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Diretor de eólica offshore diz que tem como produzir energia a partir de 2026
Reportagem Seriada

Diretor de eólica offshore diz que tem como produzir energia a partir de 2026

Diretor da empresa BI Energia, investidora do projeto, diz que licença prévia do parque deverá ser concedida pelo Ibama ainda este ano. Primeiras turbinas estarão a 6km da foz do rio Ceará. Segundo ele, comunidades da região já estão informadas e pescadores poderão navegar a 50 metros de aerogeradores em funcionamento - e a 500 m no período das obras
Episódio 3

Diretor de eólica offshore diz que tem como produzir energia a partir de 2026

Diretor da empresa BI Energia, investidora do projeto, diz que licença prévia do parque deverá ser concedida pelo Ibama ainda este ano. Primeiras turbinas estarão a 6km da foz do rio Ceará. Segundo ele, comunidades da região já estão informadas e pescadores poderão navegar a 50 metros de aerogeradores em funcionamento - e a 500 m no período das obras
Episódio 3
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O parque de eólicas offshore em estágio mais avançado para obter o licenciamento junto ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) é o Caucaia BI Energia. O “sobrenome” tem B de Brasil, I de Itália. O empreendimento custará 1,2 bilhão de euros. Segundo o diretor executivo do projeto, engenheiro Lúcio Bomfim, o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) já está em sua terceira versão, após pedidos de ajustes e complementações do órgão federal. Mas agora mais próximo de sair do papel.

"Neste ano a gente consegue fazer a licença prévia, ano que vem consegue terminar o projeto executivo e fazer a licença de instalação. Aí no outro ano poderia começar a obra. No primeiro semestre de 2024 a gente teria condições de começar. No segundo semestre de 2026 a gente estaria com o projeto concluído e gerando energia. Era o nosso desejo", calcula o executivo. A pendência estaria nessas autorizações federais de licenciamento e uso do mar e nos leilões para compra de energia e regulamentações no Congresso Nacional.

Em entrevista ao O POVO, Bomfim afirma que as comunidades de Caucaia e São Gonçalo do Amarante, além de representantes da colônia de pescadores de Fortaleza, já foram inteiradas do projeto e tiveram dúvidas esclarecidas sobre como e onde os equipamentos de produção e transmissão de energia serão instalados.

As reuniões nas praias de Caucaia, segundo o diretor, teriam se estendido a pescadores, kitesurfistas, bugueiros, moradores, donos de hotéis e pousadas. "Tudo pra explicar o que era esse projeto offshore, onde ele passaria a linha de transmissão, onde seria a subestação, como eram os impactos de tudo isso", aponta o executivo. "Passamos o projeto também para o chefe de gabinete do prefeito José Sarto, para que a comunidade de Fortaleza também acompanhe".

Lúcio Bomfim, diretor da eólica offshore Caucaia BI Energia(Foto: Beatriz Boblitz)
Foto: Beatriz Boblitz Lúcio Bomfim, diretor da eólica offshore Caucaia BI Energia

Segundo Bomfim, o Ibama pretende fazer um estudo socioeconômico com as comunidades costeiras do Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul, para avaliar o impacto das eólicas offshore. A informação foi repassada a ele pela diretoria do órgão, em reunião no início de maio. O levantamento ainda não tem data para começar.

O CEO da Caucaia BI Energia assegura que os pescadores, futuramente, poderão passar com suas embarcações por dentro dos parques eólicos, mas com aproximação limitada a 50 metros de cada torre em funcionamento. Durante as obras, poderão chegar perto até 500 metros das turbinas em instalação.

O complexo offshore de Caucaia, com previsão de aproximadamente 50 aerogeradores, será justamente o mais aproximado da paisagem de Fortaleza, entre os 11 com territórios demarcados no mar cearense. O Caucaia BI Energia estará 6 km a oeste da foz do rio Ceará. A seguir, íntegra da entrevista.

O POVO - As comunidades costeiras se queixam de que não estão sendo informadas, nem procuradas nem inseridas nas discussões dos projetos das eólicas offshore. Como está sendo esse trabalho?

Lúcio Bomfim - Nós temos esse projeto de Caucaia que hoje é o mais avançado em termos de estudo de impacto ambiental junto ao Ibama. Ele foi o primeiro a dar entrada, em 2016. Já tivemos duas revisões pelo Ibama, eles pediram complementações nas duas vezes e estamos fazendo a terceira versão do estudo nesse momento. Em função do que você está falando, nesse último agora, da orientação do Ibama, eles pediram que a gente fizesse uma pesquisa socioeconômica mais aprofundada do que a gente tinha feito. A gente teve que procurar todas as comunidades envolvidas não só em Caucaia, que é a área direta, como também em Fortaleza e São Gonçalo do Amarante. Então a gente conversou com as colônias de pescadores dos três municípios.

Em Caucaia, como é um litoral muito grande, tivemos que fazer três reuniões, com o pessoal da Iparana, Cumbuco, Icaraí, para podermos conversar com todos. Com a comunidade dos kitesurfistas, dos moradores, dos hotéis e pousadas, bugueiros. Tudo pra explicar o que era esse projeto offshore, onde ele passaria a linha de transmissão, onde seria a subestação, como eram os impactos de tudo isso. E responder às perguntas e esclarecer para todos eles. Se você tiver oportunidade de poder passar principalmente em Caucaia e São Gonçalo do Amarante. Até na Colônia de Pescadores do Mucuripe nós passamos. A gente não consegue reunir todos, mas grande maioria conseguimos reunir. Para poder explicar, tirar dúvidas e saber as queixas deles, as preocupações. E até às vezes agregar alguma coisa no projeto para que a gente possa ajudar essas comunidades.

OP - Na região de Amontada, Itarema, e pelos relatos que tivemos de Itapipoca, a informação é de que eles não foram procurados por nenhuma empresa. Lá serão quatro projetos que estão bem acelerados.

Lúcio - Tem o Asa Branca, o Qair (Dragão do Mar), o Jangada (Neoenergia) e o Costa Nordeste (Brigadeiro I). Desses quatro que você citou, só tem um que está acelerado, está fazendo estudos, que é o da Qair. O Asa Branca, o do grupo Neoenergia e o Brigadeiro I só fizeram dar entrada no Ibama, preencheram a ficha, mas não fizeram nenhuma ação. Estão aguardando uma melhor oportunidade, uma definição do Governo Federal sobre o que vai fazer. Eles estão aguardando. Marcaram o território, disseram 'vou estudar aqui', mas não começaram nenhum estudo. Acho que a comunidade se preocupa porque vê as notícias, né? Mas o único lá (da região) de Amontada, em Acaraú, é o da Qair. Inclusive já fez algumas reuniões públicas lá, eu assisti a uma pela internet (em março deste ano).

Lúcio Bomfim, diretor da empresa BI Energia, investidora do projeto da eólica offshore em Caucaia.(Foto: Beatriz Boblitz)
Foto: Beatriz Boblitz Lúcio Bomfim, diretor da empresa BI Energia, investidora do projeto da eólica offshore em Caucaia.

OP - O senhor diz que não tem por que a comunidade se preocupar?

Lúcio - É porque como você falou de quatro (projetos), "tem quatro aqui mas ninguém procurou a gente". Só quem procurou foi a Qair porque ela está fazendo estudo (de impacto ambiental). Os outros três só disseram "eu vou estudar", mas não começaram o estudo. No dia que eles forem fazer qualquer estudo de impacto ambiental, eles são obrigados pelo Ibama a fazer essas pesquisas socioeconômicas e a conversar com as comunidades. Dizer como vai se dar o projeto, como vai ser a entrada do cabo submarino, onde vai passar, quantas turbinas serão, qual a distância da costa, qual o tamanho das turbinas, qual o impacto visual que vai ter. Tudo isso você tem que esclarecer para a comunidade.

OP - Uma das dúvidas que os pescadores mais trazem é "minha jangada, meu barco artesanal ou de médio porte, vai poder transitar por entre as torres"?

Lúcio - Com certeza, com certeza. A Marinha tem a Normam-11 (Normas da Autoridade Marítima para Obras, Dragagens, Pesquisa e Lavra de Minerais sob, sobre e às margens das Águas Jurisdicionais Brasileiras). Até fevereiro deste ano, a Marinha tinha uma Normam 11 que dizia que as embarcações só poderiam se aproximar até 500 metros do perímetro do parque. Isso causou um problema seríssimo no Brasil inteiro. Porque você falar do perímetro, as publicações de normas internacionais citam que uma embarcação não pode se aproximar a 500 metros da turbina quando ela está sendo implantada. Quando está o navio parado, descendo a fundação, colocando a turbina. Naquele momento da operação, a 500 metros é a distância que os órgãos internacionais pedem que as embarcações transitem.

Quando as turbinas estão instaladas, as publicações dizem que podem se aproximar até 50 metros. Isso é o que existe lá fora. A Marinha do Brasil foi fazer a Normam e colocou a 500 metros do perímetro. Se você tivesse dois, três parques do lado um do outro, como é lá no Acaraú, o jangadeiro para ir pescar não poderia passar por dentro. Teria que dar a volta. Imagina um parque que tem cinco, seis quilômetros de distância das turbinas, ficaria muito difícil. Mas eles corrigiram. Nós tivemos contato com a Marinha, fomos ao Rio de Janeiro com a diretoria de Portos e Canais, mostramos o que estava errado e eles fizeram uma nova publicação em março. Publicaram outra Normam corrigindo isso, dizendo que poderia até ser menor que 500 metros, mas da turbina, e não do perímetro.

OP - Como vai ser no período da obra, de aproximadamente dois anos, quando o parque estiver sendo feito?

Lúcio - A empresa quando vai fazer um parque desses, o nosso tem 50 turbinas, não vai botar 50 turbinas ao mesmo tempo. Vai botar uma turbina, depois que instala uma, vai para outra, depois vai para outra. Enquanto ele estiver na (implantação da) turbina número um, a jangada ou qualquer navio estão impedidos de se aproximar mais perto que 500 metros. Quando ele terminar a número um e for para a dois, a número um passa a ter 50 metros de distância e a número dois 500 metros enquanto ele está implantando. Implantadas as 50 turbinas, qualquer barco, qualquer jangada pode passar no meio do parque.

"Quando ele terminar a número um e for para a dois, a número um passa a ter 50 metros de distância e a número dois 500 metros. Implantadas as 50 turbinas, qualquer barco, qualquer jangada pode passar no meio do parque."

OP - Qual vai ser a distância de uma turbina para outra?

Lúcio - 880 metros, estou falando do meu projeto.

OP - Tem parques com maior e menor distância entre uma turbina e outra?

Lúcio - Eu não conheço o detalhe dos outros. Vou falar pelo meu projeto. São quatro linhas. Da primeira linha do lado direito, a que fica mais perto de Fortaleza, na foz do rio Ceará, que vamos tomar como referência, pro lado oeste (à esquerda) tem 2,4 km de distância da primeira linha pra segunda. Da segunda para a terceira linha tem 3,4 km. E da terceira para a quarta tem 4,4 km. Vai aumentando 1 km (na distância entre as linhas de aerogeradores). Dentro de cada linha varia de 10 turbinas até 18 turbinas, que é a última linha de turbinas. Entre elas, na mesma linha, são 880 metros. Você pode ter uma jangada, um barco de pescador, ele pode passar no meio.

O que vai acontecer quando estiver com todas as turbinas implantadas? A base das turbinas tem uma estrutura metálica e em volta delas têm pedras, que se coloca para fazer os molhes, os espigões na base. Aquilo ali gera um coral. E quando se tem coral os pescadores chamam de marambaia. Que atrai peixes. E nós fizemos pesquisa com os pescadores. Eles estão indo pegar peixe muito mais distante da minha área onde vou implantar meu parque. Porque não tem mais grande quantidade de peixes perto da costa, estão indo cada vez mais longe. Quando as 50 turbinas estiverem instaladas com 50 corais, vai voltar a ter peixe muito mais perto para os pescadores do que a distância que tem hoje.

OP - O Parque Caucaia BI Energia vai ser perto da foz do rio Ceará?

Lúcio - Ele começa a 6 km da foz do rio para a primeira linha de turbinas, que fica no Pacheco. Depois vem 2,4 km, 3,4 km e 4,4 km.

Primeiras turbinas eólicas offshore do projeto Caucaia Bi Energia serão instaladas a 6 km a oeste da foz do Rio Ceará, em frente à praia do Pacheco. Na imagem, foz do rio Ceará(Foto: Aurelio Alves)
Foto: Aurelio Alves Primeiras turbinas eólicas offshore do projeto Caucaia Bi Energia serão instaladas a 6 km a oeste da foz do Rio Ceará, em frente à praia do Pacheco. Na imagem, foz do rio Ceará

OP - Ficarão de frente para o nascente?

Lúcio - Isso, as turbinas ficam girando de frente para o nascente. As linhas de turbinas vão se afastando para o poente.

OP - Então seu parque é o que estará mais próximo da paisagem de Fortaleza.

Lúcio - Isso. As primeiras turbinas ficam a 6 km da costa, para o fundo do mar. E a última fica a 18 km.

OP - O Ibama estabelece uma distância mínima da costa?

Lúcio - Na análise que eles fizeram do primeiro estudo de impacto que entreguei, eles citaram 8 km no mínimo. Mas já tem publicação de pesquisador que fala em 10 km, tem outro que fala em 11 km, mas não tem uma determinação de quantos quilômetros nem a nível internacional. Não tem nenhum trabalho que diz quantos quilômetros devam ser no mínimo. Essas turbinas quando foram instaladas lá pela Dinamarca, na Alemanha, elas ficavam a 2 km da costa. Depois foram se afastando, foram implantando mais parques, hoje estão a 100 km de distância.

OP - O senhor falando em nome da entidade que reúne as empresas de eólicas offshore, como vai ser essa comunicação com as comunidades que não estão sendo contatadas?

Lúcio - Estou falando pelo meu projeto de Caucaia, eu fiz meu dever de casa. Conversei com todas as comunidades. Se você for lá, com certeza vai ter melhor relato. Hoje as pessoas já identificam "o projeto dos italianos", "o projeto das turbinas no mar". Se perguntar nos bares, hotéis, pousadas, bugueiros, pescadores, todo mundo já identifica. Talvez em Itarema, Acaraú, a coisa ainda precise dar uma melhorada.

OP - Qual o valor investido na eólica offshore de Caucaia?

Lúcio - É 1 bilhão e 200 milhões de euros. Dá cerca de 6 bilhões de reais.

"Você vai ver as turbinas no tamanho de 1 centímetro. Pela distância que as turbinas vão estar. Tem gente que gosta de contemplar as turbinas, tem gente que não gosta. A gente também colocou no estudo de impacto ambiental os impactos visuais"

OP - Você tem mais dados do projeto?

Lúcio - A gente fez a reunião com os pescadores do Mucuripe porque a área de influência indireta é Fortaleza e São Gonçalo do Amarante. E influência direta é Caucaia, nosso parque fica de frente para a costa de Caucaia. E os pescadores podem sair do Mucuripe e ir lá para a direção do Cumbuco. Tivemos reunião com eles para explicar. Estivemos com o secretário da Executiva Regional, passamos o projeto também para o chefe de Gabinete do prefeito José Sarto. Tudo isso é para que a comunidade de Fortaleza também acompanhe. A gente tem um software, que trouxemos da Itália, onde fazemos a simulação da turbina que fica a 150 metros de altura da estrutura náutica, a 175 metros do nível do mar e você estando no Mucuripe, Praia de Iracema, ponte do rio Ceará, Icaraí, Cumbuco, como é sua perspectiva para ver as turbinas no mar. Você vai ver as turbinas no tamanho de 1 centímetro. Pela distância que as turbinas vão estar, isso para mostrar o impacto visual. Tem gente que gosta de contemplar as turbinas, tem gente que não gosta. A gente também colocou no estudo de impacto ambiental os impactos visuais também.

OP - Qual a previsão para que a primeira turbina do parque de Caucaia seja instalada?

Lúcio - Você fez a pergunta de 1 bilhão de dólares. Se você me perguntar: no seu desejo você teria condição de quando? Eu dependo de Governo Federal me autorizar a usar o mar. Dependo do interesse do governo federal de querer fazer leilão para comprar energia gerada por esse parque. Faz de conta que tá tudo liberado e você pode fazer. Eu posso começar no primeiro semestre de 2024 o nosso projeto. Porque neste ano a gente consegue fazer a licença prévia, ano que vem a gente consegue terminar o projeto executivo e fazer a licença de instalação. Aí no outro ano poderia começar a obra. No primeiro semestre de 2024 a gente teria condições de começar. E a gente levaria 2024, 2025 e terminaria em 2026. No segundo semestre de 2026 a gente estaria com o projeto concluído e gerando energia. Era o nosso desejo.

OP - Essa então é uma projeção, mas depende de vários fatores?

Lúcio - Do governo, dessa regulamentação do decreto presidencial, da lei que está circulando no Senado e na Câmara. Tem tudo isso aí que está em jogo. Qualquer projeto que for implantado no país, da forma como vier, terá que ter licença de instalação e estudo de impacto ambiental. Então nós estamos seguindo com nossos estudos, não paramos. Mas deixa eu dar uma informação. Em contato com o Ibama, estive em Brasília por esses dias. Tivemos dois eventos no Senado e no Ministério das Minas e Energia. Conversando com a equipe do Ibama, eles estão se programando para fazer um estudo socioeconômico para conversar com as comunidades de pescadores de todo o Brasil. Principalmente Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul. No Rio Grande do Sul é onde tem mais projetos apresentados. E nesses três estados do Nordeste tem uma grande quantidade e eles querem fazer essa pesquisa. Estão se programando para saber como vão fazer e passar nas comunidades para conversar, se antecipando aos estudos socioeconômicos que cada empresa terá que fazer.

OP - E quando será?

Lúcio - Isso eles não disseram. Eles estão fazendo os estudos e o cronograma de atuação. É já que devem comunicar isso.

 

 

 

 

“Impacto das eólicas offshore no ambiente não é significativo”

“A gente tem percebido a nível mundial que o impacto que as eólicas offshore provocam no ambiente que elas interagem não é significativo”, garante o presidente da Câmara Setorial de Energias da Agência de Desenvolvimento do Ceará (Adece), Joaquim Rolim. A resposta veio ao ser inteirado sobre o nível de desinformação de comunidades costeiras do litoral oeste cearense, de relatos colhidos in loco pelo O POVO em relação aos 11 projetos que pleiteiam licenciamento para se instalarem no mar local. Desses, sete estão previstos para a costa oeste.

A Câmara Setorial é um órgão colegiado, vinculado à Adece, que faz a interlocução da gestão estadual com o segmento empresarial, através de propostas, apoio e acompanhamento de projetos de desenvolvimento sustentável. Segundo ele, um grupo de trabalho (GT) dentro da Câmara Setorial tem discutido as demandas do setor das eólicas offshore. “Vou inclusive verificar no plano de ação em desenvolvimento se consta essa campanha de comunicação, de melhor informação. Se não constar, vou sugerir que seja incluído pra gente ampliar”, descreveu Rolim.

 

"É claro que tem que ter os cuidados ambientais, é o que estamos buscando. Entendemos que a geração eólica offshore seja complementar às demais fontes existentes no Brasil, e irá contribuir com energia limpa e renovável, além de gerar emprego e renda com qualidade, e impactos ambientais não significativos para as comunidades, além de contribuir para o desenvolvimento local", defende o presidente da Câmara Setorial de Energias.

Para ele, “a preocupação com as comunidades e as informações são primordiais para evitar maus entendimentos”. O POVO tentou contatar o empresário Lauro Fiúza, que preside o GT das eólicas e é um dos investidores do projeto para o Complexo Eólico Marinho Dragão do Mar (CEMDM), em Acaraú. A reportagem foi informada que Fiúza estava viajando pelo exterior em compromissos particulares.

 

Um dos principais diferenciais do Ceará para os projetos de eólicas offshore, segundo Joaquim Rolim, é o potencial eólico local em relação à média mundial. É o que os técnicos chamam de Fator de Capacidade. No Ceará, um aerogerador marinho de 10 Megawatts (MW), a 150 metros de altura, tem fator de capacidade médio de 62% (6,2 MW). O mesmo equipamento na Europa tem produção média de 37% (3,7 MW).

Os dados constam no Atlas Eólico e Solar do Ceará, ferramenta do governo estadual que mostra o mapeamento de áreas que seriam mais propícias para investimentos em projetos de geração eólica e solar fotovoltaica no Estado. É uma das principais fontes de consulta para o mercado de energia que mira o mar e quer colher os ventos cearenses. O Atlas é bilíngue (inglês e português) e está em versões impressa, online ou por aplicativo.

 

 

Japão tem aerogerador flutuante

Durante a Cop26, Conferência Mundial do Clima realizada em Glasgow, no Reino Unido, em novembro de 2021, um dos estandes visitados pela comitiva do governo do Ceará foi o do Japão. No local, o interesse foi para o projeto de um aerogerador flutuante. Denominado de Haenkaze, o equipamento começou a ser implantado em 2013, funciona desde 2015 e está instalado ao lado do porto de Sakyiama.

Imagem da eólica offshore flutuante instalada no mar do Japão, com capacidade instalada de produzir 2MW de energia(Foto: divulgação haenkaze.com)
Foto: divulgação haenkaze.com Imagem da eólica offshore flutuante instalada no mar do Japão, com capacidade instalada de produzir 2MW de energia

A potência máxima é de 2 MW de energia. A turbina mede 172 metros, mas 76 deles ficam submersos e a torre, apenas ancorada, não toca o fundo do mar. Boia com seu peso de 3.400 toneladas. A estrutura flutuante é de aço. A Haenkaze hoje está em atividade a 5 km da costa japonesa. Inovadora, e em desenvolvimento, por enquanto ainda é única.

Joaquim Rolim, presidente da Câmara Setorial de Energias da Adece, era um dos membros da comitiva de gestores e empresários cearenses. “Esse projeto (da eólica flutuante) é muito representativo. É um caso real. Fica ao lado de um porto de pesca. Nessa base debaixo d’água está repleto de corais de peixe, de vida marinha”, defende. “As conclusões que o projeto obteve é que os impactos são mínimos, não relevantes. Mostra que para os pescadores pode ser até benéfico".

 

 

 

Aglomeração de offshores influenciam produção de parques vizinhos; redução chega a ser de 25%

Os 11 projetos de parques eólicos offshore no Ceará chamam atenção pela proximidade de suas áreas demarcadas. Alguns desenhos dos futuros complexos aparecem inclusive em sobreposição entre eles, conforme os pedidos de licenciamento apresentados ao Ibama. Estudo de cientistas de uma universidade da Alemanha, publicado em junho do ano passado na revista científica Nature Scienfic Reports, alerta o quanto os complexos eólicos instalados muito próximos dentro do mar comprometem o desempenho uns dos outros.

Na aferição dos cientistas, a redução de um parque para outro chega a ser de 20% a 25% na produtividade, mesmo que a distância entre eles seja de 35 a 40 km. "Pode equivaler à potência de 1 a 2 megawatts (MW)", diz o estudo. No Ceará, há previsão de parques vizinhos muito mais próximos que isso. O trabalho foi desenvolvido por pesquisadores da Helmholtz-Zentrum Hereon, um centro de pesquisa interdisciplinar da cidade alemã de Geesthacht. A queda de produtividade dos aerogeradores é chamada de efeito esteira, mas esse estudo é um dos que apontam um período mais longo de acompanhamento.

O estudo do centro de pesquisa alemão foi feito nas águas do norte da Europa ao longo de dez anos. A região é conhecida como Mar do Norte e têm a maior aglomeração de parques eólicos instalados ou de projetos em desenvolvimento do Velho Continente. A cada novo parque inserido, foi sendo notada a redução do fator de capacidade - o nível de produtividade das turbinas eólicas.

 

Até 2019, a área reunia 77% dos 22 gigawatts (GW) de capacidade instalada (produção possível) das turbinas offshore da região. Mas deverão ser 450 GW até 2050, a partir das metas defendidas pela União Europeia para redução de gás carbônico. E 47% deles (212 GW) serão no Mar do Norte, sendo 8,8 GW implantados por ano durante a década de 2020.

"Simulamos cenários futuros de parques eólicos considerando offshores existentes e planejados no Mar do Norte e avaliamos as perdas de geração de energia e variações de vento devido à esteira do parque eólico", descrevem os autores do trabalho.O chefe da pesquisa alemã foi o australiano Naveed Akhtar. O modelo usado nos estudos para medição dos ventos foi semelhante ao usado por serviços meteorológicos.

No Ceará, o potencial eólico offshore apontado é de 62% de produtividade média, num aerogerador a 150 metros de altura, contra 37% do território europeu. São dados usados pela Câmara Setorial de Energias da Agência de Desenvolvimento do Ceará (Adece) para "vender" o Estado aos investidores.

Nos outros 43 projetos pelo Brasil (Piauí, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) que também pleiteiam licença para produzir energia do vento captado de dentro do mar, o único Estado sem sobreposição de áreas marinhas demarcadas é Santa Catarina. Justamente pelo fato de o Estado ter somente um projeto apresentado ao Ibama até o momento. No total, os 54 projetos brasileiros apontam a capacidade instalada de 133,3 GW, com cerca de 9 mil aerogeradores.

Parque eólico offshore nas águas da Dinamarca, ao norte da Europa(Foto: Arquivo Vestas/Divulgação)
Foto: Arquivo Vestas/Divulgação Parque eólico offshore nas águas da Dinamarca, ao norte da Europa

- Para ler a íntegra do estudo (em inglês), clique aqui 

- Conheça parques eólicos offshore pelo mundo:

Plataforma reúne informações online sobre 2.553 complexos eólicos offshore em 53 países. São parques planejados, em construção, em operação ou cancelados. Mais detalhes, clique aqui 

- Para acompanhar os pedidos de licenciamento junto ao Ibama de eólicas offshore no Brasil, clique aqui 

 

 

Em doutorado, geógrafo analisou impactos das offshore para comunidades pesqueiras do Ceará


"Se a gente olhar tudo que está sendo veiculado sobre parques offshores, uma hora ou outra fala-se de pesca. A pesca artesanal fica sem holofote", afirma o geógrafo Thomaz Xavier. Em sua tese de doutorado ("Análise participativa dos potenciais impactos socioambientais de parques eólicos marinhos/offshore na pesca artesanal no estado do Ceará, Brasil"), ele analisou justamente a repercussão direta dos projetos eólicos offshore nas comunidades costeiras cearenses. O trabalho foi concluído este ano pela Universidade Federal do Ceará (UFC).

"As comunidades do litoral usam esse mar como extensão dos seus territórios, da sua vida. Usam para seu sustento, sua alimentação, como fonte de renda. Cientificamente falando, a gente precisa produzir, entender e materializar essas relações de sociedade e espaço oceânico, com a inserção desse novo horizonte que são os empreendimentos eólicos por grandes extensões", defende o pesquisador.

Xavier mora em Fortaleza há cinco anos. Veio de uma região brasileira sem mar - é nascido no Mato Grosso. "Há a impressão de que o mar é desocupado, mas o mar já tem diferentes usos. De conservação, temporários, de tráfego de embarcações, rotas, mineração, petróleo. Temos diferentes usos e necessidades que o mar colabora. Esses usos das comunidades são menos perceptíveis".

Thomaz Xavier, doutor em Geografia pela Universidade Federal do Ceará, estuda o potencial impacto das eólicas offshore nas comunidades pesqueiras do litoral cearense(Foto: ACERVO PESSOAL)
Foto: ACERVO PESSOAL Thomaz Xavier, doutor em Geografia pela Universidade Federal do Ceará, estuda o potencial impacto das eólicas offshore nas comunidades pesqueiras do litoral cearense

Uma das conclusões de sua tese é que as embarcações não tenham a facilidade de tráfego dentro do mar, por entre as turbinas e os parques, "porque quem manda na rota da embarcação é o vento". Explica: "Temos uma tendência da adoção de motores de rabeta nas embarcações a vela. Pode haver futuramente uma pressão para os pescadores comprarem esses motores. Porque vão ficar sem a possibilidade de ir para o mar só com vento. Isso seria o próximo impacto, que é aumentar o custo da pesca. É um custo alto que terão que assumir".

Thomaz Xavier levanta aspectos a serem discutidos para o futuro cenário, agora mais próximo, das eólicas offshore no Ceará: "É preciso entender como os pescadores entendem essa perda de território do mar. Qual o impacto no setor turístico? Haverá interesse de um turista em voltar para uma região com a nova paisagem? E como a voz dos atores locais, pescadores, moradores, tendem a ser ativas no processo de planejamento desses parques? Ou tudo é planejado só à distância".

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