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Redes "sem lei" proporcionam compartilhamento de pornografia infantil
Reportagem

Redes "sem lei" proporcionam compartilhamento de pornografia infantil

| EXPLORAÇÃO SEXUAL | Operação Luz na Infância, do Ministério da Justiça, vem, desde 2017, combatendo conteúdo criminoso em redes "P2P". Pelo menos 15 pessoas já foram presas no Ceará
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girl looking at red balloon floating coming out of television on dark background, digital art style, illustration painting (Foto: Getty Images/iStockphoto)
Foto: Getty Images/iStockphoto girl looking at red balloon floating coming out of television on dark background, digital art style, illustration painting

Redes definidas como "terra de ninguém" são alguns dos espaços mais prodigiosos para um crime que, como poucos, choca a sociedade e flagela vítimas: a pornografia infantil. As redes peer to peer (P2P) são qualificadas como "sem controle" pelo próprio Laboratório de Inteligência Cibernética (Ciberlab), da Secretaria de Operações Integradas (Seopi), do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP). O termo consta em relatório do Ciberlab que embasou a última fase da operação Luz na Infância, que, desde 2017, vem combatendo o compartilhamento de pornografia infantil nesses espaços.

Já foram cinco fases da força-tarefa — a mais recente em 4 de setembro. Naquela ocasião, cinco mandados judiciais foram cumpridos no Estado, sendo três de busca e apreensão e dois de prisão preventiva. Ao todo, a quinta fase da operação teve como alvo 105 mandados de busca e apreensão, no Brasil e em mais 6 países.

O relatório 05/2019 Ciberlab/Diop/Seopi/MJSP, ao qual O POVO teve acesso, cita que, após a CPI da Pedofilia, de 2012, portais e buscadores se comprometeram a retirar dos resultados de pesquisa palavras-chave ligadas à pornografia infantil. No entanto, esse conteúdo ainda está disponível na internet não-indexada nos buscadores usuais, a chamada Deep Web. E também na redes P2P.

É destacado que neste tipo de sub-rede não há um servidor geral que armazene os arquivos e/ou conecte os usuários. São os internautas que disponibilizam acesso aos seus arquivos para a busca de outros usuários, que podem, então, fazer o download. "Não há controle. Não tem como 'derrubar' uma rede P2P, pois cada peer (nó ou ponto) é um computador comum localizado em alguma parte do mundo preparado para compartilhar algum tipo de arquivo", diz o documento.

Desde 2017, é nesse tipo de rede que a Luz na Infância foca para capturar criminosos sexuais. No Ceará, somente em flagrante, foram 15 prisões. Os nomes dos autuados não foram divulgados pela Polícia e os casos costumam transcorrer em segredo de Justiça. O POVO, no entanto, em consulta a tribunais superiores, encontrou alguns desses casos.

Na segunda fase da operação, ocorrida em maio de 2018, a Polícia prendeu, por exemplo Luis Ednilson Maciel Gonzaga, no bairro Cidade dos Funcionários. No cumprimento de mandado de busca e apreensão, os policiais encontraram no computador do autuado 21 vídeos e mais 79 imagens contendo pornografia infantil.

Na terceira fase, em novembro daquele ano, entre os cinco presos em flagrante, estava Fernando Benevides Militão. Conforme a acusação, ele manteve em seu computador múltiplos arquivos digitais contendo cenas de sexo explícito envolvendo crianças e adolescentes, baixados através do aplicativo de rede P2P Torrent. "Ao mesmo tempo em que agia dessa forma, Fernando Benevides compartilhou material pornográfico infanto-juvenil com terceiros desconhecidos."

O outro caso localizado pela reportagem é da quarta fase, de março deste ano. Tarick Sampaio Sousa foi preso em flagrante quando, em cumprimento de mandado de busca e apreensão no trabalho dele, no bairro Aldeota, foram localizados, em um pen drive, vídeos envolvendo pornografia com crianças e adolescente. A suspeita é de que material pedófilo era compartilhado pelo aplicativo UTorrent. Em todo o Brasil, mais de 540 pessoas foram presas em flagrante somente nas quatro primeiras fases da operação.

Apesar da falta de controle nessas redes, o MJSP desenvolveu técnica que permite a responsabilização de quem compartilha o material criminoso. Com auxílio de um software específico, que opera como se fosse um cliente P2P qualquer. O programa faz pesquisas 24 horas por dia de palavras-chaves de material criminoso. Ao compartilhar um arquivo com um internauta, a pessoa tem acesso ao IP (Endereço de Protocolo da Internet) desta outra. O software, então, gera uma lista dos IPs que baixam material criminoso. A partir disso, a Polícia solicita ao provedor de internet o endereço do titular do plano de internet cuja rede fez o download.

Com esse procedimento, a Luz na Infância localizou, no início do mês, dois endereços onde haveria compartilhamento de pornografia infantil, nos bairros Cidade dos Funcionários e Jóquei Clube.

Oito passos para identificar vítimas de abuso sexual infantil, por Interpol

1º Criança é abusada

2º Fotos ou vídeos são feitos pelo agressor documentando o abuso

3º Material criminoso é divulgado na internet

4º Material é descoberto pela Polícia

5º Polícia registra material criminoso no banco de dados da Interpol, compara os dados apreendidos e pede auxílio a polícias de outros países

6º A rede de especialistas analisa todas as pistas disponíveis no conteúdo criminoso

7º Crianças e/ou agressores são identificados

8º Criança é retirada da situação de abuso e agressor é preso

Fonte: Safernet Brasil

 

Fases da Operação Luz na Infância

LUZ NA INFÂNCIA 1 — 20 DE OUTUBRO DE 2017

Ceará: Quatro mandados de busca e apreensão e duas pessoas presas em flagrante.

Brasil: 157 mandados de busca e apreensão e 108 pessoas presas em flagrante.

Luz na Infância 2 — 17 de maio de 2018

Ceará: 16 mandados de busca e apreensão e seis pessoas presas.

Brasil: 579 mandados de busca e apreensão e 251 pessoas presas em flagrante.

Luz na Infância 3 — 22 de novembro de 2018

Ceará: Um mandado de busca e apreensão e cinco pessoas presas em flagrante.

Brasil: 110 mandados de busca e apreensão e 46 pessoas presas em flagrante.

Luz na Infância 4 - 28 de março de 2019

Ceará: Quatro mandados de busca e apreensão e uma pessoa presa em flagrante.

Brasil: 266 mandados de busca e apreensão e 141 pessoas presas em flagrante.

Luz na Infância 5 - 4 de setembro de 2019

Ceará: Três mandados de busca e apreensão e uma pessoa presa em flagrante.

Brasil: 105 mandados de busca e apreensão e 51 pessoas presas em flagrante.

O POVO solicitou à SSPDS balanço de quantos indiciamentos os inquéritos geraram, para além das prisões em flagrante, mas não obteve resposta até o fechamento desta matéria.

 

Denuncie

Conteúdo criminoso na Internet pode ser denunciado ao Safernet, que mantém, há 14 anos, canal de denúncia em parceria com o Ministério Público Federal:

https://new.safernet.org.br/denuncie

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