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Crise no mercado editorial: como escrever novos capítulos?
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Crise no mercado editorial: como escrever novos capítulos?

Marcado por aguda crise anterior à pandemia, mercado editorial procura mitigar impacto e iniciativas independentes se destacam ao apontar caminhos
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Processo de feitura do livro Claviculário, escrito pela cearense Anna K Lima e publicado pelo Selo Editorial Aliás
 (Foto: BRUNA SOMBRA/DIVULGAÇÃO SELO EDITORIAL ALIÁS)
Foto: BRUNA SOMBRA/DIVULGAÇÃO SELO EDITORIAL ALIÁS Processo de feitura do livro Claviculário, escrito pela cearense Anna K Lima e publicado pelo Selo Editorial Aliás

A crise que há anos abatia o mercado editorial do País teve, em 2019, um respiro. O aumento real do faturamento do ano em comparação a 2018 foi de 6,1%, conforme a pesquisa Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro ano-base 2019, realizada pela Nielsen e coordenada pela Câmara Brasileira do Livro e pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel). Tal esboço de uma retomada, porém, foi impactado pelo contexto da pandemia global.

Segundo o Painel do Varejo de Livros no Brasil, relatório mensal realizado pela Nielsen e pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros, as vendas em maio caíram 33% em comparação ao mesmo mês em 2019. Os dados acumulados do ano apontam queda de 13,6% em volume de vendas e 13,1% em valor, também comparados com o ano passado.

Os números referem-se às principais livrarias e supermercados do País, explicitando o impacto junto aos grandes conglomerados. Para os independentes, este impacto é ainda maior. No geral, o empenho é por encontrar possibilidades de manutenção. Nas editoras menores, a maior parte das estratégias empreendidas não é novidade - autopublicação, formato digital, financiamento coletivo... -, mas há novas camadas e finalidades para elas.

"Estamos com precauções para garantir a saúde dos nossos funcionários no setor de logística e também dos leitores que receberão livros. Isso causou uma dificuldade para escoar os pacotes, trabalhamos com um pouco menos de agilidade e com equipe reduzida. Nossa vantagem foi ter, desde a fundação, o DNA do trabalho remoto", contextualiza a CEO da Editora Wish, Marina Ávila. "Temos conseguido manter o ritmo, mas não sabemos se todos os editores ou autores independentes estão na mesma situação", afirma.

Uma das principais saídas para a Wish foi um antigo plano de lançamento de um clube de assinatura de contos digitais, que teve finalidade adaptada para a realidade do coronavírus. A campanha "Sociedade das Relíquias Literárias" funciona como um financiamento coletivo contínuo, no qual o leitor colabora com uma assinatura mensal - a partir de R$ 8 - que dá acesso a um conto exclusivo por mês. A meta de R$ 7 mil já foi batida.

"A campanha nos deu a oportunidade de manter nosso pulso de publicações para 2020 e fazer a roda do trabalho girar. Conseguimos manter tradutores, revisores e ilustradores freelancers trabalhando, como também prospectar novos títulos. Todos sentimos uma queda grande nos pedidos das empresas grandes e médias. É um período de incertezas, mas as assinaturas têm provido algum alento e apoio dos leitores", ressalta Marina.

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Para a editora cearense Aliás, o impacto se deu principalmente por conta da impossibilidade de promover ações e atividades em livrarias da Capital. "Editoras independentes atuam como produtores culturais, promovendo encontros, saraus, clubes de leitura, oficinas formativas. Pra gente, ficou complicado porque é inclusive nesses espaços de encontro, onde discutimos ou debatemos algum tema, que conseguimos vender produtos", explica a editora Anna K.

A aposta no financiamento contínuo também foi importante para a Aliás. "Veio como uma possibilidade e um pedido de ajuda para que a gente possa continuar fazendo algumas ações sem ter tanto desespero pra pagar conta de telefone, de internet", exemplifica Anna K. Há pouco mais de um mês, a campanha Bons Ventos Sempre Virão vem recebendo apoios mensais que vão de R$ 8 a R$ 60. Entre as recompensas, estão de zines virtuais a participação em aulas sobre escrita afetiva, produção e assessoria literária.

Goreth Albuquerque, coordenadora das Políticas de Livro, Leitura e Biblioteca da Secretaria da Cultura do Ceará, ressalta a importância das editoras independentes no contexto do setor. "Elas têm inovado com a criação de serviços que vão desde oficina de escrita criativa à organização de feiras, publicam por meio de vaquinhas coletivas e estão sempre na corda bamba. Uma das principais provocações que trazem é o tema do movimento colaborativo como modalidade econômica e possibilidade de desenvolver projetos. A gestão pública precisa avançar em estudos sobre os modos de produção, distribuição e consumo desse mercado considerando as modificações nas estruturas editoriais, não para constatar dados, mas para entender como podemos fortalecer essas iniciativas", avalia a gestora.

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