A Polícia Federal (PF) deflagrou ontem operação que tinha como alvo seis mulheres acusadas de abusar sexualmente dos próprios filhos e produzir material pornográfico dos crimes para satisfazer a lascívia de um homem que haviam conhecido pela internet. Foi a primeira operação feita no Estado pela PF contra mulheres acusadas de abuso sexual de crianças na Internet.
Seis mulheres foram presas preventivamente por força de mandado, sendo que uma delas também foi alvo de uma medida cautelar de afastamento do lar. A Justiça Federal ainda deferiu pedido de busca e apreensão nos endereços das suspeitas. As vítimas tinham idades entre 1 e 9 anos, sendo cinco meninos e uma menina.
Conforme a PF, a operação “Anêmona” teve início em setembro de 2022, quando foram identificadas publicações de um usuário em fóruns da deep web/dark web — onde, para garantir o anonimato dos usuário, os sites não são indexados pelos mecanismos de busca em comum e, normalmente, é preciso dispor de técnicas especiais para acessá-los, sejam senhas, navegadores específicos, etc.
“A Polícia Federal, por meio da Força Tarefa de Identificação de Vítimas, utilizando-se de modernas técnicas de investigação cibernética e intensiva tecnologia, conseguiu identificar o suspeito, residente na cidade de Fortaleza”, divulgou em nota a corporação.
Nas postagens, o homem — um cearense de 30 anos, formado em Psicologia, cujo nome não foi divulgado — gabava-se de convencer mulheres com filhos pequenos a praticarem abusos contra eles. Eram espécies de “tutoriais” com fins de ensinar outros pedófilos a praticarem o mesmo crime, diz a delegada Luciana Mota, titular da Delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos da PF, que coordenou a operação. O homem frequentava os fóruns desde, pelo menos, 2016. Fora da internet, ele era integrante de uma Organização Não Governamental (ONG) com foco nas pessoas com deficiência.
Em dezembro de 2022, ele foi preso na operação “Psique Sombria”. Com o acusado, a PF localizou mais de 12 mil arquivos de pornografia infantil. No material, havia diálogos mantidos entre ele e as mulheres cooptadas para o crime. Também havia diversas mídias como vídeos, fotografias, documentos que retratavam de forma explícita os atos criminosos perpetrados, informou a PF.
Conforme a delegada Luciana Mota, as mulheres não praticavam os crimes em troca de dinheiro ou eram extorquidas. Em apenas um caso há a suspeita de que recompensas financeiras eram pedidas, disse a delegada.
As mulheres foram contatadas pelo aliciador através de aplicativos de relacionamento e grupos de conteúdo adulto. As investigadas residem em Fortaleza, Maranguape (na Região Metropolitana de Fortaleza), Juazeiro do Norte (no Cariri Cearense) e Belford Roxo (no estado do Rio de Janeiro). O POVO apurou que cinco delas tinham idades entre 27 e 54 anos. Ao todo, a PF identificou que o homem entrou em contato com, pelo menos, 24 mulheres. A maioria teria recusado a prática.
Conforme a PF, elas serão indiciadas pelas práticas dos crimes de estupro de vulnerável, satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente, além dos crimes previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A soma das penas para esses crimes pode chegar a 45 anos de prisão. O homem também deve responder pelos mesmos crimes.
A PF informou que as cinco crianças e adolescentes no Ceará foram atendidas por integrantes do Conselho Tutelar dos respectivos municípios. Foi assinado um termo de guarda pelo órgão para que os pais, avós e familiares se responsabilizem pelos cuidados com as vítimas, diante da prisão das mães. O POVO não conseguiu informações sobre a situação da criança vítima em Belford Roxo.
As investigações prosseguem. O homem alvo da operação era frequentador de cinco fóruns de pornografia infantil na deep web derrubados na operação Lobos, iniciada em 2019. Como O POVO mostrou em 2022, esses cinco sites hospedariam cerca de 70% da pornografia infantil da deep web, conforme levantamento da Polícia Federal dos Estados Unidos, o FBI.
Na deflagração da Lobos, um mandado de busca e apreensão foi cumprido em Fortaleza, mas não foi contra o homem preso na Psique Sombria. “O alvo nem estava residindo aqui", diz Mota. "Ele residia em São Paulo. Teve a busca, mas foi na casa dos pais dele porque ele tinha deixado alguns equipamentos". (Com informações de Cláudio Ribeiro, Jéssika Sisnando e Kleber Carvalho / Especial para O POVO)
Primeira operação da Polícia Federal no Ceará que prendeu mulheres apontadas como abusadoras de crianças. Vítimas eram os próprios filhos delas. Psicólogo cearense de 30 anos, preso em dezembro de 2022 na operação Psique Sombria, era o aliciador das mães.
- 5 meninos e 1 menina
- Faixa etária entre 1 e 9 anos (alguns dos casos têm fatos de 5 anos atrás, vítimas hoje são adolescentes)
- 6 mandados de prisão preventiva
- 6 mandados de busca e apreensão
- 1 medida cautelar de afastamento do lar (única em que a vítima era menina)
- Fortaleza (CE)
- Maranguape (CE)
- Juazeiro do Norte (CE)
- Belford Roxo (RJ)
Aliciador se aproximava de mulheres através de redes sociais abertas. Simulava paqueras ou conversas aparentemente normais em grupos com conteúdo adulto. Com a formação em psicologia, conseguia identificar mulheres com tendência à pedofilia.
O psicólogo divulgava tutoriais de pedofilia na darkweb (também conhecida como deepweb). Para estimular outros pedófilos, fazia o passo-a-passo de como identificar e convencer mulheres para que cometessem abuso sexual com seus filhos.
Entre os perfis frequentados por ele na darkweb estão os de "pedomoms" e "pedowomen" (mães e mulheres pedófilas).
A Polícia Federal diz ter identificado pelo menos duas videochamadas em que o aliciador assistia aos abusos das crianças pelas mães enquanto se masturbava.
A identificação do aliciador aconteceu em setembro de 2022. Com material apreendido durante a prisão em dezembro, foi possível rastrear os casos.
Computador do psicólogo tinha mais de 12 mil arquivos, de diálogos dele com as mães sobre os crimes.
- Estupro de vulnerável ("Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos. Pena: reclusão de 8 a 15 anos. Art.217A do Código Penal Brasileiro-CPB)
- "Praticar, na presença de alguém menor de 14 anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem. Pena: reclusão de 2 a 4 anos (Art.218A do CPB);
- Produzir, reproduzir, distribuir ou comercializar pornografia infantil. Penas: reclusão de 4 a 8 anos e multas. (Artigos 240, 241, 241A e 241B do Estatuto da Criança e do Adolescente).
O nome da operação faz referência à anêmona-do-mar, animal que tem como uma de suas características não cuidar de seus filhotes.
Fonte: Polícia Federal