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Jean Paul Prates: o nome que trouxe a Margem Equatorial ao centro do debate nacional
Reportagem Seriada

Jean Paul Prates: o nome que trouxe a Margem Equatorial ao centro do debate nacional

De estagiário a presidente da Petrobras, Prates construiu sua trajetória como um dos grandes pensadores e executores de políticas relacionadas ao petróleo e ao setor energético no País, além de conquistar destaque como parlamentar e até como dirigente de futebol

Jean Paul Prates: o nome que trouxe a Margem Equatorial ao centro do debate nacional

De estagiário a presidente da Petrobras, Prates construiu sua trajetória como um dos grandes pensadores e executores de políticas relacionadas ao petróleo e ao setor energético no País, além de conquistar destaque como parlamentar e até como dirigente de futebol
Tipo Notícia Por

 

Ele se graduou em direito e em economia, mas tem como duas maiores marcas de sua trajetória profissional a paixão pela cadeia produtiva do petróleo e o talento para a política.

Seus ápices nesses dois campos foram, respectivamente, o mandato exercido como presidente da Petrobras, entre janeiro de 2023 e maio de 2024, além de senador pelo PT do Rio Grande do Norte, cargo que exerceu entre 2019 e 2023.

Nascido no Rio de Janeiro em 1968, descobriu sua vocação política em terras potiguares, onde trabalhou inicialmente em um planejamento energético na gestão do então governador potiguar Garibaldi Alves Filho (MDB), em 2001.

Dois anos depois, suas ideias que conciliavam a revitalização do setor petrolífero naquele estado com o potencial de desenvolvimento das energias renováveis foram adotadas pela também governadora Wilma de Faria (então no PSB), de quem viria a ser Secretário de Estado de Energia e Assuntos Internacionais. Nesse meio tempo, fixou residência definitivamente no Rio Grande do Norte.

JEAN Paul Prates é reconhecido como uma das 50 personalidades mais influentes do setor energético mundial(Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA JEAN Paul Prates é reconhecido como uma das 50 personalidades mais influentes do setor energético mundial

Em 2013, filiou-se ao PT e em 2018 foi eleito senador da República, mas precisou renunciar ao mandato para assumir a presidência da Petrobras.

Sobre a demissão conturbada disse estar se dando uma “quarentena” antes de falar publicamente, mas destacou os expressivos resultados que a companhia teve em sua gestão e diz ter a consciência de que não lhe faltou competência e nem ética na condução da Petrobras.

Outro ponto controverso durante a gestão Prates foi a questão dos estudos para uma eventual exploração de petróleo na chamada Margem Equatorial, região que se estende do Rio Grande do Norte ao Amapá, ou seja, que passa pelo Ceará.

“O que está sendo tratado é uma licença para um poço exploratório, um poço que fura, acha petróleo, tira um testemunho de rocha e para. Ele não produz petróleo sistematicamente”, explica Prates.

Pier em Paracuru pode favorecer a exploração de petróleo da Margem Equatorial no Ceará(Foto: Deivyson Teixeira, em 3 de abril de 2012)
Foto: Deivyson Teixeira, em 3 de abril de 2012 Pier em Paracuru pode favorecer a exploração de petróleo da Margem Equatorial no Ceará

Porém, nem política nem petróleo ocupam o espaço da esposa Muriele Medeiros, natural de Caicó, a quem ressalta como mulher “aguerrida” e “muito ativa” em sua vida.

Quanto aos filhos, do primeiro casamento lamenta o pouco contato, mas diz aproveitar com qualidade o tempo que consegue ter com eles. Sobre amigos diz ter cultivado grandes amizades no setor energético e mesmo no tempo como senador.

Confira a entrevista na íntegra!

 


O POVO - O senhor foi presidente do Centro de Estratégias em Recursos Naturais e Energia (Cerne) até 2018 e agora retornou como conselheiro. Como o senhor enxerga as transformações dentro do Cerne ao longo desse período?

Jean Paul PratesO Cerne hoje é presidido pelo engenheiro técnico Darlan Santos, que já era membro do Cerne. Ele fazia parte da equipe, egresso do antigo Centro de Tecnologias do Gás e Energias Renováveis (CTGAS-ER), lá no Rio Grande do Norte, do qual fazia parte a Petrobras e também o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). Hoje, saiu a Petrobras do CTGAS, e ele mudou o nome para Instituto Senai de Inovação em Energias Renováveis, ainda na mesma sede.

Nós hoje estamos nos expandindo ao longo da Margem Equatorial. A ideia inicial era trabalhar o Nordeste setentrional entre Pernambuco e Maranhão, mas isso mudou porque as empresas mantenedoras passaram a incorporar a Margem Equatorial como uma visão estratégica de futuro.

A Margem Equatorial, como se sabe, não é um conceito geológico ou petrolífero, é um conceito geográfico. Trata-se da área do Brasil costeira e seus interiores voltados para o Equador, e por conta disso, têm muitas similaridades climáticas, humanas, geológicas e geográficas.

Culturais, de biomas a proteger, desde o Rio Grande do Norte até o Oiapoque, no Amapá. Então, já extrapolamos, digamos assim, as fronteiras do Nordeste setentrional, como era antes. Isso se deu basicamente em função do início do aproveitamento do potencial de exploração da energia eólica offshore, menos do petróleo e mais da própria energia offshore, e de outras fontes que serão exploradas no mar.

O EX-PRESIDENTE da Petrobras defende que a região da Margem Equatorial seja pensada de uma forma mais ampla, para além do potencial petrolífero(Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA O EX-PRESIDENTE da Petrobras defende que a região da Margem Equatorial seja pensada de uma forma mais ampla, para além do potencial petrolífero

A gente vê essa região com muitas coisas semelhantes que precisam ser defendidas e desenvolvidas, tanto do ponto de vista da preservação dos biomas, biomas sensíveis, passando desde a Caatinga, que é um bioma único no mundo, mas também incorporando mangues, dunas, áreas de transição e até florestas, como a Amazônia e outros aspectos sensíveis, só existentes nesta região, mas principalmente os desafios e os investimentos possíveis que precisam ser feitos de forma sustentável, responsável e racional precisam passar por uma união de interesses.

Isso é um pouco discrepante da divisão política brasileira tradicional, como a divisão dos livros de geografia. Nós criamos uma área de atuação que perpassa essas fronteiras devido a uma necessidade e visão de similaridade e de sinergias entre esses estados e seus respectivos Interiores.

Se você extrapolar o conceito, pode estendê-lo até o Panamá, incluindo as Guianas, Guiana Francesa, Suriname, Venezuela, Colômbia, Panamá e todo o Caribe. Tudo isso é Margem Equatorial.

A Margem Equatorial se estende no Brasil do Amapá ao Rio Grande do Norte(Foto: Reprodução Petrobras)
Foto: Reprodução Petrobras A Margem Equatorial se estende no Brasil do Amapá ao Rio Grande do Norte

O POVO - O senhor citou a Margem Equatorial, inclusive, além de nossas fronteiras brasileiras. A gente tem o caso mais emblemático, que é o da Guiana. O que a gente tem a aprender com a Guiana e como o senhor enxerga essa concepção dentro da sociedade brasileira sobre a importância da Margem Equatorial?

Jean Paul Prates - É claro que a gente reconhece que existem duas questões: a sensibilidade ambiental da área, e o argumento de política setorial, segundo o qual se você não desgarrar do petróleo à força, principalmente as empresas de petróleo, elas não deixariam jamais deixariam de buscar novas reservas, explorar e tentar impor uma pauta fóssil como algo ainda necessário.

Esse segundo argumento eu ainda tenho combatido com o contraponto importante: de que não vamos ter uma ruptura energética, nós vamos ter uma transição energética, e essa transição exige um abandono gradual da matriz fóssil, mas que vai se alastrar por pelo menos 50 anos. Ora, em menos de 10 anos você já vai começar a atingir o pico de produção brasileira. Um campo de petróleo novo, um offshore, leva de 8 a 10 anos para ser desenvolvido, ou seja, para ser posto em produção.

Se esperarmos até 2032 e o petróleo se esgotar, e a gente começar a procurar novas reservas, por exemplo, na Foz do Amazonas, vale ressaltar que, em águas profundas, ainda não foi perfurado um poço que tenha dado resultado em óleo.

Quem afirma que há bilhões de reservas ali está especulando, pois não foi furado um poço ainda e nós não sabemos que tem petróleo. Os antigos geólogos sempre disseram, e eu aprendi na escola da Petrobras, lá na década de 80, que você só afirma se tem óleo depois de furar um poço.

Mesmo com toda a tecnologia sísmica 3D, 4D, 5D ou 6D, não há outro jeito de afirmar se tem petróleo, porque o petróleo pode ter migrado e a sísmica não pega esse detalhe.

E aí tem outro aspecto: a Guiana se desenvolveu mais rápido, como era esperado, porque é um país que não tinha nada. Uma economia nova de um novo setor entrando com bilhões e bilhões chegando, não só de investimento, mas também de royalties, mesmo que tendo reduzido o royalty ao mínimo, porque na época eles batiam de porta em porta e ninguém queria ir para lá, quando o primeiro achou óleo, foram necessários mais de 20 poços, não foi no primeiro poço, esse é outro alerta que é preciso fazer, o país obviamente se rendeu àquela ideia de "não tenho outra coisa, eu tenho petróleo, e talvez com o petróleo me desenvolva".

Esse é o argumento. O presidente está ganhando, ele sempre diz isso: "Com isso, vou preservar, vou usar esse dinheiro para preservar, mas vou dar qualidade de vida ao meu povo". Esse argumento, nesse caso, era mais simples, mais imediato. Então, eu não tenho outra coisa, tenho isso, e com isso vou conseguir fazer aquilo.

Litoral cearense também compõe a chamada Margem Equatorial(Foto: AURÉLIO ALVES)
Foto: AURÉLIO ALVES Litoral cearense também compõe a chamada Margem Equatorial

 

Então fechou, é um circuito fechado. O Suriname é a mesma coisa, são países que não tinham nenhum alento, e o petróleo passa a ser isso. Então não tem como você sequer colocar o debate, porque ele é atropelado pela realidade nua e crua do país. No caso da Guiana Francesa, o que aconteceu? A França é uma potência, a Guiana Francesa é um país basicamente subsidiado pelo Estado francês, então você tem voo direto, você recebe camembert se vai ao supermercado da Guiana Francesa, você tem placa de sinalização e a vida como se estivesse em território francês.

Lá, foi feita uma quarentena exploratória, até que se precisasse daquela reserva e quando precisar, vão recorrer a ela. Lá também foi feita a perfuração exploratória, e foi encontrado petróleo, em menor quantidade, mas foi.

O Brasil já encerra um debate muito maior, muito mais complexo, porque é um líder em energia renovável, é um país que já fez sua transição energética quase que sem querer, né?

Esse debate só será dirimido com uma decisão do estado brasileiro. A decisão do licenciamento, como o próprio diretor-geral do Ibama, Agostinho Mendonça, coloca sempre é realmente técnica.

Por que técnica? Aquele furo, naquele lugar, com aquelas condições, com aquelas mitigações e condicionantes que o órgão ambiental precisa colocar, isso é a decisão técnica sobre o poço. Mas a decisão de saber, de querer saber se há petróleo naquela região ou não, e a partir daí montar um programa exploratório completo e, eventualmente, licenciado até a produção desse petróleo, é uma decisão do estado brasileiro, não é uma decisão técnica, é uma decisão do estado brasileiro.

"Quero deixar de fazer uma fase no Amazonas de fora, quero colocar um waiver ali, uma quarentena, como a Guiana Francesa fez, não quero explorar por hora e vou ver o que fazer com isso mais adiante, mas quero deixar sem sequer saber se tem óleo lá". É disso que estamos tratando hoje. O que está sendo tratado é uma licença para um poço exploratório, um poço que fura, acha petróleo, tira um testemunho de rocha e para. Ele não produz petróleo sistematicamente.

O POVO - Nesse sentido, qual a contribuição que o senhor imagina que o Instituto Margem Equatorial, recém-criado, venha a dar?

Jean Paul PratesO Instituto Margem Equatorial nasceu de uma ideia do senador Davi Alcolumbre e minha, nós fizemos uma parceria nos nossos mandatos, fruto daquele apagão que houve no Amapá.

Basicamente, o que se viu, aí eu fui procurar o Davi e disse: "Olha, Davi, no meu estado, no outro extremo da Margem Equatorial, o Rio Grande do Norte, nós partimos da dependência absoluta da produção de petróleo em terra, nós éramos o líder da produção nacional terrestre brasileira, para ser o líder nacional de geração eólica em terra". Então nós fizemos a transição energética.

Eu fui testemunha e protagonista disso, como secretário de energia que conduziu esse processo, e em cinco anos, basicamente em um tempo muito curto, transformamos um estado dependente de petróleo em um estado dependente de energia eólica. E os empregos migraram, nós não perdemos empregos com o fim do ciclo do petróleo, com a diminuição do uso e exploração do petróleo lá.

Já no Amapá, você tem uma situação de desespero energético, porque a cada momento que ocorre uma intempérie ou algum tipo de incompetência na geração hídrica ou no sistema, você fica isolado, sem ter para onde correr.

Claro que vocês vão ter uma solução de curto prazo, que precisa ser dada agora, estou falando de 2019.

Mas, quando passar essa crise, vamos pensar no futuro, vamos tentar sentar e ver o que fazer. Uma das soluções provavelmente será uma parte de geração solar, sem desmatamento, sem necessidade de entrar na floresta.

Uma parte de eólica, porque ali você tem uma boa aposta na energia eólica, mesmo em terra, e nós precisamos começar a medir o potencial eólico offshore, porque não temos a menor ideia de quanto é e qual a diferença em relação à terra, como é um estado todo coberto de mata, com floresta, faz sentido. E aí começamos a trabalhar essa ideia de fazer emendas conjuntas para realizar medições.

Petrobras encontrou petróleo a 2.196 metros de profundidade na Bacia Potiguar(Foto: Cezar Fernandes/Petrobras)
Foto: Cezar Fernandes/Petrobras Petrobras encontrou petróleo a 2.196 metros de profundidade na Bacia Potiguar

Hoje, temos 11 pontos de medição na Margem Equatorial: um em Fernando de Noronha, dois no Rio Grande do Norte, um no Ceará, que vai para dois, um no Piauí, naquele pedacinho de litoral, um ponto no Maranhão, um no Pará e dois no Amapá.

Então, é mais ou menos isso. Isso significa que, em pouco tempo, teremos um atlas eólico offshore da Margem Equatorial, que deve estar pronto agora em dezembro. Fizemos também o Atlas Eólico e Solar do Amapá, para igualar o Amapá ao nível de informação que os outros estados da Margem Equatorial já tinham. Daí nasceu a ideia de criar o Instituto da Margem Equatorial.

O POVO - Queria que o senhor comentasse sobre o Nordeste como protagonista nesse processo de transição energética como a energia eólica e solar e o hidrogênio verde? E a ausência de um marco regulatório em relação à eólica offshore pode atrasar o nosso processo de desenvolvimento dessa cadeia?

Jean Paul PratesComeçando pelo fim, eu acho que não estamos muito atrasados. Esse tipo de marco regulatório, normalmente, suscita não só discussões mais aprofundadas, mas discussões intersetoriais. Existem setores que temem ou acham que a eólica offshore vai diminuir a importância da eólica onshore, o que é um equívoco, pois são indústrias completamente diferentes, com equipamentos, investidores e tamanhos diferentes.

É como no petróleo, se o potencial de petróleo onshore acabar e ir para o offshore, você não tem nem o pré-sal, e não tem produção na Bahia em terra ainda, então não faz sentido nenhum esses argumentos.

Eólicas offshore são uma das apostas para a transição energética no Pais, mas que carece de um marco regulatório(Foto: Fokke Baarsen/Divulgação)
Foto: Fokke Baarsen/Divulgação Eólicas offshore são uma das apostas para a transição energética no Pais, mas que carece de um marco regulatório

Cabe a nós fazer uma discussão madura e racional, agilizar um pouco o processo, porque os investidores já começaram a se animar com a existência da lei em discussão, e não querem perder o momento, mas eu não acho que estamos tão atrasados assim. Eu prevejo que, no início do próximo ano legislativo, teremos essa lei virando lei mesmo.

Falando agora sobre a Petrobras e o Nordeste. No caso da Petrobras, especificamente, a transição energética atrasou, sim, mais de uma década, por questões de gestão e pelos processos pelos quais a empresa passou, mas estamos recuperando esse tempo, pelo menos a parte inicial, deixando a Petrobras completamente preparada, em sua estrutura, para fazer um ingresso no mundo da energia renovável com a escala que lhe é devida.

E com escala, quero dizer em setores e tamanhos condizentes com o que a Petrobras representa no setor de petróleo e gás, não é coisa pequena, não é algo com um consórcio duvidoso, é sempre algo grande, com grandes grifes do setor, e não faltam elas.

Nós assinamos com a Equinor, com a Shell, com a Total Francesa, com parceiros tecnológicos, colocamos nossos centros de pesquisa, os Cenpes, em contato com os melhores centros globais de pesquisa nessa área, inclusive no Brasil.

Então está tudo muito bem encaminhado, agora, a questão é escolher os projetos, montar um portfólio inicial e esperar também o marco regulatório da eólica offshore, que esse é um lugar onde a Petrobrás vai se sentir mais em casa, a Petrobrás é uma empresa offshore, The Offshore Company, que é assim que ela é conhecida lá fora.

No refino, o equivalente é o processamento, é você começar a colocar óleo vegetal nas próprias máquinas, eu chamava de máquinas maravilhosas, que são as refinarias da Petrobrás, nós podemos começar a incorporar uma mistura crescente de óleo vegetal no refino de óleo cru para gerar biocombustíveis híbridos e, eventualmente, puros, e no gás, o equivalente ao hidrogênio.

Toda a expertise que a Petrobras tem no gás pode ser aplicada ao hidrogênio, seja ele verde ou azul, e o fato de ser hidrogênio azul no início, especialmente no Sudeste, não é feio, não é um palavrão. Muitas empresas de petróleo estão fazendo essa transição energética começando com o hidrogênio azul, depois para o verde.

Primeira usina piloto de hidrogênio verde a ser intalada no Nordeste foi a da EDP, no Porto do Pecém(Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal Primeira usina piloto de hidrogênio verde a ser intalada no Nordeste foi a da EDP, no Porto do Pecém

No Nordeste, a Petrobras tem o privilégio de poder pular etapas, porque a Região já alcançou uma situação excelente, como eu dizia há 10, 20 anos, o melhor ambiente operacional e de negócios para investir em energia eólica e solar, seja em terra ou no mar.

Estamos muito bem posicionados, é muito competitivo, claro, não temos o potencial hídrico que outras regiões do Brasil têm, mas o Brasil é afortunado em ter um mix muito variado de recursos naturais, energéticos e não energéticos.

Teremos que administrar isso bem, pois isso gera ciúmes e competição, no caso, a competição entre interesses nem sempre é boa, e precisaremos combater o bom combate. Então sempre é estar em integração com instrumentos de política setorial, respeitar as agências reguladoras, ajudá-las a fazer boas políticas regulatórias, ajudar a fazer os governos estaduais a se interessarem, no caso do governo do Ceará é um bom exemplo tanto dos governos anteriores quanto do governo atual.

O governador Elmano de Freitas em particular, se mostrou muito interessado em trabalhar junto à Petrobras para abordar essa questão do Ceará, não é à toa que tivemos seis reuniões ao longo de 15 meses com a equipe de trabalho, não foram reuniões para tomar café nem para ficar bronzeando, foram reuniões de trabalho, intensas e resolvemos muita coisa.

Lubnor chegou a ser vendida para a iniciativa privada, mas processo foi desfeito pela Petrobras(Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Lubnor chegou a ser vendida para a iniciativa privada, mas processo foi desfeito pela Petrobras
 

Reativamos a Lubnor de novo, recuamos naquele processo de venda que não fazia muito sentido nem para o Ceará nem para a Petrobras, e transformamos a Lubnor em um ponto de partida que poderá ser usado devidamente como base para a transformação ecológica e a transição energética do Ceará pela Petrobras.

Para finalizar, uma das coisas que a gente deixa de falar no Nordeste é o potencial de oleaginosas. Como a gente sofreu o trauma daquela primeira tentativa de implantação de biodiesel a partir da agricultura familiar, inclusive em Quixadá, mas também em Candeias na Bahia, Montes Claros, no norte de Minas, parece que travou aquela situação.

A gente não pode se acostumar com a ideia de que, quando uma coisa dá errado, eventualmente, olhando para a natureza, você vê que tem condições de dar certo, mas a gente não insiste de novo e a gente tem que insistir. A reabertura de Quixadá, que foi determinada por nós, tanto como a das outras duas plantas.

Usina de Biodiesel de Quixadá pode voltar a ter relevância, segundo avalia Prates(Foto: Juarez Cavalcanti/Petrobras)
Foto: Juarez Cavalcanti/Petrobras Usina de Biodiesel de Quixadá pode voltar a ter relevância, segundo avalia Prates

O ponto simbólico, mesmo com o equipamento obsoleto, é um ponto muito mais simbólico do que econômico, é reabrir essas plantas e transformá-las em laboratórios de testes é o foco, não é para pegar a soja do Mato Grosso e trazer para cá, é para fazer elas funcionarem até acertar.

E aí, acertando, colocar para funcionar com um processo de upgrade, ampliação e aprimoramento dessas plantas nos mesmos locais onde elas estão, e eventualmente o aproveitamento delas como centrais de recebimento e coleta de produtos.

O problema que não deu certo na época, o que deu errado foi a escolha das oleaginosas. Primeiro, foram escolhidas as oleaginosas erradas, lembro que foi a mamona, por exemplo, que depois foi corrigida, e vieram outras opções. Hoje, até falamos de macaúba, amendoim, algodão, culturas que já estamos acostumados a ver nos nossos estados.

Nós temos uma ainda perspectiva de futuro com o combustível, temos o SAF (combustível sustentável de aviação), temos outros combustíveis sendo desenvolvidos, e o Nordeste não pode desistir do biocombustível, isso é importante.

Dito isso: sol e vento, que a gente deita e rola, que não tem nenhuma região no Brasil ou no mundo com as condições que nós temos para energia solar e eólica, seja no mar, lago, rio, canal do São Francisco, no interior, no litoral e obviamente offshore. O hidrogênio não pode ser uma moda, tem que ser viável, tem que ter preço, mercado, offtake definido, e segurança para o investimento

O POVO - E a formação profissional, o senhor acredita estar sendo adequada para esses desafios?

Jean Paul PratesEu acho que ela acompanha. A gente teve vários exemplos em outros ciclos, como foi o do petróleo lá no Rio Grande do Norte, a gente percebeu muito isso na década de 70 e 80, a Petrobras teve um papel importante na formação de muita gente, que depois acabou migrando para outros setores. Não tem nada mais complexo do que trabalhar no setor energético.

Eu sempre dizia isso aos meninos e meninas que entravam na Universidade Petrobras, quando eu estava lá, eu fazia aula inicial e dizia: "Olha, você não fique preocupada não que você não está entrando numa empresa antiga que está para acabar nem num setor que vai acabar, porque tudo que você faz aqui é tão complexo que você vai levar o seu conhecimento, a sua capacidade de improvisação, criatividade e tudo mais para qualquer outro setor tão complexo quanto, seja no mar, em terra ou o que for".

A capacitação normalmente acompanha essa demanda, às vezes a gente sente um gap, mas é natural que isso aconteça.

Serviço Nacional de Aprendizagem de Industrial (Senai) é um dos potenciais dos polos formadores de profissionais da cadeia do hidrogênio verde(Foto: José Sobrinho/ Fiec/ Divulgação)
Foto: José Sobrinho/ Fiec/ Divulgação Serviço Nacional de Aprendizagem de Industrial (Senai) é um dos potenciais dos polos formadores de profissionais da cadeia do hidrogênio verde

Eu acho que hoje em dia, com os institutos federais, com os Senais, com escolas privadas, cursos privados e universidades privadas, que estão entrando nisso, e principalmente com as empresas e entidades setoriais que estão entrando nisso, apoiando e mapeando as demandas de formação, para não gerar expectativas erradas nas pessoas que investem na formação e depois não encontram emprego e isso também é importante.

Acredito que o Ceará, o Rio Grande do Norte e a região, em geral, estão bem equilibrados. Os próximos ciclos, obviamente, depois do petróleo, eólica, solar, agora é o offshore, o hidrogênio, novas tecnologias, novos produtos verdes, industrialização verde, essa hospedagem verde, enfim acho que tudo isso tem muita matéria crítica para desenvolver, e não vai faltar gente para formar essas pessoas.

O POVO - O senhor falou sobre levar esse conhecimento para frente, o que o senhor trouxe para a sua vida política, também dentro dessa área de energia e petróleo, das formações que o senhor teve em Direito e Economia?

Jean Paul PratesEu acho que foi uma combinação de muita sorte, claro que a gente trabalha na vida, planeja a vida pessoal, e essa é uma mensagem importante, principalmente para os jovens e para as jovens: planejar a vida. Eu sempre planejei minha vida, fiz duas faculdades em paralelo, Direito e Economia, fiz dois mestrados em paralelo, sempre foi uma coisa meio apressada, mas acabou dando certo.

Com a migração para o Nordeste, para o Rio Grande do Norte, eu nasci no Rio de Janeiro, e migrei para o Rio Grande do Norte há 20 e poucos anos. Me tornei, de fato, um potiguar mesmo, inveterado, convencido e absolutamente fã do Rio Grande do Norte e do Nordeste.

E aí quando vim, juntou-se a isso a experiência profissional, que já tinha de tantos anos de consultoria em petróleo e energia, mas juntou-se à questão da política, e eu acho que, quando a gente amadurece bem profissionalmente, não encara a política como emprego ou profissão, e trabalha nela por diletantismo mesmo, porque quer ajudar o país, o estado em que você vive, até a cidade em que você está, a coisa funciona, você se torna um bom político.

A maior parte das vezes você vê que os maus políticos são aqueles que acabam se profissionalizando, o cara tem que ter uma profissão antes, tem que ser algo na vida para depois encarar um mandato, por exemplo, federal.

Mas eu acho que ao fim, tudo acabou convergindo positivamente: a experiência técnica, a experiência profissional de formação, a experiência política no Senado, culminando com o cargo de primeiro secretário de energia, a gestão de um estado e depois o parlamento brasileiro, que é uma câmara mais alta e mais importante, e finalmente a presidência da principal empresa, a maior empresa do Hemisfério Sul.

O POVO - E a paixão pelo futebol como se desenvolveu? O senhor é notório torcedor do Botafogo, mas também foi diretor do Alecrim e como vê o momento atual dos clubes potiguares na comparação com os demais clubes nordestinos? E como o senhor enxerga o futebol potiguar no momento atual, em meio às ascensões de clubes nordestinos, como Fortaleza, Ceará, Bahia?

Jean Paul PratesEu acho que o futebol do Nordeste está de parabéns pelas evoluções, e a gente tem que comemorar, inclusive, os times dos estados vizinhos. Acho que qualquer vitória do futebol do Nordeste, no geral, que é um sucesso desde que não seja para cima do Botafogo.

O Fortaleza está disputando a liderança, e até me agrada mais do que se fosse o Palmeiras, Fortaleza, tudo bem. Mas acho que qualquer vitória do futebol nordestino tem que ser comemorada por todos os nordestinos.

O Botafogo foi o time que colocou o Brasil como o país do futebol, e isso é verdade porque foi o que mais cedeu jogadores para a Seleção, o Santos tinha o Pelé, mas o resto era do Botafogo. Quem realmente colocou o Brasil nessa projeção foi o Botafogo, um time tradicional.

Botafogo é uma das grandes paixões do ex-presidente da Petrobras, que comemora, contudo, o bom momento do Fortaleza e de outros clubes nordestinos(Foto: Vítor Silva/Botafogo)
Foto: Vítor Silva/Botafogo Botafogo é uma das grandes paixões do ex-presidente da Petrobras, que comemora, contudo, o bom momento do Fortaleza e de outros clubes nordestinos
 

Dessa época, o eixo Rio-São Paulo dominava, principalmente o Rio primeiro, depois São Paulo, sobrou pouco para o Nordeste, e a gente viu que o Nordeste foi praticamente alijado desse processo, quando tínhamos um Brasileirão mais amplo. As regras foram mudando de forma que foi prejudicando os clubes menores.

Depois criou-se a Copa do Brasil como uma forma de compensação, porque a forma de classificação permitia aquele embate direto, mas já veio aquela corte dos dois ou três gols, que já elimina na casa do adversário. O cara vai lá para o Amazonas, dá 3 a 0 e não dá nem a chance pro time do Amazonas vencer no Maracanã, sequer tem a oportunidade de jogar no Maracanã, é sempre foi uma paulada atrás da outra.

Eu acho que a evolução mostrou que, se der um pouco de crédito, se der chance, o Nordeste chega, e isso é muito bom. A experiência que tive lá foi porque é uma coisa que eu sempre tive muita curiosidade de ver o futebol como um projeto, que transforma vidas de pessoas.

Meu filho, na época, tinha idade e queria jogar futebol, então tentei ajudar o Alecrim, que é o terceiro time mais tradicional do Rio Grande do Norte, eu diria que é Ferroviária no Ceará e o Botafogo de Natal, porque o Garrincha jogou no Alecrim, com a camisa 7.

Então, eu me envolvi com o pessoal, ajudei durante um ano, 2015, e foi o ano, inclusive, que o Alecrim foi para a final depois de 30 anos fora das disputas foi para uma final de campeonato potiguar e era o centenário dos três times: ABC, América e Alecrim, que faziam aniversário no mesmo ano, fundados em 1915, e foi o campeonato do centenário.

Acabamos ficando fora da final, que, claro, tinha que ser ABC e América, mas fizemos uma bela campanha, foi um belo trabalho no Alecrim, e no Botafogo a gente tá feliz de ver.

O POVO - Não tem como não perguntar sobre o processo de saída da Petrobras. Como o senhor viu esse processo? O que influenciou sua decisão? Houve influência do Centrão ou do próprio ministro Alexandre Silveira? O quanto isso influenciou na sua visão para esse processo de assunto?

Jean Paul PratesEsse é um assunto que eu me impus um certo voto de silêncio até o fim da quarentena, eu acho nós fizemos um trabalho consciente, voltado para a Petrobras, na minha carteira de trabalho só tem duas assinaturas que não eram de empresas minhas ou em que eu não era sócio: Petróleo Brasileiro S.A, uma como estagiário no fim da década de 80, e outra como presidente, foi a minha única empregadora.

É uma empresa pela qual tenho muito carinho e com muita honra ter sido nomeado pelo presidente Lula, uma discussão que já precede a própria eleição, a gente já discutia planos de governo e planos para a Petrobrás de lá de trás.

Quando se cunhou a expressão “abrasileirar os preços” foi na época do plano de governo.

Agora o que aconteceu mais recentemente, eu vou deixar para comentar mais adiante, porque eu mesmo estou fazendo meu balanço sobre tudo o que que aconteceu.

Com certeza não foi incompetência, todo mundo viu isso porque o resultado da empresa em 2023 foi o melhor resultado em seus 70 anos de história, sem venda de ativos estratégicos, ou seja, sem cair vendas de refinarias, nem BR, nem termelétricas, foi o melhor resultado dos 70 anos.

Só teve um ano melhor, que foi em 2022, mas lá estava caindo muito dinheiro de venda de ativos estratégicos e aí não vale. Então, incompetência não foi. Também não foi por escândalos ou corrupção. A questão da política, a gente vai comentar na hora que eu fizer o meu próprio balanço e conversar com as pessoas.

Prates aparece em foto ao lado do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, apontado como um dos pivôs de sua demissão(Foto: Ricardo Stuckert/PR)
Foto: Ricardo Stuckert/PR Prates aparece em foto ao lado do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, apontado como um dos pivôs de sua demissão

Eu combinei com o presidente Lula que nós íamos conversar. Eu não me desfiliei do Partido dos Trabalhadores, não me dissociei da política, mas também tenho direito a uma certa quarentena sobre esse assunto, para refletir e fazer que os outros reflitam também.

O POVO - O que o senhor gosta de fazer quando não está pensando no Brasil, seus hobbies? Qual a importância que a sua família e o seus amigos têm na sua trajetória e, especialmente, no seu atual momento de vida?

Jean Paul PratesNa família, eu tenho minha companheira, de Caicó, aguerrida, que está sempre me ajudando, sempre tá comigo, todos já conhecem, meus amigos, o pessoal do setor já interage com ela naturalmente, é uma pessoa realmente muito ativa na minha vida. Tem meus filhos que são importantes, mas infelizmente como me separei da mãe deles há uma certa distância. Sempre que posso, tento aproveitar com qualidade o tempo com eles.

Em relação aos amigos e ao pessoal do setor, a parte feliz, ou infeliz, do trabalho é que, com o tempo você vai envelhecendo e reduzindo as amizades. Mas a rede de contatos que você constroi serve também como uma rede de amigos.

Eu sempre procurei respeitar muito as pessoas, até do ponto de vista que eu falei aqui, seja no licenciamento ambiental, na questão de interação com autoridades, com meus colegas senadores e hoje amigos. Dos 80 senadores, eu tenho a absoluta certeza que se eu ligar ou mandar uma mensagem para todos, eles vão responder na mesma hora com muita atenção, respeito e carinho.

A Petrobras, por exemplo, várias pessoas viram cenas de aplausos, em vários lugares, em todos os lugares em que nós fizemos atividade de retomada, como a Lubnor, o pessoal se emocionou, chorou junto, acho que é uma característica que eu tenho tentado imprimir.

E isso se reverte para os momentos em que você passa por momentos como este, esta quarenta entediante que eu estou hoje, depois de fazer tanta coisa acelerada, mas os amigos têm sido importantes, até com uma forma de abrir caminhos, de ajudar a refletir, o que é que houve, então acho que é importante, sim, essa interação. E os amigos cearenses, que estão incluídos nessa lista, são muitos.

 
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