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A síndrome do conclave paralelo
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Ariadne Araújo é jornalista. Começou a carreira em rádio e televisão e foi repórter especial no O POVO. Vencedora de vários prêmios Esso, é autora do livro Bárbara de Alencar, da Fundação Demócrito Rocha, e coautora do Soldados da Borracha, os Heróis Esquecidos (Ed. Escrituras). Para além da forte conexão com o Ceará de nascença, ela traz na bagagem também a experiência de vida em dois países de adoção, a Bélgica, onde pós-graduou-se e morou 8 anos, e Portugal, onde atualmente estuda e reside.

A síndrome do conclave paralelo

Desde a morte de Francisco, milhares de internautas têm colocado em cena seus cardeais preferidos, num jogo online que se chama Fantapapa. Um conclave virtual que já tem papabili eleitos. Mas os conclaves paralelos não ficam por aí, ao que parece
Tipo Análise
Cardeais em preparação ao conclave para escolher o sucessor do papa Francisco (Foto: Tiziana Fabi / AFP)
Foto: Tiziana Fabi / AFP Cardeais em preparação ao conclave para escolher o sucessor do papa Francisco

O novo papa adotará que nome? Usará ele óculos? Será de qual ordem religiosa? Virá de qual continente? Sobre um tablado verde, que sugere um campo de futebol, cada internauta põe seu time de cardeais, segundo as regras do FantaPapa — onde o capitão é um bom papabile e o goleiro é o candidato com menos chance, na lista dos elegíveis.

Desde que Francisco morreu, o FantaPapa já virou a cabeça de sessenta mil internautas — grande maioria não é feita de amantes de futebol, mas sim de gente que acompanha as intrigas e rituais do Vaticano. Neste conclave virtual, os jogadores fazem prognósticos sobre o perfil do papa, que será eleito no próximo dia sete de maio.

Até agora, na compilação de milhares de prognósticos do FantaPapa, dois cardeais italianos marcam pontos no placar: Matteo Zuppi, de Bolonha, e Pietro Paolin, secretário-geral do Vaticano. Faz também bons passes o filipino Luís Antônio Tagle. Mas, se os dois cardeais goleadores estão à frente das previsões, é porque o jogo tem feito sucesso, principalmente entre os italianos.

Também porque o jogo surgiu na Itália, depois que Pietro Pace, um especialista em inteligência artificial de 42 anos, percebeu que não se falava que sobre o conclave, nos cafés e encontros de amigos. Aproveitou a onda para lançar o jogo que ele já vinha imaginando, desde que Francisco entrou no ciclo de internações. Não posso culpá-lo pela ideia, já que, às vésperas do conclave, o assunto tornou-se de interesse mundial.

No Corriere Della Sera fala-se em “síndrome do conclave paralelo”, aquele conclave que decide o nome do novo papa, mas não na Capela Sistina, e sim nas salas presidenciais ou de poderes externos. Diga-se, dos mais poderosos, que, secretamente, poderiam colocar reservas sobre este ou aquele nome. Não é um fato inédito — já aconteceu algumas vezes, no passado.

A última vez foi em 1903, com o veto de Franz Joseph, imperador da Áustria e rei da Hungria, ao cardeal siciliano Mariano Rampola — que chegou ao conclave com chances fortíssimas de ser eleito. Agora, a presença de Donald Trump, durante o enterro de Francisco, levantou novas suspeitas e fez girar ainda mais o vento das apostas.

E tem sido assim, o conclave como um jogo de influências e interesses. Um lençol curto demais para tantas diferentes visões — dos cardeais, das forças dentro da Igreja e fora dela. Quando não é a publicação da fotomontagem de Donald Trump vestido de Papa, são as fake news que, nos últimos dias, circularam mentira sobre uma doença do papabile Pietro Parolin (um dos goleadores do FantaPapa).

 

Vinganças, empurra-empurra, influências. Só aquele primeiro homem, o dedo indicador na ponta do dedo de Deus, no teto da Capela Sistina (na pintura genial de Michelangelo), sabe os segredos cabeludos dos conclaves.

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