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Caju Rei: Do tema de samba à geração de negócios
Reportagem

Caju Rei: Do tema de samba à geração de negócios

Inspiração para samba-enredo no Carnaval do Rio de Janeiro, caju está nos holofotes do Brasil. Ceará segue como líder nacional na produção e exportação, mas é necessário apoio para alcançar os números de outrora
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FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL,06.02.2024: Castanha de caju. 
Mercado do Caju. Mercado Central de Fortaleza. (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL,06.02.2024: Castanha de caju. Mercado do Caju. Mercado Central de Fortaleza.

 

 

Principal produtor de castanha-de-caju e com maior área plantada com cajueiros no Brasil, além de maior exportador nacional, o Ceará nunca deixou o caju ficar esquecido. Mas o Carnaval de 2024 promete colocar a fruta como símbolo nacional, na boca do povo, por meio de rimas e receitas.

Com o enredo "Pede caju que dou... Pé de caju que dá!", a escola de samba Mocidade Independente, do Rio de Janeiro, levará o caju aos holofotes de alcance internacional. O carnavalesco Marcus Ferreira irá contar na Sapucaí tudo sobre a fruta do cajueiro, com suas histórias, curiosidades e lendas.

O samba-enredo da agremiação, que tem entre os compositores Marcelo Adnet, está ganhando cada vez mais força no período que antecede o desfile, sendo um dos mais ouvidos nos canais oficiais do Carnaval carioca e crescendo nas paradas dos streamings musicais.

No Spotify, por exemplo, foi número um no Rio de Janeiro na última semana do ano e agora está na lista das músicas mais virais do Brasil.

Caju é tema de samba no Carnaval do Rio de Janeiro em 2024

A grandeza do caju para o cearense vai além do viral pré-carnavalesco. Aqui, a cajucultura é sinônimo de cultura e também de negócios.

No ano passado, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que o valor de produção foi de R$ 389 milhões, praticamente dois terços do montante nacional (R$ 588,9 milhões).

Das 147 toneladas de castanha de caju produzidas no Brasil, 96,3 toneladas foram oriundas do Ceará.

Brasil exportou 147 toneladas de castanha de caju em 2023; o Ceará responde por 96,3 toneladas (Foto: Ricardo Moura/Embrapa)
Foto: Ricardo Moura/Embrapa Brasil exportou 147 toneladas de castanha de caju em 2023; o Ceará responde por 96,3 toneladas

Esse caju é o que abastece o mercado local, nas feiras como o Mercado Central, em Fortaleza, que é ponto de parada obrigatória para turistas que visitam a Cidade.

Conforme a administração do Mercado Central, atualmente 30% dos quase 600 permissionários que atuam no equipamento trabalham comercializando produtos derivados do caju. A variedade se estende desde as tradicionais castanhas de caju, até doces, cachaças e a famosa cajuína.

Confira o samba "Pede caju que dou... Pé de caju que dá!", da Mocidade Independente de Padre Miguel

 

Caju internacional e a presença do Ceará no mercado

 

O produto também rompe fronteiras estaduais, por meio das vendas digitais por encomenda, feita pelos próprios vendedores do Mercado Central - que também possui venda digital por meio de seu site.

As fronteiras internacionais também já foram rompidas. O Ceará já foi o maior exportador de castanha de caju do mundo. Atualmente, a colocação cearense no mercado internacional é tímida. Em 2023, o montante exportado foi de US$ 61,97 milhões, num processo contínuo de queda desde 2021.

Hoje, a exportação de castanha de caju decresceu mais de 30% em relação ao período pré-pandemia. O nosso principal parceiro comprador das amêndoas do caju são os Estados Unidos, no entanto, o montante exportado de US$ 22 milhões já foi representativo ao ponto de ocupar 20% do mercado estadunidense. Hoje não chega a 10% disso.

O Ceará é o maior exportação de castanha de caju do mundo (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA O Ceará é o maior exportação de castanha de caju do mundo

Para o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará (Faec), Amilcar Silveira, em meio ao acirramento da concorrência no mercado internacional, a falta de apoio ao produtor tem sido desafiadora.

O nível de produtividade está estagnado, os custos em alta e falta assistência técnica para capacitar esses produtores, que em sua ampla maioria são pequenos, destaca Amilcar. Na sua avaliação, a cajucultura deveria ser alvo de uma grande política pública de incentivo, já que é uma cultura nobre na fruticultura e de amêndoas.

Dentre as possibilidades, o presidente da Faec destaca as pesquisas feitas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), como o cajueiro anão-precoce, que apesar de menor do que o cajueiro gigante, é mais produtivo.

Embrapa desenvolve pesquisas para atualização do melhoramento do cajueiro anão precoce(Foto: Ricardo Moura/Embrapa)
Foto: Ricardo Moura/Embrapa Embrapa desenvolve pesquisas para atualização do melhoramento do cajueiro anão precoce

No entanto, apesar da distribuição anual de mudas de caju anão-precoce por parte do Governo do Ceará, maior parte da produção ainda ocorre no modelo antigo.

"O caju já foi o grande negócio do agro no Ceará no passado. Já chegamos a exportar US$ 200 milhões em castanhas de caju e já tivemos mais de 20 indústrias de beneficiamento, sendo que hoje só temos quatro ou cinco", ressalta Amilcar.

Para o futuro próximo, espera o sucesso de uma pesquisa que quer introduzir o caju como suco base na indústria de bebidas. Nas formulações atuais, o suco de maçã é o preferido, mas a Embrapa Agroindústria Tropical, com sede em Fortaleza, enxerga o potencial do suco de caju.

Dados sobre a produção de castanha-de-caju


 

Cadeia produtiva enfrenta dificuldades no preço após safra de 2023

Vitor Hugo, engenheiro agrônomo e consultor no setor de cajucultura, afirma que o setor vive um momento de estagnação no seu poder exportador e já observa a entrada de castanhas estrangeiras em seu mercado.

Ele conta que há um movimento em que as indústrias de processamento recebem matéria prima de fora para atender o mercado nacional. Por isso, defende que existam mecanismos de proteção da agroindústria nacional.

"Infelizmente, a castanha de caju e os seus produtores não têm sido tratados como prioridade. Há um processo de certa invisibilidade perante os formuladores de políticas públicas", acrescenta.

Vitor conta que o atual preço da castanha de caju paga ao produtor está em baixa, sendo cotada entre R$ 4 e R$ 4,50. Sendo que o valor ideal para o atual momento seria algo próximo a R$ 6.

Isso tem feito com que muitos produtores segurem a produção obtida na última safra à espera de melhores preços.

Produtores reclamam do baixo preço da cotação de castanha de caju no mercado local (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA Produtores reclamam do baixo preço da cotação de castanha de caju no mercado local

 

 

Embrapa estuda nova "atualização" para cajueiro anão e caju como suco base na indústria

O braço da Embrapa Agroindústria Tropical que pensa em inovações para a cajucultura tem uma série de novidades a serem lançadas ao mercado nos próximos meses. O que deve vir primeiro é a nova "atualização" do melhoramento genético do cajueiro anão-precoce.

Após a entrega da versão de 2022, mais adequada à região do Semiárido, mas com adaptabilidade a regiões de maior altitude com clima ameno no Nordeste, a nova variedade visa atender um novo território: o Litoral Oeste do Ceará.

Segundo a chefe adjunta de Transferência Tecnológica da Embrapa Agroindústria Tropical, Aline Teixeira, há uma evolução de mais de 40 anos nesta tecnologia, desde o lançamento do primeiro clone, o CP 76, de 1983.

Desde então foram lançados 13 clones. Ela conta que o processo de adaptação do mercado às novidades ainda é aquém do esperado, com a predominância do cajueiro gigante, mas que à época de seca entre 2012 e 2017 houve aceleração na transição.

Isso ocorreu a partir da maior resistência do cajueiro anão-precoce às condições adversas do clima, enquanto os cajueiros antigos morriam.

Curiosidades: Caju sob os olhares da ciência

Questionada sobre o avanço de países africanos, como a Costa do Marfim, na liderança mundial das exportações, destaca que não há nenhuma diferenciação ou vantagem técnica em comparação à tecnologia disponível aqui.

No que se refere ao futuro, o desenvolvimento de inovações que permitam o uso integral do fruto é o objetivo. Nesse contexto se inclui o uso do caju como suco base para indústria de bebidas.

A expectativa é de que em até dois anos seja possível ofertar ao mercado essa solução, que permite utilizar 100% do fruto de maneira sustentável economicamente.

Aline explica que, atualmente, seguindo o modelo tradicional de produção, há um custo para produzir 100% de caju - em que 10% é castanha e 90% é pedúnculo - mas em que o mais rentável é lucrar em cima de 10%.

Ampliar o uso integral do caju na indústria de bebidas é a principal aposta para o futuro do produto (Foto: Ricardo Moura/Embrapa)
Foto: Ricardo Moura/Embrapa Ampliar o uso integral do caju na indústria de bebidas é a principal aposta para o futuro do produto

"No modelo tradicional, 90% viraria ração animal. Queremos migrar desse modelo com o aproveitamento integral, como na industrialização através do suco base, além da produção de polpa e refrigerante", pontua.

No uso como suco base, o caju seria industrializado de forma a ser desodorizado e também perderia seu sabor, podendo ser misturado com outros sucos. A perspectiva é de que esse movimento possa gerar maior rentabilidade ao produtor, que além da castanha poderia explorar o pedúnculo.

A Embrapa ainda pleiteia parcerias para que esse tipo de projeto avance. Exemplo disso são parcerias com empresas de alimentos interessadas no uso da fibra de caju para transformá-la em produtos veganos.

Dentre as experiências bem-sucedidas estão a produção de hambúrguer de caju e já há iniciativas afins de produzir empanados de caju, por exemplo.

Indústria estuda parcerias para transformar a fibra de caju em produtos veganos.(Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA Indústria estuda parcerias para transformar a fibra de caju em produtos veganos.

 

 

Características do cajueiro anão-precoce

O Caju Anão pode medir de 2 a 4 metros e ser superprodutivo e muito precoce, pode começar a produzir frutas logo no primeiro ano após o plantio. Lançado pela Embrapa em 2002, o BRS 226 é recomendado para plantio comercial de sequeiro no Semiárido.

Cajucultura faz parte do patrimônio local

 

A face de quem vive da cajucultura no Mercado Central de Fortaleza

 

Antônio Brito: Castanha de caju para todo Brasil por meio da venda online

 

Com 26 anos de Mercado Central na venda de produtos regionais, com destaque para a variedade relacionada ao caju, Antônio Brito, 74, é um dos mais experientes nesta seara. Ele conta que o período da pandemia foi desafiador, mas que representou um marco no negócio.

Brito destaca que atender turistas de outros estados e países era do trato diário no Mercado, mas desde o período de isolamento social passou a trabalhar com televendas e atendimento por Whatsapp. Isso permitiu com que seus produtos atravessassem fronteiras.

"O Whatsapp é um novo formato muito importante. Passamos o dia ligado nos pedidos e existem pedidos que enviamos para outros estados. Hoje a relação das vendas é 50-50, tenho clientes que já conhecem o produto e só enviam mensagem", conta.


Francisco Kleybs: Castanha de caju não é "tudo igual"

 

Quando Francisco Kleybs começou no negócio de venda de castanha de caju existia um rei neste negócio: o empresário Jaime Aquino (1924-2015). O fundador da Cione e considerado um verdadeiro ícone no negócio da cajucultura foi o primeiro fornecedor de Kleybs.

Atualmente com 43 anos de mercado, conta que no que se refere à castanha de caju existem diferenciações importantes a serem mencionadas. Castanha de caju "não é tudo igual".

"Existem 23 tipos, a maioria para exportação. Para o nosso comércio, o que interessa são três tipos: Inteira, quebrada e em pedaços."

Dando uma série de detalhes e segredos a partir dos conhecimentos acumulados, destaca que castanha de caju boa é aquela sem sal. Assim como é saboroso comer castanha mergulhada no mel de caju.


 

Eudes Oliveira: Derivados de caju na refeição inteira

Dos 61 anos de idade de Eudes Viana, 37 deles são dedicados ao trabalho no varejo vendendo derivados do caju. Ele destaca que a variedade é tão grande que é possível ter toda uma alimentação à base de caju.

Entrada, prato principal e sobremesa. Da mais conhecida castanha de caju, passando pela cajuína, hambúrguer e sopa de caju, até chegar aos doces e rapadura.

"Existem alguns restaurantes aqui em Fortaleza que aproveitam todo o caju, que é um alimento de múltiplos usos", destaca.

Questionado sobre a aceitação da cajuína entre os visitantes do Mercado Central. "O carro-chefe é a castanha de caju, mas as pessoas também procuram muito cajuína".

 

 

Refrigerante de caju do Ceará já chega a 11 estados

 

A marca São Geraldo completou 62 anos de mercado oferecendo aos amantes de caju uma opção diferenciada de refrigerante.

A empresa já alcança 11 estados brasileiros, extrapolando sua região de origem e conquistando novos mercados.

Segundo cálculo da empresa, um total de 66.657.739 de litros de São Geraldo já foram comercializados nos anos de atuação.

Refrigerante de caju da marca São Geraldo(Foto: São Geraldo/Divulgação)
Foto: São Geraldo/Divulgação Refrigerante de caju da marca São Geraldo

O Grupo São Geraldo tem sede na cidade de Juazeiro do Norte, no Cariri cearense. Seu principal produto, o refrigerante de caju, tem o ingrediente extraído da própria fruta.

Atualmente, quatro parceiros locais produzem e fornecem suco de caju para a industrialização do refrigerante.

A marca São Geraldo começou na década de 1950, numa pequena fábrica de bebidas alcóolicas que produzia vinhos à base de frutas, como jurubeba, jenipapo e caju.

O destino da marca começou a mudar quando José Amâncio de Souza se tornou proprietário dois anos depois.

Após anos de trabalho, na década de 1970 foi lançado o refrigerante de caju São Geraldo. Atualmente, o parque industrial tem mais de 30 mil metros quadrados e emprega em torno de 400 pessoas na operação, além de milhares indiretamente.

Lançamento: Refrigerantes de caju em lata

 

Faça visita virtual ao Museu do Caju

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