Em mais um ano Leandro se reunirá com amigos que conhece há duas décadas. A amizade se estende por tempo e por espaço - mesmo que alguns morem em locais diferentes, a distância não impede o grupo de celebrar a cada ano a união e o Natal no dia 25. “Extensão dos laços familiares”, afirma.
Para a família de Raquel, o Natal é uma data muito importante - e regada a bastante música. O espírito de diversão contagia os presentes, que seguem a tradição de celebrar o Natal há muito tempo - são tantos anos que houve até uma edição com amigo secreto de itens de farmácia. “Nós nos divertimos, fazemos daquilo um momento alegre”, compartilha.
Quem também se anima com a possibilidade de encontrar familiares é Yêda. Em seu Natal, não é raro ver cerca de 50 pessoas juntas para a ceia, entre avós, tios, primos, sobrinhos e até agregados. Para ela, uma das melhores partes da festa é “a alegria de reunir uma família muito grande em uma só ocasião” e celebrar “a sensação de pertencimento”.
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Sophia, filha de Suiany, já tem boas lembranças para guardar do Natal com sua família. As cerimônias também são marcadas por troca de presentes, orações, canções e alimentos preparados por familiares para a ceia. “Celebrar o Natal significa a promessa de um novo ciclo, um recomeço”, compreende Suiany.
As histórias acima pertencem a pessoas e rotinas diferentes, mas, mesmo compostas por “núcleos” diversos, carregam consigo características em comum. Seja com amigos ou familiares, quem “lidera” essas narrativas busca continuar celebrando o Natal e manter uma tradição que ultrapassa a troca de presentes e toca no simbólico: a união e o amor.
Para religiosos ou não, o fato é que essa é uma data há muito tempo preenchida pela ideia de confraternização, ao mesmo tempo que serve para seus participantes refletirem sobre as escolhas e ações tomadas ao longo do ano. Se nos últimos a marca principal estavam sendo os resquícios da pandemia, neste é possível vislumbrar outras questões no imaginário coletivo. “A fé, a esperança e a solidariedade são os pilares desse espírito natalino”, como destaca Suiany.
Mais um Natal se apresenta no calendário e mais uma vez famílias se reunirão para compartilhar seus laços. Os enredos, porém, são diferentes, pois cada indivíduo carrega as próprias visões em torno da data. Neste ano, o Vida&Arte apresenta histórias de pessoas que se reúnem em diferentes quantidades e núcleos para celebrar a união e injetar esperança em um novo ano que se aproxima.
Sempre juntos
O que já tinha um significado muito importante promete ser ainda maior em 2023. Uma reunião em família, sim, mas em outro contexto - afinal, é neste ano que o arquiteto e produtor de eventos Leandro Pinto, 23, comemora duas décadas de amizade com o grupo de amigos que carrega desde Nova Russas, município localizado a 311 km de Fortaleza.
Não importa o que aconteça, é na cidade onde se conheceram que os amigos tentam passar o Natal juntos. "Essa data é importantíssima porque a gente celebra, além do Natal e da união, os 20 anos do nosso 'grande encontro', digamos assim", relata Leandro. A festividade entre amigos já virou tradição e ocorre anualmente em Nova Russas.
A amizade começou no colégio, ainda na infância, e até hoje "segue firme e forte". Muitos do grupo foram morar em Fortaleza para estudar e alguns, na época da faculdade, ingressaram em cursos em outros estados, como Bahia e Rio de Janeiro. Mesmo assim, as distâncias e as rotinas não separam eles.
"Sempre nessa data estamos juntos celebrando, nos reunindo e confraternizando na cidade onde todo mundo nasceu e viveu a infância", afirma. Quando os amigos de Nova Russas se reúnem na festividade, alegria é o que não falta: além de brincadeiras, a cerimônia conta com a premiação dos "melhores do ano", com um levantamento de quem mais se destacou em categorias específicas.
Para Leandro, as duas formas de celebrar o Natal - seja com amigos ou com a família - são importantes, e a amizade acaba sendo uma extensão dos próprios laços familiares. Geralmente, os encontros do grupo ocorrem no dia 25, um dia após se reunirem com suas famílias.
"Nós somos uma família. É muito importante celebrar esse momento porque, apesar do vínculo muito forte, de sairmos e nos falarmos com frequência, às vezes nem todos estão presentes nem conseguem participar. Há amigos que moram fora e só conseguem estar aqui nessas datas mais festivas", aponta.
A grande família
"É uma festa que só faz conta de multiplicação", afirma Yêda Baquit, 34, ao lembrar da quantidade de pessoas presentes nas tradicionais celebrações natalinas de sua família. Avós, tios, primos, sobrinhos ou agregados: são vários os encontros gerados a partir da data especial. A estimativa? Segundo a arquiteta, aproximadamente 50 pessoas costumam comparecer.
"Não me recordo de não termos comemorado juntos. Sempre foi uma data especial para a nossa família!", compartilha ao lembrar que celebra o Natal com toda a família desde quando era criança. A empolgação com a festividade é tanta que não se resume a apenas um dia do calendário, já que se reuniu em torno do evento também na semana anterior à "data oficial".
Geralmente há um rodízio do local que receberá a família. O "jantar árabe de todo Natal" é comandado por uma funcionária que trabalha para a família de Yêda há mais de quatro décadas. Ela destaca como é legar ver "a tradição passada de geração para geração" diante das diferentes edições da festa.
Mas, então, o que acontece no Natal dos Baquit? A arquiteta garante: tem amigo secreto, amigo da onça, "muita bagunça" e banda. A animação toma conta do ambiente, sem dúvidas. Diante de tantas atrações, o que mais se destaca para Yêda? "A alegria de reunir uma família muito grande em uma só ocasião e a sensação de pertencimento", ressalta.
O Natal também é uma data importante para Yêda pelas memórias de edições passadas com sua família: "Há a lembrança de quando meu avô era vivo e nos reuníamos na casa dele, nostalgia de quando éramos crianças, quando fazíamos coral com todos os primos fantasiados com roupas de Natal".
Para ela, celebrar o Natal é sinônimo de "celebrar a fé, a vida e a família". Ela também ressalta o "privilégio de viver em fartura e união". Para este Natal, Yêda aponta as suas expectativas: "Manter a tradição de todo Natal e a família reunida celebrando com muita alegria".
Sorriso em família
Para a servidora pública estadual Suiany Rodrigues Câmara, 43, o Natal deste ano chega com expectativas que se deparam com as realidades vividas nos anos anteriores: a estima de todos estarem com saúde e presentes fisicamente. Como narra Suiany, isso não foi possível diante dos anos de pandemia.
O cenário agora é outro, de um quadro bem mais positivo. A tradição de celebrar o Natal, com as parcerias do marido, Hamilton Soares, e da filha, Sophia, seguirá sendo resgatada.
"Tentamos preservar essa tradição até hoje com algumas adequações, como o Natal dos primos, o encontro virtual com os parentes que moram em outros países, além do jantar presencial do dia 24 e almoço do dia 25", conta Suiany.
A preparação começa bem antes, ainda em novembro, com a montagem da árvore. "Fazemos durante o mês de dezembro diariamente o calendário do advento. Dividimos com os participantes a preparação da ceia, das brincadeiras, das orações e canções, bem como da preparação da casa no dia. No dia 24 fazemos uma pequena celebração de agradecimento com orações e músicas e alguém se veste de papai Noel para entregar os presentes às crianças", caracteriza Suiany.
Durante a celebração, é tempo de realizar uma "troca simbólica de presentes". Além disso, cada família leva um alimento preparado especialmente para a ceia. "O Natal nos convida a refletirmos sobre valores universais de empatia, amor ao próximo e gratidão", analisa.
"Celebrar o Natal significa a promessa de um novo ciclo, um recomeço. O verdadeiro significado do Natal é encontrar o divino em nós. A fé, a esperança e a solidariedade são os pilares desse espírito natalino", contribui.
"É muito mais sobre presença do que sobre presente"
Em um ano, árvore de Natal temática de "Star Wars", com enfeites em referência à saga. Em outro, unicórnio, com bolas em alusão à criatura mítica. Esses são alguns dos pequenos "rituais" feitos pela educadora parental Raquel Araújo, 44, para criar memórias afetivas para sua filha em relação à festividade.
Filha do meio de um núcleo com três irmãos, o único período que não celebrou a data com seus pais foi quando esteve morando fora.
"Como os meus pais valorizam muito o Natal, é algo que nos programamos para estarmos sempre presentes", compartilha. Geralmente, a festa é ocupada apenas pelo núcleo central da família, com pai, mãe, companheiros dos irmãos e os netos. A cerimônia é especial por alguns motivos. Um deles é a forte presença da música na noite.
"É um Natal bem diferente das outras famílias por conta da música. É quase como se comemorássemos o Ano Novo. Sempre tem muita animação e muita dança. Nos reunimos na varanda da casa dos meus pais. O que se destaca é a seleção das músicas. Nós nos divertimos, fazemos daquilo um momento alegre", relata.
Nem sempre, porém, foi assim para Raquel. Sua família é de Brasília (DF) e, quando se mudou para Fortaleza, foi acometida pelo luto da perda da avó da educadora parental, que faleceu cerca de seis meses após a instalação na capital cearense. No início, os natais carregavam o sentimento de tristeza pela memória da partida da avó. Depois, entretanto, o ânimo mudou.
"Passou a ser muito animada, muito divertida, sempre com muito amor, carinho, com muitas trocas de mensagens agradáveis uns para os outros. O Natal nunca foi um motivo para nos chatearmos ou lavarmos roupa suja", alega.
Neste ano, devido a um problema de saúde de seu pai, Raquel precisou antecipar a celebração do Natal. Os irmãos, que moram fora do Ceará, vieram visitá-lo para assim continuar a tradição da festividade e proporcionar um evento alegre para ele.
Durante muitos anos a celebração contou com amigo secreto. Depois, passaram a ser brincadeiras, como troca-troca de presentes. Um Natal, porém, chamou a atenção: quando foi feito um amigo secreto com itens de farmácia. "Estávamos passando o Natal na praia e não tinha um shopping para comprarmos presente. Como estávamos sempre indo na farmácia para comprar protetor, hidratante ou remédio, fizemos um amigo secreto de coisas da farmácia. Foi muito engraçado", recorda.
Ela completa: "Tentamos deixar com que o Natal seja muito mais sobre presença do que sobre presentes".