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Mais mulheres, menos cearenses: os números do 31º Cine Ceará
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João Gabriel Tréz é repórter de cultura do O POVO e filiado à Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine). É presidente do júri do Troféu Samburá, concedido pelo Vida&Arte e Fundação Demócrito Rocha no Cine Ceará. Em 2019, participou do Júri da Crítica do 13° For Rainbow.

João Gabriel Tréz arte e cultura

Mais mulheres, menos cearenses: os números do 31º Cine Ceará

Participação de diretoras cresce na seleção do Cine Ceará, enquanto a presença cearense cai em termos absolutos; no universo de inscritos do Estado, longas aumentam e curtas têm queda
Tipo Opinião
O curta 'Entre o Passado' é dirigido por Larissa Estevam (Foto: divulgação)
Foto: divulgação O curta 'Entre o Passado' é dirigido por Larissa Estevam

2019 foi um ano importante para o Cine Ceará. Naquela 29ª edição, o festival contou com uma inédita participação cearense forte, refletindo o contexto positivo da produção audiovisual no período, e também passou a oficialmente se comprometer a ter no mínimo 30% dos filmes selecionados dirigidos ou codirigidos por mulheres. A edição de 2020 já nasceu fora da curva por conta dos impactos da pandemia e, em termos de seleção, trouxe menos mulheres e um nível quase inalterado de produções do Estado. Observando os dados de inscrições e da seleção da 31ª edição do festival, o diagnóstico geral aponta mais diretoras e menos cearenses, mas detalhes indicam movimentos de interesse.

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No ano de estreia do compromisso de selecionar mais mulheres, em 2019, o percentual atingido de produções de diretoras foi 46%, superando o mínimo regulamentar. Na edição seguinte, porém, o Cine Ceará tropeçou e o índice ficou em 29,1%. A recuperação em 2021 foi expressiva e o patamar quase se iguala ao inicial: 43,5%.

Em números absolutos, são 17 filmes de diretoras entre os 39 selecionados, enquanto em 2019 foram 18 entre também 39. Já em 2020, foram 14 entre 48. A porcentagem sobe mais pela diminuição de selecionados do que por aumento acentuado de cineastas, é verdade, mas o cenário ainda é positivo.

Quanto à participação cearense, ela teve oscilação positiva no percentual, fruto também da diminuição de selecionados, mas os números absolutos são de queda desde 2019, quando 30 de 39 títulos selecionados (ou 76,9%) eram do Estado. Em 2020, foram 29 de 48 (ou 60,4%) e, nesta edição, são 24 de 39 (ou 61.5%).

Apesar da queda em números absolutos, vale atentar para o que mostram as inscrições. Em 2019, foram 111 filmes cearenses inscritos, sendo nove longas e 102 curtas. Em 2020, o total foi de 121, sendo 10 longas e 111 curtas. Finalmente, a edição de 2021 teve 88 produções do Ceará inscritas, uma queda considerável puxada pelo fato de que somente 72 curtas se inscreveram. Por outro lado, o número de longas cresceu para 16, configurando expressivo aumento de 60% entre as duas últimas edições.

Os fatos são relevantes por apontarem para dois movimentos do último ano. Quanto aos longas, a subida mostra que, pelo menos por enquanto, produções audiovisuais do Estado seguem conseguindo ser produzidas, a despeito dos contextos de desmonte no âmbito federal e, no estadual, de descontinuidades acentuadas.

Quanto aos curtas, é possível arriscar que a queda tem relação não só com as dificuldades da pandemia, mas com o fato de que as ações e editais emergenciais em âmbito estadual podem não ter sido o suficiente para apoiar a produção - ainda que seja possível notar na seleção de curtas cearenses, inclusive, uma presença considerável de produções que são frutos dessas iniciativas. Isso por si já depõe sobre a importância delas, mas é possível, ainda assim, pensar sobre o alcance.

Há outros pontos de interesse que um olhar mais atento à seleção revela, mas que não são passíveis de se pensar em termos de comparação numérica uma vez que não são contabilizados pelo festival, como por exemplo a presença de filmes realizados por pessoas não-brancas. Há nesta edição, entre outros, de "Como respirar fora d'água" (de Júlia Fávero e Victoria Negreiros) a "Entre o passado" (de Larissa Estevam), passando por "Fôlego vivo" (com direção coletiva da Associação dos Índios Cariris do Poço Dantas - Umari).

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Um bom passo futuro para o Cine Ceará seria, então, fazer como a Mostra de Cinema de Tiradentes, que disponibiliza no ato da inscrição um questionário de autodeclaração de gênero e raça às pessoas - ou, no caso de já fazê-lo, disponibilizar publicamente os dados tanto referentes às inscrições quanto à seleção. Assim, seria possível ter maior dimensão da presença de mulheres, pessoas negras, LGBT e com deficiência, por exemplo, em longas e curtas inscritos e selecionados.

Números não podem ser vistos sem contextos, decerto, mas, citando Luly Pinheiro, cineasta integrante do coletivo Negritude Infinita, quando de entrevista sobre o Censo de Profissionais Negres no Audiovisual do Ceará desenvolvido pelo grupo, a junção de dados é uma forma de ter informações relevantes que podem basilar ações mais assertivas e, até, cobranças. Fica o convite.

Seleção do 31º Cine Ceará

Mostra Competitiva Ibero-americana de Longa-metragem

"5 casas", de Bruno Gularte Barreto
"A Praia do Fim do Mundo", de Petrus Cariry
"Bosco", de Alicia Cano Menoni
"Fortaleza Hotel", de Armando Praça
"Perfume de Gardenias", de Macha Colón
"Vacío", de Paul Venegas

Mostra Competitiva Brasileira de Curta-metragem

"Ato", de Bárbara Paz
"Ausências", de Antônio Fargoni
"Chão de Fábrica", de Nina Kopko
"Como respirar fora d'água", de Júlia Fávero e Victoria Negreiros
"Encarnado", de Otávio Almeida e Ana Clara Ribeiro
"Foi um tempo de poesia", de Petrus Cariry
"Hawalari", de Cássio Domingos
"Mar Concreto", de Julia Naidin
"O amigo do meu tio", de Renato Turnes
"O Durião Proibido", de Txai Ferraz
"O Resto", de Pedro Gonçalves Ribeiro
"Sideral", de Carlos Segundo

Longas da Mostra Olhar do Ceará

"De uma distância esquizoide", de Gabriel Silveira
"Minas urbanas", de Natália Gondim
"Transversais", de Émerson Maranhão

Curtas da Mostra Olhar do Ceará

"2020", de Oziel Herbert
"A casa que eu vivo hoje não é casa", de Lara Muniz e Marcus Antonius
"Arte na palha", de Augusto Cesar dos Santos
"As aventuras de Ana e João", de Augusto Cesar dos Santos
"Boi coração", de Marcelo Alves e Angela Gurgel
"Corpas", de Arthur Almeida
"Curva sinuosa", de Andréia Pires
"Entre o passado", de Larissa Estevam
"Estilhaços", de Gabriela Nogueira
"Fôlego vivo", da Associação dos Índios Cariris do Poço Dantas – Umari
"Ibiapaba, como nascem as montanhas", de George Alex Barbosa
"Joelhos", de Yasmin Gomes
"Memória da memória", de Idson Ricart
"Muxarabi", de Natália Maia e Samuel Brasileiro
"Saudade dos Leões", de João Paulo Magalhães
"Sebastiana", de Cláudio Martins
"Zé Tarcísio, Testemunha", de Delano Gurgel Queiroz

Foto do João Gabriel Tréz

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