De ficções a biografias, cada livro traz consigo impressões e vivências de seus criadores, ainda que surjam de formas subliminares. A cada página, os olhos leitores visitam universos de mensagens e possibilidades imaginativas por meio da leitura. Entretanto, como seria imergir nas histórias de seus autores e de suas obras preferidas a partir da união entre a arte arquitetônica e a literatura? É em meio a esse pensamento que se destaca a "Arquiliteratura", um conceito de arte visual que aborda a "arquitetura dos livros" e é trabalhado pelo artista plástico André Braga, que reside em Cascavel, no Paraná.
André Braga define o surgimento do seu projeto como um processo espontâneo, tendo início a partir "de uma tentativa de criar uma construção literária em um pé de jabuticaba" que existe em sua casa. "A minha intenção era ter uma árvore do conhecimento, uma espécie de estrutura arquitetônica literária que servisse como uma obra de arte particular", complementa.
Coincidentemente, durante a época em que Braga teve essa ideia, o Museu de Arte de Cascavel (MAC), no Paraná, lançou edital para inscrição de obras artísticas na 21ª Mostra Cascavelense de Artes Plásticas, com premiação de R$ 5 mil. André, então, decidiu se inscrever e acabou sendo selecionado para participar da exposição, que ocorreu em 2019. O artista enviou três obras em que retratava as vidas dos escritores Ernest Hemingway, Jorge Luis Borges e José Saramago. Em comum, todas já apresentavam os aspectos "arquitetônicos literários" da sua arte que, aos poucos, se consolidava.
Apesar de não ter recebido o prêmio em dinheiro, é possível dizer que o artista plástico saiu da Mostra com outro tipo de premiação: o reconhecimento de seu trabalho. André Braga relata que suas obras fizeram tanto sucesso entre o público visitante que isso o motivou a dar seguimento ao projeto da Arquiliteratura. "Naquele instante, eu senti que era isso que eu deveria fazer da minha vida, em função de todas as leituras que eu tive ao longo da minha infância, da minha adolescência e até dos dias de hoje", afirma.
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Desde então, o ritmo da "criação arquiliterária" se intensifica cada vez mais em sua vida. Assim como a espontaneidade marcou o início da Arquilteratura, ela também se faz presente no processo de escolha do artista sobre qual autor ou obra literária fará parte de sua próxima iniciativa. Ele também aponta que o seu entusiasmo pelas histórias que descobre tem grande influência na sua decisão final.
Impulsionado por essas sensações, o artista plástico realiza seu trabalho com base em muitas pesquisas sobre os autores que serão retratados em sua arte. Além disso, ele destaca a sua relação com a leitura, que contribui para o desenvolvimento mais diversificado do projeto que busca incentivar outras pessoas a terem mais contato com a literatura. "O meu envolvimento com a leitura é quase que espiritual. Eu me envolvo em pesquisas e estudos, basicamente como se eu fosse fazer um longa-metragem sobre o autor. No meu caso, a arte é estática, sendo uma construção arquiliterária em quadro ou em uma estrutura tridimensional. Eu crio a obra de arte para que as pessoas possam adquirir conhecimento por meio dela", acrescenta André.
Os materiais utilizados por Braga para suas artes variam de acordo com o que ele idealiza para os seus projetos. De cola e clipes de papel até madeira, a montagem de seus quadros é feita manualmente. "Não existe regra. Digamos que eu queira fazer um ar-condicionado. Eu simplesmente penso em quais materiais existentes hoje no mercado eu posso adquirir para que eu mesmo fabrique aquele ar-condicionado", relata. André ressalta que "cada centímetro quadrado da Arquiliteratura tem uma mensagem e um significado" e, por isso, nenhum material é usado "em vão".
O tempo que o artista leva para finalizar uma criação depende da grandiosidade e da riqueza de detalhes que a obra exigirá. Por isso, afirma que pode precisar de 40 dias a três meses e meio para alcançar seus objetivos. Ele destaca o seu quadro Escritores da Liberdade, ou a Legião de Cervantes como parte de um longo processo de construção artística. A obra apresenta 17 celas que contemplam detalhes das vidas de personalidades que estiveram presas em algum momento, como os escritores Graciliano Ramos e Kurt Vonnegut.
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Apesar de elaborar peças complexas, Braga afirma que não tem formação em arquitetura nem passou por cursos de fabricação de maquetes ou teve experiências artísticas manuais anteriormente. Sua formação acadêmica é como historiador e, para ele, tudo relacionado à sua arte é "intuitivo".
Como forma de "manter uma rotina de diálogo" e de exercitar a "capacidade de expor" seu trabalho, o artista plástico publica em suas redes sociais o andamento de suas criações. Suas últimas postagens destacam o processo de construção de "Fahrenheit 2020 - O Retorno de Ray Bradbury", arte baseada no livro "Fahrenheit 451", do escritor estadunidense Ray Bradbury, e que traz muitas informações sobre a obra e a vida do autor.
A partir da Arquiliteratura, André Braga já participou de Mostra em São Paulo e também recebeu convites para expor sua arte em Nova York, na Bienal Internacional de Veneza e na Bienal Internacional da Amazônia. Devido à pandemia do novo coronavírus, porém, esses últimos eventos não puderam ser realizados. Essas notícias, entretanto, não abalaram o artista, que está confiante e determinado quanto à continuidade do seu trabalho: "Se eu quero realmente fazer isso que eu estou fazendo, todo tipo de obstáculo tem que servir como um tipo de ensinamento", afirma.
André acredita que a Arquiliteratura se consolidará por bastante tempo e que ele "tem um longo caminho pela frente". Seu desejo, sobretudo, é "viver por muitos anos" para que possa dar sequência às suas criações. "Eu, como artista, torço para chegar aos 100 anos, talvez morrer com a mesma idade do arquiteto Oscar Niemeyer, aos 104 anos. Se eu chegar lá, vou ter muitas obras para deixar", complementa. Para André Braga, a sua arte "é infinita".
Conheça o trabalho do artista:
Facebook: www.facebook.com/andre.braga.775823
Instagram: @andrebraga.art