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As previsões fracassadas do mercado após as eleições
Reportagem

As previsões fracassadas do mercado após as eleições

| 1 ano depois | Projeções sobre as empresas cujos valores de mercado iriam saltar ou despencar com a vitória de Lula não se confirmaram. Medidas do governo, das companhias e o cenário externo explicam, segundo justificam os analistas
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BOLA DA CRISTAL montagem  (Foto: Olga Yastremska, New Africa, Afr)
Foto: Olga Yastremska, New Africa, Afr BOLA DA CRISTAL montagem

A vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições presidenciais do ano passado foi acompanhada de dias turbulentos no mercado financeiro, os quais geraram perdas na B3 - a bolsa de valores brasileira - e alta na cotação do dólar entre outubro e o fim de dezembro de 2022.

Ao mesmo tempo, analistas projetavam suspeitas sobre o desempenho das estatais e sucesso para as varejistas de consumo, especulando sobre a condução do Governo Federal.

Passado 1 ano e 15 dias desde o segundo turno das últimas eleições presidenciais, o cenário é completamente diferente do projetado e O POVO ouviu especialistas para saber o que fez as previsões do mercado financeiro para 2023 fracassarem.

Incertezas

"A gente enxergava incertezas naquele momento, porque o presidente Lula ganhando, os analistas viam uma guinada nas políticas econômicas devido ao histórico dele. O mercado entendia que seria um governo gastador e isso preocupa porque o mercado financeiro procura trabalhar com estabilidade e previsibilidade e, naquele momento, ninguém sabia ao certo qual seria a política econômica do presidente Lula", avalia Luiz Viana, professor de Economia e Finanças da Universidade de Fortaleza (Unifor).

Na prática, diziam que o aumento dos gastos e do déficit públicos pressionaria a economia, a qual já contava com uma escalada da taxa básica de juros por consequência da inflação elevada.

Mas as medidas costuradas pela equipe de transição - conduzida por Fernando Haddad hoje ministro da Fazenda - inverteram boa parte das especulações.

Mudança de opinião

Ricardo Coimbra, economista e conselheiro da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec) do Brasil, observa que as tomadas de decisões que asseguraram o novo arcabouço fiscal e a reforma tributária, no caso da política econômica, além da retomada de programas que aceleram o crescimento do País, redirecionaram a opinião dos analistas.

"A gente começa a observar que o espelho do Lula 3 começa a parecer um pouco com o Lula 1 e isso mostra uma reativação dos programas que geraram um crescimento. As projeções eram de 1% de crescimento em 2023 e, agora, estão chegando a 3%", observa Coimbra, comparando o primeiro e o atual mandato do presidente.

Sobre o desempenho das estatais, especialmente a Petrobras, ele aponta a valorização do petróleo no mercado internacional, o investimento em energias renováveis e principalmente a manutenção do pagamento de dividendos como elementos que fizeram os analistas encararem a companhia de forma positiva.

Isso fez com que a empresa se mantivesse como a mais valiosa da B3, com ações em alta no último ano. É a diferença entre o discurso eleitoral e o de gestão, aponta Viana.

Varejistas

Rafael Meyers, gestor na Solutions MFO, empresa do Grupo Solutions WM, diz que as varejistas seguiram um outro viés, sem que o governo tivesse atuação decisiva. A crise sobre as Americanas, deflagrada em dezembro de 2022, interferiu no setor ao elevar expectativas sobre Magazine Luiza e Via Varejo/Casas Bahia, inicialmente.

Mas o cenário de endividamento elevado encareceu ainda mais o crédito, ao mesmo tempo, em que os juros se mantiveram elevados, impossibilitando o aumento do poder de compra e barrando o consumo como se esperava no fim do último ano.

"Isso aí acabou impactando negativamente as companhias. Outro fator foi a concorrência com os chineses que acabou, de certa forma, reduzindo a participação de mercado dessas empresas."

Bancos

Incólumes às especulações dos analistas, os bancos mantiveram o valor de mercado e o crescimento das ações ao longo deste ano, alheios às políticas econômicas ou interferências externas. Parte do mercado financeiro, esse setor se consolida por conseguir ganhar dinheiro na maioria dos cenários, diz o professor Luiz Viana.

"Eu costumo dizer em sala de aula que banco é banco, sempre vai ser, e nunca vai perder dinheiro. Na prática, do ponto de vista dos fundamentos de um banco, se a inflação está alta, ele empresta dinheiro a taxas mais altas. Por outro lado, sofre risco maior e precisa fazer provisão para devedores duvidosos maior porque com uma taxa de juros mais alta tem uma tendência de uma inadimplência maior. Se a taxa de juros está baixa, ele está ganhando menos por cada operação, mas ele está ampliando o crédito concedido."

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Ibovespa
Ibovespa

Análises para a economia em 2024 devem permanecer tão severas quanto em 2023

Para o próximo ano, os analistas devem manter a mesma dureza nas projeções que envolvem a política econômica do governo federal e as empresas que sofrem influência do Executivo na gestão, segundo observa Ricardo Coimbra, economista e conselheiro da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec) do Brasil.

A explicação está no perfil do governo Lula, que mantém um caráter assistencialista e de maior potencial de gasto:

"Parte significativa do mercado olha sempre com o pé atrás. Exatamente porque há sempre um grupo mais desenvolvimentista e esse grupo pode, de alguma forma, tentar flexibilizar o crescimento de gasto", completa Coimbra.

A fala de Lula nas últimas semanas, quando considerou o déficit zero fora das prioridades do governo federal enquanto a meta foi um dos destaques do arcabouço apresentado pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda), corroborou essa interpretação e lançou mais dúvida para a economia brasileira no próximo ano, segundo ele.

Elementos decisivos

Mas, além do mercado interno, os analistas apontam outros elementos como decisivos para a dinâmica do mercado financeiro em 2024, como alerta Rafael Meyers, gestor na Solutions MFO, empresa do Grupo Solutions WM:

"Para o próximo ano, a gente acredita que a combinação de mercados globais voláteis e uma situação fiscal preocupante no Brasil pode impedir que investidores estrangeiros e locais façam alocações mais estruturais na bolsa brasileira".

Hoje, observa, a bolsa é comercializada com um preço sobre o lucro "bem interessante", com garantias altas de retorno. Mas, de fato, esses fatores podem impactar a projeção.

Expectativas no fim de ano

Até dezembro, no entanto, são esperadas a promulgação da reforma tributária, a confirmação das metas do arcabouço fiscal e a aprovação do orçamento.

O cenário, apesar de projetado para o futuro, ainda despeja muita especulação sobre o mercado em 2023, alerta o economista e professor Luiz Viana.

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Sara Saunders, estudante universitária
Sara Saunders, estudante universitária

Entre investimentos e desinvestimentos

Aplicada nos estudos de investimento financeiro desde a adolescência, a estudante universitária Sara Saunders, 22, desacelerou as aplicações na bolsa de valores em 2023. A decepção em alguns papéis a fez desistir.

No início, por volta dos 15 anos, ela buscou nos influenciadores digitais financeiros as informações iniciais para começar a jornada de ações.

Em seguida, foi aprofundando os temas em mais conteúdo na internet até se achar segura o bastante para aplicar os primeiros tostões, quando completou 18 anos.

"Eu vinha de uma família que não tinha muito dinheiro. Quando comecei a estudar para investir, pensei: eu preciso juntar bem muito dinheiro enquanto estou nova porque eu quero me aposentar cedo. Não quero perder até 16 horas do meu dia fazendo uma coisa que eu não gosto", planejou.

Escolhas tomadas

As empresas elegidas por Sara vinham da experiência de consumo dela. A partir de uma boa relação de compra, escolhia o papel a ser comprado.

"Eu pegava uma empresa que eu gostava e analisava as ações. Quanto que variaram nos últimos anos? Qual o preço variou? Aumentou? Diminuiu? Paga dividendos? Quanto por ação? Não paga, mas tem histórico de valorização boa? E fui analisando o mercado", contou.

Desaceleração

Mas, desde o ano passado, ela estacionou os investimentos na bolsa. Optou por tesouro selic ou "algo mais seguro que possa ser resgatado a qualquer momento".

A decepção, diz ela, foi com a influência do governo na economia, que fizeram com que os papeis se desvalorizassem.

Hoje, mantém apenas ações cujas ações pagam dividendos e a valorização não foi boa suficiente para ser interessante vender.

"Até hoje nunca tive prejuízo", destaca, ressaltando o quanto foi certeira nas escolhas.

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Desempenho das principais empresas por setor (R$)

Energia


Petrobras
Valor de mercado hoje - 465.006.416.325,88
nov./2023 - 34,96
nov./2022 - 26,12

Eletrobras
Valor de mercado - 87.658.858.119,98
nov./2023 - 41,25
nov./2022 - 48,53

Bancos

Itaú
Valor de Mercado - 263.631.485.304,27
nov./2023 - 24,81
nov./2022 - 23,37

Bradesco
Valor de Mercado - 152.539.007.193,45
nov./2023 - 13,44
nov./2022 - 12,85

Banco do Brasil
Valor de Mercado - 148.056.097.423,40
nov./2023 - 49,46
nov./2022 - 36,33

Santander
Valor de Mercado - 110.265.899.104,96
nov./2023 - 15,36
nov./2022 - 14,96

Varejistas

Renner

Valor de Mercado - 12.955.403.055,85
nov./2023 - 13,42
nov./2022 - 25,13

Magazine Luiza
Valor de Mercado - 12.013.089.789,44
nov./2023 - 1,72
nov./2022 - 3,98

Guararapes (Riachuelo)
Valor de Mercado - 2.705.664.000,00
nov./2023 - 5,24
nov./2022 - 7,87

C&A
Valor de Mercado - 1.855.635.309,36
nov./2023 - 6,04
nov./2022 - 2,56

Casas Bahia
Valor de Mercado - 1.354.935.926,04
nov./2023 - 0,5
nov./2022 - 2,26

Marisa
Valor de Mercado - 207.762.803,46
nov./2023 - 3,04
nov./2022 - 8,8

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