera um governo que enfrenta dificuldades de articulação no Congresso, críticas à condução econômica e crescente desgaste popular. Apesar disso, no campo da esquerda, o petista ainda é visto como única opção viável para a Presidência em 2026.

“O presidente Lula é a liderança mais competente, habilidosa e experiente da esquerda brasileira”, afirma o ex-deputado Artur Bruno (PT), ao reforçar que o nome do presidente permanece como único com musculatura eleitoral e política dentro do PT para disputar o Planalto.

A cientista política Luciana Santana concorda: “Para 2026, acho muito difícil que tenha algum outro nome viável do PT. E teria que ser um plano muito bem estruturado. O principal nome que eu viria é (Fernando) Haddad, mas ele está saturado com essas temáticas e ações na área econômica, acho muito difícil. (...) Ao meu ver, acho que a população não o elegeria hoje. E é preciso amadurecer no sentido de dar espaço a outros parceiros políticos”, explica.

O ministro da Educação, Camilo Santana (PT)(Foto: Fabio Lima/ OPOVO)
Foto: Fabio Lima/ OPOVO O ministro da Educação, Camilo Santana (PT)

Luciana menciona o ministro da Educação, Camilo Santana (PT). O presidente afirmou que, se ele não estiver bem de saúde, não deve ser candidato e lançar o nome de um aliado. Como informado na coluna do jornalista do O POVO João Paulo Biage, a oportunidade de candidatura presidencial surge para Camilo. Cogita-se que, a pedido de Lula, Camilo deve se desincompatibilizar em abril do ano que vem para ficar à disposição.

Segundo Luciana, mesmo ocupando o cargo de ministro, Camilo ainda não possui a visibilidade necessária. “Se eu vou a Minas Gerais e falo do Camilo Santana, ninguém conhece. Ele é regionalmente conhecido, mas nacionalmente não tem alcance. Isso vale para outros nomes tradicionais da esquerda”, completa.

O ex-deputado Carlos Matos (União Brasil) considera que uma nova candidatura de Lula sinalizaria uma crise na renovação política. “Seria um grande fracasso do PT, de um partido grande e estruturado, não ter capacidade de formar lideranças novas. E a idade é um fator preponderante. Um país jovem como o Brasil precisa de vigor físico, mental e intelectual. Tem hora que a idade já não permite isso”, afirma.

Aos 81 anos em 2026, Lula enfrentará não apenas o desafio de governar com um Legislativo fragmentado e forças conservadoras mobilizadas, mas também o peso da cobrança por renovação política. Ainda assim, a ausência de nomes competitivos à esquerda mantém o petista como figura central nas projeções para o próximo pleito.

Enquanto a oposição se articula e o governo tenta recuperar terreno na popularidade, o próprio Lula se coloca como barreira à volta da extrema direita. E, até aqui, o PT não sinaliza alternativa viável.

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É de se imaginar que, após mais de 10 anos no comando do País, a experiência acumulada tornaria o ato de governar mais fácil. No entanto, assim como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) retornou amadurecido ao Palácio do Planalto, o Brasil o recebeu mais exigente e dividido.

“Não existem dois Brasis. Somos um único país, um único povo, uma grande nação", discursou Lula ao sair vitorioso no segundo turno das eleições de 2022.

Mesmo com o desemprego caindo para 6,2% no trimestre favereiro-abril-maio — patamar mais baixo desde 2012 — apostas de retomada do programa Minha Casa, Minha Vida e no Bolsa Família, a popularidade do presidente continua decaindo.

Em 2006, ao fim do primeiro mandato presidencial, Lula registrava cerca de 52% de avaliação positiva, segundo o Datafolha, apesar do mensalão. Ao final do segundo mandato, em dezembro de 2010, ele alcançou 83% de ótimo e bom no Datafolha, o melhor desempenho de um presidente na história. Na pesquisa mais recente do instituto, ele teve 28% de ótimo e bom, frente a 40% de ruim e péssimo.

Apesar de ser um político com trajetória consolidada e considerado um dos principais operadores políticos do Brasil, o petista enfrenta hoje um cenário institucional e social completamente distinto dos contextos de seus primeiros mandatos.

Segundo a cientista política Luciana Santana, o Brasil passou por uma mudança tanto contextual, quanto institucional. Em relação ao contexto brasileiro, as condições de governança já não são as mesmas.

“Nos dois primeiros governos, ele conseguiu, mesmo em meio a crises políticas, como a do mensalão, garantir uma maioria legislativa no parlamento e, por meio do presidencialismo de coalizão, havia uma garantia para que ele pudesse levar adiante seu governo“, explica.

Luciana destaca que, após o processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT), em 2016, houve uma mudança no contexto brasileiro. “Mas especialmente uma mudança institucional, que é uma fragilização do presidente como a instituição, ou seja, do Executivo diante do Legislativo“, acrescenta.

Depois de três presidentes, a explosão das redes sociais, uma pandemia e o advento de um novo antagonismo político, essa fragilização institucional pode ser justificada em alguns aspectos.

O Congresso Nacional tem o histórico de ser centro-direita, porém, nas últimas eleições, houve o aumento de parlamentares da extrema direita, associados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Em 2022, o Partido Liberal, principal adversário do governo e que já era o maior partido na Câmara, elegeu 99 deputados federais, 23 assentos a mais do que nas eleições anteriores. “Negociar com esses parlamentares é praticamente impossível”, afirma Luciana Santana.

Já os parlamentares que ocupam o espaço de centro-direita no Congresso "têm outros trunfos para barganhar". "Hoje eles vêm tendo poder sobre o orçamento, que é muito mais atrativo do que ter um ministério nas mãos, por exemplo", destaca.

“Hoje o mais desafiador pro governo, mais do que a extrema direita, é lidar com essa nova configuração de força que está na mão desse centrão que não vê mais atrativo ser governo, mas poder ditar as regras do jogo”, explica Luciana.

Antes da Emenda Constitucional nº 86, de 2015, os parlamentares definiam para onde as emendas deveriam ir e o Executivo avaliava se deveria ou não executá-la. A aprovação da EC 86/2015 tornou obrigatória a execução de parte da programação orçamentária, focando nas emendas individuais apresentadas pelos parlamentares.

O ex-deputado e professor Artur Bruno (PT) lamenta que os governos anteriores “se dobraram aos interesses paroquiais de muitos congressistas”. Para ele, é “inadmissível” o Legislativo ter mais poder do que o Executivo.

“O parlamento ter mais poder hoje do que o próprio Executivo é inadmissível em um país presidencialista como o Brasil. Fui deputado federal de 2011 a 2014. Naquela época, cada deputado federal tinha R$ 15 milhões de emendas. Hoje são R$ 38 milhões de emendas impositivas, sem se falar em emendas de bancada, de comissões. O parlamento está exacerbadamente grande, é desigual hoje a relação do Executivo com o Legislativo”, afirma.

Bruno, porém, reconhece falhas na comunicação. “Comunicação hoje exige muita agilidade, criatividade e simplicidade, comunicação mais direta numa linguagem mais simples. Então, o governo tem tentado recuperar isso”, reconhece o ex-deputado.

Sobre a ação do governo nas redes sociais, Luciana Santana acredita que a gestão tem erros inegáveis que, inclusive, impactaram a avaliação da população. “Desde o ano passado, com a questão do Pix, são vários episódios, vários fatos que o governo não conseguiu responder. Não tinha ali um plano emergencial para saber lidar, e mesmo trocando a comunicação, ainda não conseguiu calibrar”, afirma.

Por outro lado, Carlos Matos, ex-deputado estadual pelo PSDB e atualmente filiado ao União Brasil, enfatiza a perda da capacidade de diálogo e de formação de coalizões nacionais no governo atual, diferentemente do primeiro mandato de Lula.

Matos considera que o terceiro mandato do petista age de forma "desesperada" ao tentar "polarizar com a luta de classes", o que não contribui para a busca de soluções conjuntas.

"Hoje aquele Lula que era respeitado, admirado e que conseguia dialogar com as diferentes forças, parece que desapareceu. Surgiu um Lula enfraquecido e irritado, com pouca capacidade de diálogo e sem um time à altura para poder governar o país", afirma.

Segundo ele, o presidente Lula do primeiro mandato tinha o foco mais voltado para a coalizão nacional, "com capacidade de diálogo e de continuar um projeto que havia sido muito bem formulado pelo PSDB e que ele teve a inteligência de não destruí-lo".

"Depois, a com a Dilma Rousseff já deu para sentir que o projeto deixou de ser um projeto nacional para ser um projeto petista e foi demonstrando a própria incapacidade de dialogar com o Congresso, e isso agora volta com toda força", destaca o ex-deputado.

A promessa de unidade no discurso após o segundo turno vai de encontro, agora anos depois, a um Brasil ainda polarizado, a dificuldades de se comunicar e administrar conflitos com uma base legislativa fragmentada e com uma oposição fortalecida.

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