O que permanece quando as bagagens finalmente se esvaziam? Essa pergunta conduz "E o Que Resta Sou Eu", espetáculo de dança contemporânea em cartaz no Teatro B. de Paiva, no Hub Cultural Porto Dragão.
Em cena, dois corpos se deslocam por trilhos que não indicam apenas direções físicas - mas afetivas - conduzindo o público por uma travessia entre passado, presente e futuro. Em cena, os atores Igor Lira e Filipe Evans dividem o protagonismo.
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A montagem - produção da Cia de Dança de Itapajé - segue em cartaz com sessões na sexta-feira, 19, e no sábado, 20, às 19 horas, e no domingo, 21, às 18 horas.
A obra parte da ideia da viagem para investigar permanências e desprendimentos. Bagagens surgem como metáforas do que se acumula ao longo da vida e que, muitas vezes, segue sendo carregado mesmo quando já não faz mais sentido.
Em um cenário difuso, o tempo não avança de forma linear: ele se dobra, retorna e se mistura, permitindo que lembranças da infância, escolhas do presente e projeções de futuro coexistam no mesmo espaço cênico.
"A bagagem representa a própria vida: tudo aquilo que acumulamos ao longo do caminho. Às vezes escolhemos o que carregamos; outras vezes, nem tanto. Com o passar do tempo, percebemos que certos pesos permanecem conosco apenas por hábito, medo ou apego e, sem perceber, nos atrasam, nos prendem, nos impedem de seguir. Há coisas que deixaram de ser necessárias, mas seguimos levando porque ainda não sabemos lidar com essa perda", afirma o diretor da Cia de Dança de Itapajé e diretor de produção do espetáculo, Cleber Alves.
As chamadas "estações do tempo" estruturam a dramaturgia como imagens de passagem. Elas marcam ciclos de pausa, avanço e transformação, materializadas no cenário por trilhos móveis que reorganizam o espaço e criam um jogo constante entre presente, passado e futuro.
"As "estações do tempo" simbolizam esse movimento cíclico de atravessar fases, enfrentar climas internos, reconhecer o momento de guardar, de soltar, de partir ou de permanecer. É uma metáfora para os ritmos da vida e para os processos de transformação que nos convocam a olhar para aquilo que carregamos e decidir o que, de fato, ainda precisa seguir conosco", explica Cleber.
Sem oferecer respostas prontas, o espetáculo aposta na criação de um espaço de identificação e escuta. A cena se constrói como um convite para que o público reconheça suas próprias memórias a partir do que é compartilhado em movimento.
"Esperamos que o público se sinta atravessado. Não no sentido de oferecer respostas prontas, mas de abrir espaços internos. A obra cria um ambiente onde cada pessoa pode reconhecer suas próprias bagagens e, talvez, perceber o peso de coisas que carrega há anos sem perceber", elucida Cleber.
"Queremos provocar uma espécie de respiro sensível, um momento em que alguém se dá conta de que não está só nas suas dores, nos seus medos, nas suas histórias", declara o diretor.
A atmosfera atemporal se constrói a partir de um trabalho integrado entre corpo, luz, trilha sonora e cenário, pensados como extensões da dramaturgia e não como elementos acessórios.
"No fim, tudo foi pensado em conjunto: luz, som, dramaturgia e cenário funcionam como camadas que se sobrepõem e dialogam para construir uma sensação de tempo suspenso, uma temporalidade que não é linear, mas afetiva. Nosso objetivo sempre foi criar essa atmosfera de forma sutil, nunca óbvia, permitindo que o público vivenciasse a cena como quem atravessa lembranças", ressalta Cleber Alves.
Ao chegar aos últimos dias de apresentação em Fortaleza, "E o Que Resta Sou Eu" se firma como uma obra que aposta na delicadeza como força estética e política, tratando o corpo como território de memória, escuta e transformação.
Sobre a Cia de Dança de Itapajé
Criada em 2013, a Cia de Dança de Itapajé é um grupo de dança contemporânea do interior do Ceará que atua na criação de espetáculos autorais e na formação de jovens bailarinos. Ao longo de 12 anos, desenvolve ações artísticas e pedagógicas voltadas à democratização do acesso à dança e ao fortalecimento da cena cultural local.
Espetáculo "E o Que Resta Sou Eu"