Nos últimos meses, o Ceará foi cenário de acidentes envolvendo turistas em alguns dos principais pontos turísticos do Estado. Em 2022, até o momento, conforme levantamento feito pelo O POVO, foram registrados pelo menos seis casos, resultando em cinco óbitos.
O cenário acende um alerta e chama atenção, principalmente para órgãos responsáveis pela regulação do setor. Há uma pedida para fortalecer a fiscalização do turismo em busca de maior segurança para quem procura o Estado para tirar férias e também por quem depende do turismo como fonte de renda.
Neste ano, entre os casos registrados, o mais recente aconteceu no dia 17 de outubro em Camocim, a 357 quilômetros de Fortaleza. Um veículo que passeava com um grupo de pessoas de Mato Grosso (MT) sobre a Duna do Guriú, que foi caracterizada pela Secretaria Municipal de Turismo como "duna perigosa". Um vídeo, recebido pelo WhatsApp, mostra o veículo momentos antes do acidente atolado no topo da duna.
O carro capotou. Duas pessoas morreram em decorrência do acidente e outras quatro saíram feridas. A vítima mais recente faleceu na última quarta-feira, 2 de novembro. Ela foi identificada como Mayra Bianca Gomes, 28, e estava internada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) da Santa Casa de Misericórdia de Sobral. A primeira turista vítima veio a óbito ainda no local no dia do acidente. Ela foi identificada como Danúbia Daiane Reis, de 36 anos. As outras quatro pessoas envolvidas no acidente seguem internadas na Santa Casa de Sobral.
De acordo com o presidente da Associação Brasileira de Agências de Viagens do Ceará (Abav/Ce), Murilo Santa Cruz, o cenário é visto com bastante preocupação. Segundo ele, faz falta um reordenamento no turismo no Estado e há lacunas em políticas públicas para solucionar o problema. Murilo aponta que, atualmente, o turismo está sendo tratado como “um produto em que qualquer um pode chegar e se intitular guia de turismo”.
O motorista que dirigia o carro envolvido no acidente em Camocim, era um adolescente de 15 anos que, além de não poder dirigir por ser menor de idade, não tinha autorização para trafegar na região. O POVO chegou a procurar o secretário municipal do Turismo, Ricardo Vasconcelos, por ligações e contato por meio das redes sociais, para falar sobre o caso, mas não recebeu retorno até a publicação desta reportagem.
“Pessoas desabilitadas fazendo papel de guia de turismo e agentes de viagens e colocando o bem maior do Estado, que são nossos visitantes, em risco. Esse não foi o primeiro caso e, talvez, não será o último acidente. Tem que ter uma fiscalização da operacionalização do turismo no Estado”, alerta o presidente da Abav.
Ainda conforme o levantamento, no mês de outubro, outro acidente levou o Ceará às pautas nacionais. Um turista, identificado como Sérgio Murilo, de 39 anos, de Belém, no Pará, morreu após a viga de sustentação de uma tirolesa em Canoa Quebrada, em Aracati, a 147 quilômetros de Fortaleza, se romper. O caso foi registrado no dia 10 de outubro e aconteceu durante um passeio pelas dunas da praia.
No primeiro semestre do ano, foram contabilizados dois casos. Os episódios aconteceram no dia 1º de maio, quando um turista de Pernambuco morreu afogado na praia de Jericoacoara, em Jijoca de Jericocoara, no litoral Oeste do Ceará. No caso, uma médica que estava no local chegou a dar os primeiros socorros, mas o homem, identificado como Rafael Antônio de Oliveira, de 30 anos, não resistiu.
O primeiro óbito envolvendo turista foi registrado quase dois meses antes. No dia 21 de março, um turista de Guarujá, de São Paulo, morreu afogado no Buraco Azul de Caiçara, em Cruz, a 243 quilômetros de Fortaleza. A vítima foi um homem, identificado como Uilgner Rodrigues, que ficou cerca de 30 minutos embaixo d'água enquanto salva-vidas e outros visitantes tentavam resgatá-lo.
Ainda durante março, um turista do Rio de Janeiro caiu de uma tirolesa, na praia da Tatajuba, em Camocim, no dia 21, após o cabo de aço do equipamento romper. Ele foi salvo, mas teve várias vértebras fraturadas.
Um dia depois, três pessoas ficaram feridas em um acidente com um buggy, na praia do Cumbuco, em Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). O veículo levava cinco pessoas quando capotou e deixou uma adolescente de 14 anos com fratura na perna e uma criança de 9 anos e um adulto com lesões leves. Não foi registrado nenhum óbito nesse caso.
O POVO solicitou à Secretaria de Segurança Pública do Ceará (SSPDS) no dia 20 de outubro, por e-mail, um levantamento de quantos acidentes envolvendo turistas no Ceará, no qual deixaram vítimas fatais, foram registrados de 2019 a 2022 e quais localidades os acidentes aconteceram. A pasta não informou os dados até a publicação desta reportagem.
A Polícia Militar do Ceará (PM-CE) também foi procurada pelo O POVO, no dia 20 de outubro, mas informou, por e-mail, que os dados são a cargo da SSPDS.
Março
- Caucaia - Capotamento de buggy no Cumbuco; dois feridos
*- Cruz - Turista morreu afogado no Buraco Azul de Caiçara
- Camocim - Turista se machucou após rompimento de tirolesa em Tatajuba; em janeiro, guia também tinha se acidentado no local
Maio
*- Jijoca de Jericoacoara - Um homem morreu afogado na Praia de Jericoacoara
Outubro
*- Aracati - Um homem morreu após rompimento de tirolesa em Canoa Quebrada
*- Camocim - Duas mulheres morreram e quatro pessoas ficaram feridas em capotamento de veículo do Guriú
O Ceará, em julho deste ano, registrava cerca de 71.438 empresas que se encaixam em atividades turísticas. Entre os municípios que atuam fortemente no turismo, por meio da visitações de praias, lagos e dunas, estão Jijoca de Jericoacoara, Aracati, Camocim, Caucaia e Fortaleza. Nas regiões, é notável a presença de passeios de buggys entre dunas, transporte de passageiros por meio de caminhonetes e salto de tirolesas.
As atividades, no entanto, necessitam de uma fiscalização contínua para levar mais segurança a quem visita as regiões. O POVO procurou a Secretaria do Turismo do Ceará (Setur) nos dias 26 e 30 de outubro, por e-mail e mensagens em aplicativos, para falar sobre como ocorre a fiscalização nos pontos e atividades turísticas no Estado.
À pasta, foi solicitado ainda entrevista com o titular da Setur, Arialdo Pinho, para falar sobre o cenário dos acidentes e quais medidas poderiam ser tomadas sobre os casos. A Setur não respondeu nenhum dos questionamentos até a publicação desta reportagem.
Por meio do portal institucional do órgão, é informado que a pasta é responsável por coordenar, executar, fiscalizar e supervisionar as atividades pertinentes ao turismo no Ceará.
Ainda segundo o portal, a pasta também realiza a capacitação e qualificação do segmento envolvido com o turismo, articula a ampliação e manutenção da infraestrutura para o turismo, promove e consolida a imagem do Ceará como destino turístico.
O economista, professor e conselheiro do Conselho Regional de Economia (Corecon), Álvaro Carvalho, cita que os acidentes impactam o cenário do Ceará e que é necessária uma fiscalização “mais forte” para evitar um impacto maior. “No momento, esse impacto é pequeno, mas se não tivermos uma fiscalização bem forte, a gente pode perder turistas nacionais e internacionais na entrada do Ceará”, alerta.
Ainda segundo o economista, as fiscalizações estão associadas a verificação de tudo que envolve as atividades de turismo, principalmente os equipamentos utilizados pelo público visitante. “Tem que saber o peso relacionado à tirolesa, por exemplo, se tudo está correto, saber se a pessoa é um guia turístico cadastrado. A fiscalização tem que ser por completo do atrativo”, pontua.
A lista de bons motivos para procurar um ambiente para alguns dias de folga é infinita. Porém, é também extensa a quantidade de cuidados necessários ao se aventurar no turismo, seja ele qual for. O conselheiro do Coren também orienta que o turista também deve estar atento e seguir algumas orientações ao viajar.