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Pague 4, leve 3: como consumidores e empresas encaram a reduflação
Reportagem

Pague 4, leve 3: como consumidores e empresas encaram a reduflação

| PRESSÃO INFLACIONÁRIA| Redução na quantidade ou alteração na composição de produtos acompanha tendência de alta generalizada de preços e leva a mudanças de hábitos na hora de ir às compras
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Consumidores se deparam nas gôndolas com produtos diminuindo de tamanho mas mantendo ou aumentando o preço (Foto: fotos Aurelio Alves)
Foto: fotos Aurelio Alves Consumidores se deparam nas gôndolas com produtos diminuindo de tamanho mas mantendo ou aumentando o preço

Sabe aquele pacote de biscoito de 150 gramas que diminuiu para 130 gramas? Ou aquele sachê de sabão líquido de litro que agora você encontra em embalagens de 900 gramas?

Não reparou a mudança? Mas, provavelmente, você já notou que itens como pães, biscoitos, achocolatados e até produtos de limpeza têm durado menos e a necessidade de voltar ao supermercado para repor tem aumentado. Isso tudo sem sentir nenhum alívio no bolso ao fim do mês.

Esse fenômeno tem nome e os economistas chamam de reduflação (redução + inflação). É quando a quantidade de determinado produto é reduzida ou, mesmo, a composição dele é alterada, normalmente com a retirada de um insumo mais caro por outro mais barato.

Reduflação: como o consumidor percebe na prática

Pacote de leite em pó também teve volume de produto reduzido(Foto: Aurelio Alves)
Foto: Aurelio Alves Pacote de leite em pó também teve volume de produto reduzido

E a enfermeira Regislane Costa, de 43 anos, que vai bastante ao supermercado, tem percebido. Ela tem entre os seus produtos preferidos uma marca de leite em pó.

Costumava comprar o item em uma embalagem de 800 gramas, mas recentemente se deu conta de que a quantidade dele havia sido reduzida para 750 gramas.

“A gente tem que prestar muita atenção para perceber. Eu só vi porque sempre compro leite integral e quando fui olhar se era integral ou instantâneo vi no cantinho do rótulo que tinha diminuído em 50 gramas”, lembra.

Outro produto que Regislane costuma comprar bastante e que ela percebeu redução na quantidade foram as polpas de frutas, que não tiveram alteração no preço, contudo.

“A polpa diminuiu bastante. O suquinho que vinha com 200 ml agora vem até com 160 ml, mas continua valendo R$ 2 a unidade”, cita.

O mesmo ela diz ter observado em bandejas de frango e ovos. E, por falar em produtos de origem animal, além de consumir menos em quantidade, alguns itens como a carne bovina foram praticamente cortados do carrinho de compras da enfermeira devido aos altos preços.

Diminuição na quantidade e alta nos preços

Biscoito de chocolate sofreu redução de 20 gramas e mostra mudança em letreiro na embalagem(Foto: Aurelio Alves)
Foto: Aurelio Alves Biscoito de chocolate sofreu redução de 20 gramas e mostra mudança em letreiro na embalagem

Para o supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) no Ceará, Reginaldo Aguiar, não há coincidência entre as alterações na quantidade de produtos e alta de preços.

“A reduflação não é exatamente uma novidade, mas uma prática danosa e desrespeitosa, recorrente em outros momentos de pressão inflacionária ao longo da história do Brasil. Ela aconteceu pouco antes da implantação do Plano Real e a gente vê ela voltar agora de forma mais generalizada. O consumidor mais desatento acaba sendo enganado, mas nós que calculamos os índices de inflação temos mecanismos para checar esse tipo de impacto na economia”, ressalta.

Inflação: como vão ficar os preços

Apesar de ainda alta, mercado prevê que inflação deve desacelerar até o fim deste ano(Foto: Aurelio Alves)
Foto: Aurelio Alves Apesar de ainda alta, mercado prevê que inflação deve desacelerar até o fim deste ano

Vale lembrar que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2021, indicador mais utilizado para aferir a inflação, fechou em 10,06%, o maior patamar desde 2015, e quase duas vezes acima do teto da meta inflacionária estabelecida pelo Banco Central no ano passado, que era de 5,25%.

Já o IPCA de maio deste ano, índice mais recentemente divulgado apontou uma inflação acumulada nos últimos 12 meses, ainda maior, de 11,73%. Mas a previsão do mercado para 2022 é de que esse número desaclere e feche em 8,89%.

Especificamente a Grande Fortaleza, a escalada de preços de produtos, alimentos e serviços computa alta de 1,41% no mês de maio de 2022.

Percentual representa quase o triplo da média nacional (0,47%) para o período e é o maior registrado em todo o Brasil.

Reduflação: o processo de adequação das empresas

Embalagens mostram que houve redução de quantidades(Foto: Aurelio Alves)
Foto: Aurelio Alves Embalagens mostram que houve redução de quantidades

Nesse cenário, Davi Azim, que integra o Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE), afirma que o processo de reduflação funciona como uma espécie de adequação dos agentes econômicos para fazer frente à inflação elevada.

“Eu encaro isso como um posicionamento estratégico das empresas que precisam ter um nível de produção para ter lucratividade, acompanhada de uma propensão maior do consumidor em aceitar reduzir um pouco o consumo para continuar tendo acesso a determinados produtos”, analisa.

O economista e conselheiro do Corecon-CE acrescenta que “a escalada da inflação onera as empresas, ao mesmo tempo em que gera uma perda do poder aquisitivo dos consumidores. Muitas empresas visualizaram isso e, reduzindo a quantidade de certos produtos, conseguiram readequar seus respectivos processos produtivos e estoques.”

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FORTALEZA, CE, BRASIL, 08-06.2022: Douglas Sales, jornalista, 24 anos. reportagem sobre Reduflação, produtos que tiveram alteração na quantidade vendida, mas sem alteração no valor e ate com aumento dos preços. em epoca de COVID-19. (Foto:Aurelio Alves/ Jornal O POVO)
FORTALEZA, CE, BRASIL, 08-06.2022: Douglas Sales, jornalista, 24 anos. reportagem sobre Reduflação, produtos que tiveram alteração na quantidade vendida, mas sem alteração no valor e ate com aumento dos preços. em epoca de COVID-19. (Foto:Aurelio Alves/ Jornal O POVO)

Redução que afeta o orçamento

O jornalista Douglas Sales, de 24 anos, já vinha percebendo a redução na quantidade de alguns de seus produtos preferidos, mas não tinha conhecimento sobre a obrigação legal das marcas de informar essas alterações.

"Eu nunca tinha percebido um produto em que havia essa informação de ter menos, mas um biscoito que eu comprava e vinha com quatro pacotinhos passou a vir com apenas três. O mesmo aconteceu com uma pasta de amendoim que eu comprava. Eles faziam estilo compre 4 e pague 3, mas retiraram a que era, digamos assim gratuita, mantendo o mesmo preço de antes. Também notei que as barras de chocolate ficaram menores", relata.

Douglas afirma que esse tipo de prática afeta o orçamento de qualquer consumidor. "A inflação no Brasil está um absurdo. É inadmissível que a gente continue assim. Eu faço parte de uma classe média que tem privilégios e pode optar por comprar algo mais caro do mesmo jeito, mas têm muitas pessoas que não conseguem. Ainda assim, já precisei reduzir o meu consumo de alguns produtos. Hoje, por exemplo, eu levo metade da quantidade de leite de coco que eu levava antes", exemplifica.

O consumidor e a reduflação

- 79,1% notaram que a quantidade em produtos embalados tem sido reduzida

- 90,3% percebem a redução na hora da compra

- 32,2% observam o fenômeno há, pelo menos, um ano

- 61% dizem que a redução na quantidade do produto veio com aumento de preço

Mas afinal o que é reduflação

É quando produtos, principalmente os vendidos embalados, diminuem de tamanho ou quantidade, enquanto o preço se mantém o mesmo ou até aumenta de valor.

Mais recentemente, a reduflação no Brasil também tem sido marcada pela substituição de um ingrediente ou componente de determinado produto por outro mais barato.

O fenômeno acontece associado a um processo de aumento generalizado de preços, perda do poder aquisitivo e falta de insumos.

O que diz a Portaria 392/2021

O fabricante é obrigado a informar as seguintes mudanças nos rótulos dos produtos em todo do País:

1. Alteração na quantidade do produto
2. Quantidade de produto que existia antes da mudança
3. Quantidade de produto que passa a ser vendida após a alteração
4. Quantidade e o percentual do produto que foram alterados

Os rótulos devem mostrar as mudanças seguindo as devidas normas:

1. Com letras em caixa alta (maiúsculas)
2. Em negrito
3. Em cor que contraste com o fundo do rótulo
4. Com altura mínima de 2 milímetros, no caso de embalagens com área igual ou superior a 100 cm², e de 1 milímetro nas embalagens menores

O que diz a Lei do Preço Claro

Os supermercados de todo o Ceará são obrigados a informar nas etiquetas das prateleiras, além do valor do produto, o preço por unidade de medida (quilo, litro ou metro).

Como denunciar práticas abusivas

Caso o consumidor perceba desrespeito à legislação que regula as informações sobre mudanças na quantidade ou composição de produtos ou desconfie da prática de propaganda enganosa deve procurar os órgãos de defesa do consumidor de seu município, estado ou de caráter nacional.

No caso de Fortaleza, ele deve procurar o Procon pelos seguintes canais de atendimento:

1. Pela central telefônica de atendimento, por meio do número 151
2. Pela página do Procon Fortaleza 
3. De forma presencial, mediante agendamento 

Sanções

Caso seja comprovada a prática abusiva, a empresa pode ser condenada a:

1. Pagar multa de até R$ 15 milhões
2. Ter o produto recolhido
3. Sofrer embargo ou interdição
4. E até ter o alvará cassado, a depender da gravidade da infração

FONTES: Reclame Aqui/Wikipedia/Governo Federal/Governo do Estado do Ceará/Procon Fortaleza

Opção?

Os relatos ao O POVO é que nem sempre a troca de marca também está favorável.

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