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Luz no fim túnel: Desenrola promete tirar os mais pobres da "lista suja" do mercado
Reportagem Especial

Luz no fim túnel: Desenrola promete tirar os mais pobres da "lista suja" do mercado

Programa lançado pelo Governo Federal para renegociação mais de R$ 150 bilhões em dívidas de pessoas até dois salários mínimos tenta superar entrave político e é visto como esperança para empresas e consumidores

Luz no fim túnel: Desenrola promete tirar os mais pobres da "lista suja" do mercado

Programa lançado pelo Governo Federal para renegociação mais de R$ 150 bilhões em dívidas de pessoas até dois salários mínimos tenta superar entrave político e é visto como esperança para empresas e consumidores
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A partir deste mês de outubro uma força tarefa patrocinada pelo Governo Federal promete renegociar dívidas de pessoas pobres, tirar 32 milhões de consumidores da “lista suja” do mercado e negociar mais de R$ 150 bilhões até o fim do ano. O programa Desenrola chega à segunda fase, incluindo pessoas com renda mensal de até dois salários mínimos (R$ 2.640) ou inscritos no Cadastro Único (CadÚnico) com débitos de até R$ 5 mil.

Nesta sexta-feira, 29, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, informou que, após a fase de leilões, o Desenrola abateu R$ 126 bilhões em dívidas e o desconto médio chegou a 83%. O desconto máximo chegou a 96% da dívida, beneficiando principalmente as dívidas de cartão de crédito.

Levando em consideração as duas fases do programa, dos R$ 126 bilhões de abatimento, foram R$ 59 bilhões para dívidas de até R$ 5 mil. E outros R$ 68 bilhões abatidos de dívidas entre R$ 5 mil e R$ 20 mil. Vale lembrar que a dívida inicial coberta pelo programa antes dos leilões superava R$ 150 bilhões.

"O programa pode ser considerado um enorme sucesso. Não esperávamos esse resultado, R$ 151 bilhões se transformaram em R$ 25 bilhões com os descontos aplicados", afirmou Haddad.

Apesar dos prazos, tudo depende da aprovação do Congresso. Atualmente, o projeto está no Senado com a promessa de votação na segunda-feira, 2 de outubro. O limite de validade da Medida Provisória (MP) que criou o Desenrola é terça-feira, 3.

Disputas políticas de bastidor emperraram a tramitação, mas, agora, há entendimento entre governo e presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para que o programa não seja prejudicado.

A segunda fase do Desenrola visa beneficiar 32 milhões de consumidores com renda até dois salários mínimos(Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal A segunda fase do Desenrola visa beneficiar 32 milhões de consumidores com renda até dois salários mínimos

Com descontos previstos de pelo menos 50%, o projeto, apesar da disputa política, é visto como uma luz no fim do túnel para consumidores e credores, já que atua em relação às dívidas entre 2019 e 2022, período de pandemia e crise. Agora, parte dos efeitos daquele período são insistentes, como a alta inadimplência.

Em agosto, segundo a Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Ceará (FCDL-CE) e SPC Brasil, esse indicador chegou a 19,2% no Ceará. O percentual é praticamente três vezes maior do que as médias do Nordeste (6,6%) e Brasil (7,2%).

Outro indicador, da Serasa, aponta que 1.283.591 moradores de Fortaleza estão inadimplentes. Ao cruzar os dados com a população estimada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ao fim de 2022, é possível observar um quadro alarmante.

LEIA TAMBÉM: Senadores aprovam Desenrola e limite para juros do rotativo; entenda

Em Fortaleza, existem 1,28 milhão de pessoas inadimplentes. Esse montante representa 52,8% da população. A maioria deve ao setor de utilities (que são contas básicas de água, luz e gás), com 36,55%, aponta Thiago Ramos, gerente da Serasa.

O cenário é ainda mais crítico, pois o dado de população não é estratificado somente com os economicamente ativos, mas inclui crianças - que não podem contrair crédito ou dívidas, por exemplo. Portanto, o percentual real deve ser maior.

 

 

Entenda como vai funcionar a nova fase do Desenrola e as condições para participar

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Desenrola agora vai beneficiar os mais pobres

Nesta nova fase do Desenrola, diversos tipos de contas vencidas podem ser renegociadas - bancárias e não bancárias, o que inclui água e esgoto, energia elétrica e telecomunicações.

No Ceará, Enel Ceará, Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece), além das principais empresas de telecomunicações (Claro, Tim e Vivo) vão participar do programa.

Essa semana foi de leilão junto ao Governo Federal, o que elegerá as empresas e os débitos participantes do programa. Funciona assim: Entre os dias 25 e 27 de setembro, as empresas interessadas no Desenrola participaram da fase de leilão onde os credores irão ofertar descontos para liquidação da dívida habilitada.

Após esse momento, na primeira semana de outubro, as propostas estarão disponíveis para os devedores interessados na regularização dessa dívida.

Oferta de crédito no comércio segue forte em 2023 após impacto da pandemia na economia(Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal Oferta de crédito no comércio segue forte em 2023 após impacto da pandemia na economia

Só pela Cagece, cerca de 149 mil consumidores inadimplentes são elegíveis ao programa e a expectativa do coordenador de Arrecadação e Cobrança da Cagece, Tércio Almeida, é de boa adesão dos clientes habilitados.

"Hoje a Cagece possui um Contas a Receber vencido composto pela sua grande maioria por clientes da categoria residencial (79%) tendo por destaque os padrões básicos e regulares com grandes probabilidades de atendimento ao perfil solicitado pelo programa", explica.

 

 

Desconhecimento sobre o programa preocupa

Apesar da oportunidade que se abre, o nível de desconhecimento das pessoas sobre como vai funcionar o programa é alarmante. O POVO percorreu as ruas do Centro de Fortaleza e conversou com pessoas de diferentes perfis e observou o problema.

Apesar da proximidade do início do programa na Faixa 1, as pessoas aderentes ao público-alvo não conhecem detalhes do programa, como ele funciona, quais as condições. A reportagem abordou mais de uma dezena de pessoas que não sabia os detalhes.

Danielle Silva, 23, acabou de se recolocar no mercado de trabalho como consultora de vendas e conta que está endividada. Ela explica que não conseguiu pagar dívidas de empréstimo e cartão de crédito após ser demitida do trabalho anterior.

Ainda nas primeiras experiências no mercado e ainda inexperiente no trato com as finanças pessoais, espera que o programa de renegociação permita sair da situação de inadimplência.

"Eu pagava minhas contas certinho, mas fiquei desempregada e com diversas coisas para pagar e não consegui. Nunca tive dívidas assim. Acho que o Desenrola vai ser bom", diz a jovem.

 

Para o economista Wandemberg Almeida, do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE), o momento em que o Desenrola é lançado é estratégico, de retomada da economia, permitindo com que a inadimplência retraia e o consumo das famílias se fortaleça.

"Para o consumidor, é a oportunidade de fazer uma boa negociação, limpar seu nome e voltar a ter crédito na praça. Para as empresas é a oportunidade de receber de volta no caixa um recurso tido até então como perdido", analisa.

 

 

Desenrola é oportunidade, mas consumidores precisam estar atentos

Para que esse processo virtuoso aconteça, Wandemberg explica que o consumidor deve estar atento às suas condições financeiras para firmar o melhor acordo com os credores. Para isso, é preciso realizar uma análise e organizar as finanças pessoais.

O mais básico desse planejamento financeiro, detalha o economista, é anotar todas as receitas e despesas, moldando o orçamento familiar conforme as prioridades, cortando os gastos desnecessários ou supérfluos.

Marta Campelo, consultora e conselheira fiscal do Instituto de Desenvolvimento Econômico, Social e Empreendedorismo (Idese), observa que as condições propostas no Desenrola são diferenciadas e abrangentes, o que o torna uma oportunidade para quem é devedor em busca de regularização.

No entanto, pontua Marta, nem pensar em descumprir o acordo firmado. "É importante manter a calma e observar bem as condições na hora da renegociação para não aceitar parcelas que não vão conseguir pagar".

Marta destaca ainda que essa possibilidade negativa culminaria numa dificuldade ainda maior de garantir crédito no futuro ao não cumprir a renegociação feita. "O consumidor vai novamente sofrer as consequências da inadimplência porque o credor vai incluir o nome no cadastro de negativados".

 

 

Dívidas com crediário saltaram na pandemia, mas Top Móveis quer recuperar pelo menos 60% dos débitos


O impacto da pandemia sobre os negócios no varejo foi sensível. O crescimento da inadimplência foi um efeito negativo que gerou muitos problemas ao comércio varejista. No Ceará, a direção da Top Móveis observa o Desenrola como uma oportunidade para que créditos possam ser revistos.

Nadja Freires, coordenadora administrativo-financeiro da Top Móveis
Nadja Freires, coordenadora administrativo-financeiro da Top Móveis Crédito: Samuel Setubal

Segundo a coordenador administrativo-financeiro da Top Móveis, Nadja Freires, a expectativa é recuperar entre 50% e 60% de um valor de R$ 136 mil a partir das renegociações.

O valor é referente às dívidas com o crediário da loja. Ao todo, 207 clientes estão aptos a renegociar as dívidas com a varejista, que atua no Ceará e no Piauí com 34 lojas.

Nadja diz que a Top Móveis enxerga o início desta fase do programa como bem oportuno, já olhando as vendas no último trimestre.

"A renegociação, principalmente para os clientes de baixa renda, vai nos permitir recuperar clientes que estavam à margem do crédito há um bom tempo e com isso tentar melhorar as vendas nos próximos meses", afirma.

Ainda segundo Nadja, além do perfil de renda, o programa deve beneficiar especialmente os clientes que fizeram crediários e vivem no Interior.

Por isso, a empresa tem trabalhado para levar a informação da possibilidade de renegociação. Nos próximos dias devem ser distribuídos panfletos, além de que os funcionários estarão todos bem informados para esclarecer os clientes.

 

 

Expectativa para o consumo no fim do ano é positiva

Dentro do cenário de realização do programa Desenrola, o Índice de Confiança do Consumidor (ICC), calculado pela Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre) variou positivamente em setembro, para 97 pontos, na sexta alta consecutiva. Esse nível de confiança é similar ao registrado no início de 2014.

Já o indicador que mede as avaliações sobre as finanças familiares também registrou variação positiva, de 2,3 pontos, para 74,6 pontos, mantendo-se no melhor resultado desde o período pré-pandemia (76,6 pontos em fevereiro de 2020).

Outro fator positivo no resultado é a perspectiva de consumo nos próximos meses. Segundo os dados, o indicador que mede o ímpeto de compra de bens duráveis subiu 20 pontos desde junho.

Top Móveis espera recuperar créditos ofertados a partir do crediário(Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal Top Móveis espera recuperar créditos ofertados a partir do crediário

Anna Carolina Gouveia, economista do FGV/Ibre, explica que o resultado, similar ao período anterior ao início da crise econômica de 2014, representa um quadro heterogêneo nas faixas de renda.

"Há melhora dos indicadores nos dois horizontes de tempo nas faixas de renda mais baixa e piora das expectativas futuras das famílias com renda mais alta. No mês, o movimento é reflexo da continuidade de fatores positivos na economia, concomitante a um cenário desafiador ao consumidor com juros, nível de endividamento e inadimplência elevados."

A perspectiva para o curto prazo é positiva. "Para os próximos meses, a confiança do consumidor pode voltar a neutralidade dos 100 pontos, caso a tendência atual continue", pontua.

 

 

85% dos brasileiros passaram por desequilíbrio financeiro nos últimos 12 meses

A parcela de famílias brasileiras com problemas financeiros foi quantificado em pesquisa que revela: 85% dos brasileiros admitem ter passado por situação de desequilíbrio financeiro nos últimos 12 meses.

A pesquisa é inédita e foi feita pela Serasa em parceria com a Opinion Box para comparar o uso do dinheiro e os hábitos de finanças pessoas dos brasileiros.

A maioria dos brasileiros afirma que se complicou financeiramente porque gastou mais do que pretendia no mês (21%). A pesquisa ainda aponta que hábitos como renegociar pagamento de alguma dívida (20%) e parcelar a fatura do cartão de crédito (20%) também são comuns entre os consumidores do país.

No Ceará, em relação ao perfil macro, a maioria dos cearenses (51%) diz que têm táticas de controle mensal das finanças. Em comparação aos últimos anos, 54% dos entrevistados afirmaram estar mais otimistas em relação às finanças pessoais do que nos últimos anos.

Apesar disso, o Ceará tem o maior índice do País de endividamento por emprestar o nome, num percentual de 32%.

Os dados revelam que os métodos mais buscados são cartão de crédito, opção assinalada por 55% dos entrevistados, além do empréstimo pessoal (42%).

Outra característica dos cearenses é a utilização de cartão de crédito de terceiros como método mais popular de parcelamento entre os consumidores. Um montante de 43% dos consumidores do Ceará assumiram esse posicionamento em relação às finanças. Por outro lado, apenas 8% utilizam cartão de crédito próprio em parcelamentos.

Atualizado às 15h30min

 

 

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Renegociações do Desenrola são oportunidades valiosas para empresas

Diretora do Ibef Ceará, Ana Flávia Chaves(Foto: João Dijorge/Arquivo Ibef-CE)
Foto: João Dijorge/Arquivo Ibef-CE Diretora do Ibef Ceará, Ana Flávia Chaves

O POVO - O quão importante é o Desenrola para que empresas e financeiras consigam reaver créditos que julgavam estar perdidos pela inadimplência dos clientes?

Ana Flávia Chaves - O benefício é para todos os lados porque a empresa credora vai ter uma oportunidade. Vencendo o leilão ela vai reaver valores, recuperando créditos que estariam perdidos.

O cidadão que está em dívida terá a possibilidade de parcelamento do débito em até 60 meses com uma taxa de juros muito pequena, de 1,99%, o que vai gerar um ingresso financeiro no mercado, capitalizando as empresas e fazendo com que essas pessoas que estavam sem oportunidade a crédito voltem a ter essa oportunidade e equilibrem suas finanças num momento muito importante do ano.

Esses consumidores vão poder aproveitar o 13º salário também para melhorar esse equilíbrio econômico-financeiro pessoal. Pelas regras do programa, estamos falando de dívidas geradas entre 2019 e 2022, que foi um período muito tenebroso para a economia, de pandemia, que impactou muita gente.

*Ana Flávia Chaves é diretora vogal do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Ceará (Ibef-CE)

 

 

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