O que está acontecendo agora - ou aconteceu há poucos anos - que pode causar drásticas mudanças em um futuro relativamente próximo como, digamos, 2050? O desafio posto em prova na performance "A história é uma profetisa com os olhos para trás" é o questionamento de para onde o mundo está caminhando e como será a sociedade no futuro, quando as pessoas, pós-pandemia, terão novas questões para se preocupar.
Contestando as relações políticas atuais e dialogando com o passado, o espetáculo interativo "A história é uma profetisa com os olhos para trás" - título que remete à obra do jornalista e escritor Eduardo Galeano - tem apresentações marcadas para às quintas, sextas e sábados de julho, sempre às 20 horas. A produção, realizada pelo Núcleo de Estudos da Performance, desafia os participantes a saírem da zona de conforto ao convidá-los a encontrar "estratégias para acabar com o capitalismo".
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A premissa é a seguinte: por meio de um percurso inteiramente on-line, os espectadores - personagens ativos da performance - se deparam com movimentações estranhas em suas redes sociais. As notificações e mensagens, que chegam por e-mail, Whatsapp, Facebook, Instagram, ligações e até pelo Zoom, vão criando uma simulação futurística e instigando interações. Assim, é indispensável para o sucesso da apresentação que o participante tenha acesso a tais aplicativos e à internet.
Na simulação, os mediadores revisitam momentos recentes da política brasileira para questionar a função do sistema capitalista na sociedade. A proposta é buscar o passado e o presente para conseguir tecer uma ideia do futuro. "A ordem dominante não sofre mais abalos. Há décadas nada acontece e existem semanas que acontecem décadas", fala uma das personagens.
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Por ser altamente interativa, é fundamental que o público esteja disposto a participar, visto que será necessário trocar de aplicativo diversas vezes e dialogar, tudo para deixar a imersão ainda mais realista. É necessário, portanto, ter aproximadamente uma hora e meia livre na agenda - duração aproximada da simulação.
A proposta interativa surgiu da busca de algo que pudesse ser inovador e que pudesse garantir a arte sem aglomerações. Segundo Eduardo Bruno, um dos idealizadores da performance, a peça também busca promover um fórum público, uma forma de pensar as artes cênicas como um espaço de debate. Além de Eduardo, o trabalho conta com Juliana Rizzo, João Paulo Lima, Sara Escudeiro e Waldírio Castro.
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"As pessoas lá estão em pé de igualdade. E não tem como desvincular o âmbito da existência do âmbito da política, pois somos seres humanos que só existem em sociedade. E se qualquer pessoa quiser se posicionar com qualquer ideologia, isso será parte da dramaturgia. Pensar que a história é uma profetisa com os olhos para trás quer dizer que se a gente quer evitar um futuro infortúnio, precisamos compreender os processos históricos que nos trouxeram até aqui", ressalta o artista, integrante do grupo desde sua criação, em 2018.
Como serão compostos por pessoas diferentes, cada espetáculo será diferente, com novas discussões e outros resultados. "A gente está dando conta de narrar uma experiência que ainda está em construção. É um outro campo de criação e percepção. Talvez possamos dizer o que foi esse movimento em alguns anos, mas hoje, só posso adjetivar como algo novo", declara Eduardo, ressaltando a performance como algo que necessita de tempo para ser percebido e assimilado.
O hoje em debate
A perspectiva de segurar o celular e aguardar uma mensagem, um e-mail ou uma ligação, é bem instigante, e com certeza é a partir desse frio na barriga que a experiência já começa. "A história é uma profetisa com os olhos para trás" me pegou de surpresa pela temática - sobre a qual não vou dar muitos detalhes -, e me impressionou pela forma como a notificação de um e-mail, Whatsapp ou Instagram conseguia despertar uma certa ansiedade.
A multiplataforma com certeza é o ponto alto da performance, juntamente com a possibilidade de se encontrar "cara a tela" com pessoas completamente estranhas, mas para discutir o mesmo assunto. Em uma mistura temática que lembra o seriado da Netflix "Dark" e os livros "1984", de George Orwell, e "Admirável Mundo Novo", de Aldous Huxley, a proposta da distopia, por sua ideia da mudança drástica na sociedade, pode inclusive se relacionar com o momento atual.
Propor-se em criar um espaço aberto para a discussão política é arriscado, principalmente pela ideologia bem firmada do grupo e visto que a conversa corre o risco de terminar sem contrapontos, ainda mais com o cenário polarizado atual. Entretanto, isso de maneira alguma invalida a performance e talvez esse seja o papel da arte: o de convidar oposições e de registrar os pensamentos. Pensando agora, esse risco pode até dar força ao trabalho.
Concordo com Eduardo Bruno quando diz que o melhor adjetivo para a peça é ser algo novo, pois a experiência é tão diferente de todas as apresentações que havia participado durante a pandemia - grande parte delas, transmissões ao vivo de música - que não consigo pensar em outra palavra. Portanto, seja por brincadeira, por debate ou curiosidade, participar da simulação vale à pena e pode garantir uma experiência completamente nova.
A história é uma profetisa com os olhos para trás
Quando: todas as quintas, sextas e sábados de julho, sempre às 20 horas
Quanto: R$ 10
Venda e informações: pelo Instagram @nucleo_performance