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Agostinho dos Santos tem sua vida registrada em filme curto e necessário
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Marcos Sampaio é jornalista e crítico de música. Colecionador de discos, biografias e outros livros falando sobre música e história. Autor da biografia de Fausto Nilo, lançado pela Coleção Terra Bárbara (Ed. Demócrito Rocha) e apresentador do Programa Vida&Arte, na Nova Brasil FM

Marcos Sampaio arte e cultura

Agostinho dos Santos tem sua vida registrada em filme curto e necessário

Documentário resgata a curta vida, o sucesso internacional, o esquecimento e a morte trágica de Agostinho dos Santos
Tipo Notícia
Documentário de Ney Inácio resgata vida e fama do cantor Agostinho dos Santos (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Documentário de Ney Inácio resgata vida e fama do cantor Agostinho dos Santos

Antes da bossa nova ganhar o mundo, virar moda e até de ganhar o próprio nome, ela já era praticada por alguns artistas. Johnny Alf e Dick Farney, por exemplo, já eram bossa nova antes da bossa nova existir. Outro precursor daquela estética marcada pela precisão, economia e sofisticação foi Agostinho dos Santos. Paulista de origem pobre, ele fez um bocado de bicos e quase foi jogador profissional de futebol, antes de ser tomado por outro talento.

Começou em programas de calouros, depois um contrato em rádio, participações no cinema até chegar um convite para cantar em "Orfeu Negro", vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1960. A produção franco-brasileira é uma adaptação da peça "Orfeu da Conceição", de Vinicius de Moraes, que foi quem chamou Agostinho para cantar "Manhã de Carnaval" e "A Felicidade", feitas sob encomenda para o drama de Marcel Camus. O sucesso foi tanto que, dois anos depois, ele foi recebido como estrela no lendário concerto de bossa nova do Carnegie Hall, em Nova York.

A história do garoto negro nascido no distrito de Bela Vista, São Paulo, é contada no filme "Agostinho", de Ney Inácio com direção musical de Thiago Marques Luiz. Com 72 minutos, o documentário é recheado de imagens raras e depoimentos emocionantes. No destaque, a filha Nancy conta intimidades do pai que foi um galã capaz de fazer moças suspirarem ao ouvirem aquela voz aveludada. "Safado", resume a cantora Edith Veiga, entre risadas, sobre o jeito conquistador do crooner que teve um romance nada secreto com a cantora Elza Laranjeira. O caso foi descoberto, rendeu um flagrante da esposa e muito material para colunas de fofoca. A própria Edith assume que só se não se envolveu com ele por que era 9 anos mais nova.

O mesmo charme era empregado nas canções. O timbre macio vestia com perfeição canções românticas como "Balada triste", que ele gravou depois de Ângela Maria (que conta como ele se apropriou da canção). E aquela voz também foi para outros caminhos além do que fazia fama nos anos 1950, quando começou a gravar. Agostinho explorou sua versatilidade em afrosambas, jovem guarda, standarts americanos e versões brasileiras para Beatles ("Yesterday") e de Bill Halley ("See you later, Alligator").

O filme vai emendando essas histórias de forma apressada buscando destacar episódios curiosos. Um deles foi o "golpe" que Agostinho deu em Milton Nascimento quando lhe pediu uma fita com composições inéditas dizendo que buscava repertório para um novo disco. Na verdade, ele queria tirar o amigo da pindaíba inscrevendo as músicas da tal fita no II Festival Internacional da Canção. Entre elas estava "Travessia", que levou o segundo lugar e abriu a estrada de sucesso de Milton. O documentário também aborda o racismo que provocou Agostinho a abrir o um clube exclusivo para pessoas negras que chegou a receber estrelas como Muhammad Ali, Josephine Baker e os Jackson 5.

"Agostinho" vai da escalada ao sucesso e chega ao ostracismo. Com a chegada de novos ídolos, como Roberto Carlos e os tropicalistas, ele e outros artistas perderam espaço no Brasil e foram em busca de outros mercados. Experiente em palcos internacionais, foi cantar na VI Olimpíada Internacional da Canção, na Grécia, como uma tentativa de retornar aos bons tempos de fama. A canção seria "Paz sem cor", hino antirracista composto por ele e Nancy. A caminho do evento, o Boeing-707 da Varig foi invadido por uma fumaça escura provocada por um cigarro aceso no banheiro. No pouso forçado perto do aeroporto de Orly, em Paris, morreram 112 pessoas, incluindo Agostinho, 41 anos, Carlos Piper, maestro que lhe acompanharia no festival e o senador Filinto Müller.

Com pouco tempo para contar tantas histórias, o documentário parece pouco para apresentar um personagem tão rico para a música brasileira. Marcos Valle, Sergio Mendes, Leny Andrade, Roberto Menescal trazem histórias e rasgam elogios a Agostinho dos Santos, mas algumas lacunas permanecem, como a própria dimensão que ele teve no cenário nacional e internacional. Contextualizar quem são essas pessoas e o que é o Bar Ferradura ajudaria quem ainda está conhecendo a obra do intérprete de "Meu benzinho". Também incomoda tantos personagens que aparecem em fotos não identificadas, como Clara Nunes, Pelé e Duke Ellington. No entanto, a riqueza de imagens do personagem principal, seja em entrevistas ou no palco fazendo o que sabia fazer de melhor, tornam "Agostinho" uma obra necessária para resgatar uma voz que não pode se perder no tempo.

Regina Kinjo apresenta espetáculo ''Sertão Oriente''
Regina Kinjo apresenta espetáculo ''Sertão Oriente''

Notas musicais

Som novo

Cearense neta de japoneses, Regina Kinjo lançou o clipe "Florescer", faixa do disco "Sertão oriente" (2025). Com um belo figurino de Dami Cruz, o filme gravado nas dunas de Sabiaguaba tem direção de Tim Oliveira.

Trio Jazz

O músico Ricardo Bacelar lançou o single "Aqui, oh" (Toninho Horta/ Fernando Brant), que conta com Flora Purim e Airto Moreira. O single faz parte de um disco feito pelos três, com lançamento previsto para 2026, junto com o documentário sobre as gravações.

Estreia

Radicada em São Paulo, a cearense Letícia Ibiapina apresenta na terça, 2, no Flores Bostrô, seu disco de estreia. Produzido por Agê, "Vulnerável" mistura estilos para falar de amor e amizade. Letícia é cantora, compositora e professora de música.

De Minas

O cantor e compositor Octávio Cardozzo está lançando o selo Fragaí, focado em novos artistas da cena mineira. O primeiro produto do projeto é "As coisas são como podem ser", single do compositor Dereco (foto). O álbum completo está previsto para 2026.

À Margem

A Universal Music anunciou o relançamento do disco "O Marginal" (1992), segundo de Cássia Eller. Mais pesado que o anterior e praticamente esquecido, tem composições de Luiz Melodia e Rita Lee, ao lado de uma explosiva releitura de Jimi Hendrix.

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