O Ceará foi escolhido para uma experiência pioneira na ciência brasileira. Entre 1859 e 1861, a província foi percorrida por grupo dos mais qualificados pensadores do Império. Eles formaram a primeira comissão científica formada apenas por brasileiros. Depois de 160 anos, aquela experiência ainda desperta curiosidade e, mais que isso leva a conhecimento novo.
O POVO refez os caminhos percorridos pela Imperial Comissão Científica e Comissão Exploradora das províncias do Norte - seu nome oficial. Não como cientistas e, portanto, o trabalho não foi o de refazer o trabalho iniciado em 1859. Numa expedição jornalística, buscamos histórias. Os vestígios, as transformações e os saberes de hoje. Há muita gente na academia que hoje se debruça sobre o que produziu a comissão do século XIX. Há também os saberes da própria gente do povo, que conhece na experiência as coisas do sertão, serra e mar.
Veja os bastidores da Expedição Borboletas em série de stories no Instagram. Clique aqui
A comissão foi cercada de polêmicas políticas e escândalos inclusive sexuais. Terminou com um naufrágio que levou para o fundo do mar muito do que havia sido descoberto. Virou samba enredo no Carnaval, pelo aspecto anedótico. A piada esconde a importância daquela experiência, que hoje é redescoberta por novas gerações de pesquisadores em universidades dentro e fora do Brasil. De certa forma, a assim chamada pelos detratores de “Comissão das Borboletas” ainda não terminou.
A província naquele tempo era desconhecida do resto do império. A Amazônia havia já sido muito mais estudada. O desconhecimento, o mistério, levava a narrativas fantasiosas. Inclusive sobre riquezas. Os antigos relatos sobre metais preciosos estariam entre os motivadores principais da opção.
A comissão era parte de uma empreitada para conhecer o império, aproximar-se do povo e conhecer os potenciais. No mesmo ano de 1859, em outubro, o próprio dom Pedro II iniciou viagem pelo que na época eram chamadas “províncias do Norte”. Passou por Espírito Santo, Bahia, Sergipe, Alagoas, Paraíba e Pernambuco. Era parte de uma política de unidade do Império que só recentemente se estabilizara, após décadas de rebeliões.
Metais preciosos não eram a única forma de riqueza buscada. Não havia ideia de uma pesquisa pura. Era conhecimento aplicado. Pretendiam ver como potencializar culturas agrícolas, como explorar a pecuária. Enfim, como transformar o conhecimento em riqueza.
Eram estudiosos de uma outra concepção de ciência. Ainda não tão especializada. “Era uma ciência mais sistêmica no aspecto de conexão mesmo. As áreas estavam conectadas e dialogavam”, explica Levi Jucá, professor e doutorando em Educação na Universidade Federal do Ceará (UFC), onde estuda as expedições científicas que foram ao Maciço de Baturité no século XIX.
Além das críticas de que seria desperdício de dinheiro, a comissão agitou a sociedade cearense, devido ao comportamento sexual de alguns integrantes. Por isso, foi chamada também de “Comissão Defloradora”.
O episódio mais famoso e dos que mais desgastaram a comissão envolveu a tentativa de aclimatar dromedários no sertão. A experiência foi um fracasso, os animais não se mostraram úteis, um deles morreu com a pata ferida. O episódio virou até enredo de Carnaval do Rio. Com ele a Imperatriz Leopoldinense foi campeã de 1995.
* O especial Expedição Borboletas foi veiculado no O POVO em 28 de janeiro de 2020 e em 4 de fevereiro de 2020
Conheça a história da Expedição Científica Expedicionária, primeira comissão científica formada apenas por brasileiros e que cruzou o Ceará em 1850