Quantos espetáculos teatrais alguém já perdeu por não ter "sabido" antecipadamente de apresentação? Quantos teatros não conseguiram público por dificuldade de divulgação? É pensando nisso que o gestor e produtor cultural Caio Vidal desenvolveu a pesquisa "Praticante Cultural — o espectador de teatro na cidade de Fortaleza".
O trabalho, publicado em 2025, apura o que influencia na presença e ausência de público nas montagens de teatro de Fortaleza. "A investigação começou com a minha curiosidade sobre o espectador", conta Caio, que passou pelos cursos de Teatro e Marketing. Na amostra levantada pelo pesquisador, apenas 2,1% dos entrevistados estava indo ao teatro pela primeira vez e a maior frequência, 43,3%, é de fortalezenses que costumam desfrutar da linguagem artística uma vez por mês.
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"Meu objetivo era atuar como produtor cultural e comecei a pensar sobre a comunicação com os espectadores. Dentro do curso, na disciplina de Pesquisa de Marketing, percebi que essa metodologia era pouco usada nas instituições teatrais", diz.
No processo, ele se deparou com uma pesquisa desenvolvida por Gisele Jordão, de 2013, que mostra que somente 10% da população consome algum tipo de arte — público que ela chamou de "praticantes culturais": "foi a partir disso que me perguntei quem são os praticantes culturais do teatro em Fortaleza?".
Entre os dados que surpreenderam Caio estão os canais de comunicação usados pelo público para acessar informações sobre teatro, pois mais de 50% dos fortalezenses tem maior parte dos acesso às programações culturais por meio do "boca a boca". Apenas 36% acessam essa divulgação nas redes sociais.
"A comunicação oficial das instituições ainda é pouco efetiva. Muitas vezes, para saber da programação, a pessoa precisa ter um amigo envolvido com o teatro, que indique e compartilhe a informação. A maior parte dos canais institucionais é pulverizada: cada equipamento cultural tem seu próprio perfil no Instagram, e o cidadão precisa seguir todos para saber o que está acontecendo. Isso fragmenta o
acesso", disserta.
Entre as razões de ausências nos teatros, ele argumenta: "Há um certo desvalor em relação à produção local. Nossos teatros também não têm extensão territorial. A maioria dos equipamentos está concentrada no Benfica, no Centro e na Praia de Iracema. As periferias não têm acesso a grandes teatros. Isso se soma a fatores sociais, como preço dos ingressos, falta de transporte público de qualidade e segurança. Tudo isso influencia o acesso". Quando consideramos a disposição para pagar por um ingresso, apenas 23,7% das pessoas estão dispostas a desembolsar acima de R$ 50 e 4% dos entrevistados não pagariam para acessar uma montagem.
Para ele, a desvalorização das artes cênicas se demonstra também estruturalmente. "O Centro da Cidade virou um cemitério de teatros", afirma, lembrando de equipamentos que tiveram atividades comprometidas: Teatro Carlos Câmara, Teatro Antonieta Noronha, Teatro São José, Teatro Emiliano Queiroz.
O que pensam os realizadores?
Da perspectiva de quem comanda os palcos de Fortaleza, a ocupação dos teatros também é uma preocupação. Para eles, conquistar novas plateias é ainda mais difícil na era digital. "Hoje temos concorrência com as telas (televisão, streaming, YouTube e TikTok). Já vi até criança assistindo ao espetáculo pelo celular, filmando o palco enquanto assistia pela tela. É difícil competir", exemplifica Hiroldo Serra, ator, diretor e produtor da companhia de teatro Comédia Cearense.
Há poucas semanas, o grupo apresentava a peça "O Beijo no Asfalto" com sessões lotadas no Teatro Nadir Papi Saboya, mas essa não costuma ser a realidade da Comédia Cearense.
"Contamos com o trabalho de uma assessoria de imprensa, o que não é comum para a gente, já que normalmente não temos recursos para esse tipo de investimento. Hoje temos uma média de público de 35 a 40 pessoas por sessão — é pouco, e não cobre os custos básicos do elenco. Sentimos falta de um apoio mais efetivo da mídia, principalmente na TV", justifica o diretor.
Fixamente, o grupo se apresenta no Teatro Nadir Papi Saboya, mas já teve temporada de quase 30 anos no Teatro Arena — ambos relacionados a escolas particulares de Fortaleza por meio de parcerias. Mas não é somente a esses espaços que o grupo chega. "Mas também já ocupamos muitos outros espaços: Theatro José de Alencar, teatros móveis no Benfica, Teatro Carlos Câmara", destaca Hiroldo, que também reflete as dificuldades de chegar a mais espaços da Capital.
"Mas hoje a realidade dos grupos teatrais é que só se consegue levar espetáculos para a periferia por meio de editais — municipais, estaduais e federais. Esses recursos viabilizam transporte, pagamento de elenco, produção. A Comédia Cearense ainda faz trabalho filantrópico mesmo sem edital, mas é exceção. Sem edital, dificilmente um grupo consegue cobrar ingresso na periferia", diz.
Para Silvianne Lima, atriz e produtora da Cia. Pavilhão da Magnólia, apesar de ter uma plateia fiel nos espetáculos que participa, ainda há dificuldade em atingir o público "fora das bolhas" já consolidadas: "Mas, para isso, precisamos também do apoio do governo, dos equipamentos culturais e da televisão para tornar o teatro
cv mais popular".
"Infelizmente, muitas vezes o valor que recebemos para a realização de um projeto, a exemplo de uma temporada paga, não cobre o valor para a contratação de uma assessoria de imprensa. Quando é um investimento próprio sem apoio de edital, fica ainda mais difícil", complementa a artista, que acredita que o público do teatro é restrito, entre outras razões, pela concentração de estruturas em shoppings e áreas nobres de Fortaleza.
Com 25 anos de trabalho na Cidade, o Bagaceira de Teatro se considera ativo nas redes sociais e reconhece que também existem dificuldades digitais. O artista Ricardo Tabosa, que gerencia o perfil do grupo no Instagram, opina: "É um modelo claramente capitalista, que limita o acesso à cultura, especialmente para quem não dispõe de recursos para impulsionar conteúdos".
"Apesar disso, temos conseguido manter uma comunicação constante e afetiva com o nosso público. É uma busca constante por manter o público informado e garantir que a arte chegue a quem deseja e precisa encontrá-la", acrescenta.
O alcance nas redes sociais é o maior gargalo. A gente cria conteúdo, posta, impulsiona quando pode… mas nem sempre chega a quem precisa ver. É frustrante. Além disso, os meios tradicionais também já não têm a mesma força de antes, acaba que o público parece ter se diluído em vários meios e plataformas e acessá-los é uma missão quase impossível. Exige atenção constante e mudanças de estratégia quase diárias.