É domingo, década de 1980. Você está sentado no sofá enquanto o assiste, na maioria das vezes, com um sorriso igual, de ponta a ponta. Em alguns casos, esperançoso por, quem sabe, realizar o sonho da casa própria ou ganhar um carro 0 Km. No comando do show variedades, que, na época, ocupava praticamente toda a programação dominical, batizado "Programa Silvio Santos", o legítimo, nascido Senor Abravanel, uma figura que, desde os anos 1960, na TV Paulista, ainda, como o Silvio, dava suas graças, cheias de encanto, e canto. Hoje? Em "Ritmo de Festa". Neste dia 12, celebra 90 anos de idade, quase todos entregues ao empreendedorismo (começou camelô, seguindo os passos do pai), e à carreira artística, de locutor de rádio a um dos nomes mais importantes das telecomunicações brasileiras.
Com tantos tantos em sua biografia, bastante revisitada, por sinal, entendê-lo passou a ser a análise da própria cultura mediada pela TV. "Só no deslocamento poético é possível concretizar a 'vida' e fazê-la sentar-se no sofá", introduz a tese - disponível no Domínio Público - "Silvio Santos vem aí - programas de auditório do SBT numa perspectiva semiótica", defendida em 2009, por Silvia Maria de Sousa, que dois anos mais tarde, a publicaria em livro. Nela, explica: "A 'forma' de um programa televisivo, com suas múltiplas linguagens sobrepostas, manifesta-se concretamente em dois eixos: espacial - o espaço do set de filmagem - e temporal - o tempo de duração do programa". Silvio consolidou-se nesse meio, tendo a perspicácia de dizer "Eu dirijo meu trabalho, o meu trabalho não me dirige", uma das poucas frases, que não humoradas, falando sério, atribuídas à ele, na internet.
Também interessada em entendê-lo, mais do que visto na TV, a publicitária Amanda Veronesi buscou viés semelhante. Em 2016, ela e mais duas estudantes de uma faculdade do sudeste do país defenderam um Trabalho de Conclusão de Curso, também, sim, baseado no Silvio: "O éthos de Silvio Santos: complexidade e construção da imagem". "Visitamos o SBT, participamos de alguns programas da emissora (infelizmente o próprio programa do Silvio não foi possível). E fomos cada vez mais mergulhando no mundo dele e construindo um trabalho pautado na semiótica. Até porque quem não gosta do Silvio não é mesmo?"
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"Nosso trabalho traduz a construção do discurso do Silvio levando em consideração o ambiente, as características de seu auditório, sua imagem já consolidada e os quadros do programa e suas recompensas. Reforçando sua imagem de um apresentador carismático, irreverente e animado, que tem liberdade para fazer perguntas de sexo, brincar com características como roupa, cabelo e corpo das participantes e do elenco convidado. E ainda 'premiar' ou 'castigar' seu auditório, dando dinheiro para respostas certas e um valor baixo para respostas erradas", aprofunda-se. "Essa imagem do orador em relação ao auditório está ligada às escolhas das palavras e argumentos utilizados em seu discurso. Seus bordões, criados há décadas, e o tom de voz, quando interage com o auditório, são alguns signos já existentes em seu discurso preestabelecido", esclarece no estudo.