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Expofoto #quarentena reúne imagens feitas por quem mora nas periferias do Brasil
Vida & Arte

Expofoto #quarentena reúne imagens feitas por quem mora nas periferias do Brasil

Segunda edição da Expofoto #quarentena, do Coletivo Perigrafia, está disponível na plataforma Cultura Dendicasa com registros de 27 fotógrafas e fotógrafas das periferias do Ceará e outros estados
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Piauiense, mas moradora de Fortaleza há 28 anos, Jane Batista mora próximo ao Cais do Porto e seu registro foi feito na praia (Foto: Jane Batista / divulgação)
Foto: Jane Batista / divulgação Piauiense, mas moradora de Fortaleza há 28 anos, Jane Batista mora próximo ao Cais do Porto e seu registro foi feito na praia

"Olhar que vem de dentro: relações em tempo de isolamento social" é a premissa temática da segunda edição da Expofoto #quarentena, promovida pelo Coletivo Perigrafia. Formado por fotógrafas e fotógrafos residentes em periferias de Fortaleza, o grupo lançou, ao longo da pandemia, chamadas para recebimento de registros do período produzidos por profissionais ou não que morem em regiões periféricas do Brasil. A edição, com curadoria das fotógrafas Joyce S. Vidal, Karine Araújo e Lucianna Silveira, reflete sobre o que é um “olhar de dentro” e tensiona noções pré-concebidas sobre narrativas periféricas.

“Queremos que quem tenha acesso ao material se desloque”, convida Karine. O time curatorial, explica, procurou trazer na convocatória vários deslocamentos. “Eles começam quando criamos o espaço para que vozes falem através de imagens. Outro deslocamento é sobre que pessoas a gente escolhe: justamente o público que fazemos parte, fotógrafos de periferia e em contextos de marginalização. Isso traz um imaginário de que elas vão fotografar somente a margem, mas aí vem outro deslocamento. Queremos que as pessoas saiam das suas zonas de conforto e vejam que não temos somente uma narrativa. Um fotógrafo periférico ou marginalizado pode fotografar moda, gastronomia, subjetividades, ser fotojornalista. O ‘olhar que vem de dentro’ pode ser de casa, do ônibus, da pessoa se autoavaliando”, elenca.

Um olhar saudoso e reflexivo está na imagem da piauiense Jane Batista, 44 anos, que vive em Fortaleza há 28, e mora perto do Cais do Porto. “Meu relacionamento com a fotografia se iniciou fazendo fotos da família e aos poucos fui me apaixonando pelas descobertas que meus olhos viam e pela tentativa de ver além. Hoje, vejo o fotografar como uma história para o futuro e quero participar desses momentos”, afirma.

O “registro histórico” de Jane não se interessa pela grande escala, mas sim situações cotidianas. “Me aproximei da linguagem para registrar o lugar que moro, meus momentos vividos. Quero fazer as pessoas verem e sentirem o que não têm tempo de ver”, atesta a fotógrafa. A foto que compõe a Expofoto é, na leitura da autora, um olhar sobre liberdade. “Era um momento em família. Fomos até o paredão da praia nesse dia, sentamos em posições diferentes. Tudo era silêncio mesmo com o barulho do mar nas rochas. Meu filho e minha sobrinha observavam pontos diferentes, um o infinito do mar e o outro o infinito do céu”, descreve.

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Outro registro é o da cuidadora de idosos e acompanhante hospitalar Eliene Moreira, 29 anos, moradora do Jardim Iracema. Ela, que encontrou na fotografia aconchego e força após período delicado na vida pessoal, procura expressar pelas imagens o que não consegue pôr em palavras. A foto de Eliene foi feita em um ônibus, num dos muitos percursos que fez durante a pandemia por conta da profissão. “Estava acompanhando uma senhora que se recuperava da covid-19. Passei a noite com ela e, no momento da foto, voltava para casa de manhã ao mesmo tempo muito feliz, muito cansada e muito preocupada porque a população começava a se movimentar para sair de casa de novo”, reconta a fotógrafa.

O registro da cuidadora de idosos Eliene Moreira, moradora do Jardim Iracema, reúne diversas vivências do período da pandemia em um único enquadramento
Foto: Eliene Moreira / divulgação
O registro da cuidadora de idosos Eliene Moreira, moradora do Jardim Iracema, reúne diversas vivências do período da pandemia em um único enquadramento

O registro enquadra diversas realidades do período de pandemia. “Havia uma pessoa trabalhando, eu voltando para casa e pessoas na calçada conversando. Me veio a coisa das pessoas que não puderam parar na pandemia - entregadores de gás, pessoas da sáude, do transporte, de serviços essenciais - e das que talvez decidiram não parar. A foto foi feita nesse misto de percepções, sensações”, elabora. “Fiz sem intenção, olhei pela janela e aquilo se moldou diante de mim”, divide.

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Eliene e Jane são alguns dos exemplos de narrativas e olhares bem próprios entre as fotos selecionadas. “Procuramos nos ver nas fotografias e ver, também, as narrativas dessas pessoas plurais”, afirma Karine. “Curadoria é um poder de escolha. Quando você tem o poder de escolher, como e para quem você utiliza? Estamos numa terra que é negra, originária, indígena e que não se vê nem nas fotos e artes de muitas galerias e museus”, ressalta.

“Acompanhamos no circuito artístico uma narrativa branca que vem de uma norma europeia, onde se acaba por esperar certificação dela para se intitular artista, fotógrafa, artista visual. É por isso que criamos espaços, para romper a norma. Que a gente crie nossos espaços e possa falar por nós mesmos. Não é uma contranarrativa, são narrativas. Permitimos que as pessoas se narrem a partir de si mesmas”, defende Karine.

 

Expofoto #quarentena

Confira catálogo da 1ª edição em clicando aqui

 

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