A última folia carnavalesca oficialmente realizada ocorreu pouco antes da pandemia, em fevereiro de 2020. Três anos depois, blocos de rua conhecidos dos foliões aguardam, com ansiedade, o retorno aos espaços públicos da Capital. Entre desafios para sair nos períodos de Pré-Carnaval e Carnaval e as expectativas de reencontrar o espírito da festa, integrantes do Luxo da Aldeia, do Unidos da Cachorra, do Camaleões do Vila e do Bloco Cheiro de Iracema compartilham movimentações de preparação para a folia de 2023.
"A gente passou dois anos sem nenhum tipo de festa diante do problema da pandemia e defendeu que elas não acontecessem até que todos estivessem vacinados, com doses de reforço. Estamos muito emocionados em retomar os ensaios, as atividades", compartilha Denis Brito, mestre da bateria do Unidos da Cachorra.
A indefinição do cenário sanitário nos últimos carnavais também mexeu com as expectativas dos brincantes. "Ensaiamos um retorno no final de 2020, logo paramos. Em 2021, após a vacinação, tentamos retomar de novo, mas veio outra onda", narra Tiago Nóbrega, presidente do Camaleões do Vila. "A gente interrompeu nossas atividades por longos períodos, perdemos muita gente querida, infelizmente, mas a ciência nos trouxe de volta à vida, à festa e ao Carnaval", celebra.
As emoções do retorno são complexas, como divide Bruno Perdigão, vocalista do Luxo da Aldeia. "Como diz Luiz Antonio Simas, a gente não faz festa porque a vida é fácil, mas pela razão inversa. Agora estamos ansiosos para retomar a festa. É a expectativa de poder reviver uma alegria que foi interrompida", compartilha.
Além do lado simbólico, os desafios práticos se impõem para a retomada. "Uma das principais fontes de financiamento do bloco é através do cachê das apresentações que fazemos. A impossibilidade de fazer shows nos últimos anos foi uma dificuldade", aponta Bruno, citando a venda de camisas e a busca por patrocínios privados como outras fontes.
Para a Cachorra e o Camaleões, a iniciativa privada é, também, essencial para a folia. "A manutenção financeira é sempre complicada. A gente está buscando apoio na iniciativa privada, com os próprios ritmistas e também nos inscrevemos no edital da Prefeitura, que normalmente apoia nosso bloco", afirma Tiago.
Neste ano, a Prefeitura lançou o Edital de Concessão de Apoio Financeiro aos Blocos de Rua Independentes do Ciclo Carnavalesco de Fortaleza - 2023, que contemplará 50 projetos com um valor total previsto de R$ 650.000,00. Até o fechamento desta matéria, a chamada seguia em aberto.
Denis aponta os recursos privados como responsáveis pelos investimentos "pesados" do bloco. "Comprar as camisas, manutenção dos instrumentos, pagar os convidados, tudo isso a gente recebe da iniciativa privada diante de patrocínios", explica.
"No entanto, é impossível fazer uma festa da magnitude do pré-carnaval e do carnaval sem o apoio do poder público, não só financeiro, mas institucional, de segurança, limpeza, estrutura e organização", ressalta Bruno. Para Denis, o papel da Prefeitura "tem crescido muito em relação ao Pré-Carnaval e ao Carnaval". "Hoje, já é um evento concretizado. Estava em crescimento antes da pandemia e acho que tem tudo pra voltar com força total", confia.
Na avaliação de Bruno, porém, o lançamento das chamadas poderia ter tido "mais antecedência". "Isso facilitaria no planejamento e organização dos blocos", defende. "A gente apoia a Prefeitura e acredita que eles fazem um bom trabalho. Vamos sempre reclamar um pouco que demora, que a gente vai receber a verba em cima do pré-carnaval, tem uma certa burocracia na prestação de conta, mas de modo geral trabalhamos juntos para fazer o Carnaval", compreende Tiago.
Cheiro de Iracema: inspirações e desafios
O Bloco Cheiro foi um dos mais tradicionais da folia carnavalesca de Fortaleza. A agremiação, porém, perdeu o presidente e principal figura, Valdemir Borges, falecido em 2022. A comunidade do entorno, na Praia de Iracema, optou então por se juntar para homenagear as memórias das festas passadas e do eterno brincante com a criação do bloco Cheiro de Iracema.
"O Bloco Cheiro era da comunidade aqui da Praia de Iracema há mais de 30 anos, é um dos pioneiros, conseguiu colocar na rua até 3 mil pessoas, de idosos a crianças", contextualiza Ribamar Silva, integrante da antiga e da nova agremiação.
Amiga de Valdemir e também membro do Cheiro, Ednea Caetano Buzar assume a presidência do Cheiro de Iracema, criado por mobilização coletiva de moradores da região do antigo bloco, nos arredores da rua Dr. Atualpa Barbosa de Lima. "São os mesmos brincantes, a mesma comunidade aqui da Praia de Iracema", divide Ribamar.
Apesar do histórico do Cheiro original, o Cheiro de Iracema desfilará nas ruas da Capital como uma agremiação estreante. Por isso, ele não pôde concorrer ao edital do Ciclo Carnavalesco 2023 da Prefeitura, como explica Ribamar.
Conforme a Secultfor, é preciso que agremiações novatas desfilem por dois anos para poderem concorrer ao apoio financeiro. "O edital que prevê tais definições foi aprovado em assembleia geral com as agremiações, informa a pasta.
"O bloco está indo com a ajuda dos próprios vizinhos da redondeza. Pessoal está ajudando a cobrir as despesas, que são muitas, a Ednea também está bancando com a ajuda de amigos. O bloco vai sair na boa vontade dos brincantes e dos amigos da comunidade da Praia de Iracema", afirma.
"O pessoal sentiu muita falta com essa pandemia. Ano passado teve um movimento para voltar, mas não deu certo, infelizmente, mas agora está todo mundo ansioso para voltar ao Pré-Carnaval e sair brincando nas ruas aqui da Praia de Iracema", confia.
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